Capítulo Quatorze

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Eleanor

O norte de Wivertown não é tão deserto quanto pensei.

O Morro dos Vagalumes poderia ser simplesmente subido a pé, mas há uma estreita estrada para carros.

O topo é um lugar bonito, a paisagem também. Não é a coisa mais bela do mundo, mas as luzes dos postes ainda formam uma boa visão.

Abandono o meu carro, me sentindo vulnerável.

Não baixe a guarda. É uma Vermelha.

Meio tarde para isso, não?

— Você demorou! — Alyssa me acusa, vindo debaixo de uma árvore qualquer.

— Vim o mais rápido que pude — respondo, sem emoção. Minha cota de drama está esgotada. — Então, por que me abordou?

— Direto ao ponto. Gosto assim. — Ela se senta no chão de terra. Não a imito. — Certo, eu sou Vermelha, você é Vermelha, portanto bem vinda à família!

O quê? Ela é completamente louca, essa é a única resposta prudente.

Seus olhos voltam à cor original de repente.

— Não, eu não sou louca. — Ela é telepata? Alyssa para por um segundo. — Preciso ter paciência, não é? Vamos lá. — Mal posso esperar. — Você não sabe nada sobre a história dos Vermelhos. É impressionante.

— E justificável — rebato.

— Sim. E isso me irrita. Começando pelo começo: no ano em que você nasceu, 279B, roubaram você e mais seis bebês da base Vermelha. Eram os únicos Roxos da época e a ganância falou mais alto.

Ela sabe que não acredito, por que ainda tenta?

—  Ah Eleanor! Vai ser mais fácil se você colaborar. Abra um pouco a sua cabeça!

— Você está dizendo que sou uma Vermelha roubada e quer mesmo que eu acredite? Não deveria estar provando nada a você, mas há fotos minhas de quando eu era pequena — respondo impaciente. Estou cansada de discussões.

— Você escutou o que eu disse!? Te roubaram no ano em que você nasceu! É claro que existem fotos.

Não é uma história convincente. Não mesmo.

Subitamente, Alyssa se levanta. Os olhos vermelhos brilhando com raiva.

— Eu avisei que você não iria acreditar! É cabeça dura demais para isso. — Partiu para a ofensa, vai ser longo.

— Tenho outras coisas para fazer. Se me dá licença... — Tento voltar para o carro, mas ela me agarra pelo braço com reflexos rápidos. Me desvencilho facilmente. — Você citou Roxos, não é? O que são Roxos? Essa raça não existe!

— A ignorância ainda vai acabar com a raça humana. — Ela tenta me agarrar novamente, o que não funciona.

— Alyssa, eu não vou continuar a discutir. Não tenho boa experiência com Vermelhos e não simpatizo com você. Não me obrigue a chamar a polícia! — Que ameaça estúpida.

— Pelo visto a madame já esqueceu da voz não é? A sensação de ter alguém morando na sua cabeça não foi tão incômoda? Pois adivinhe: estou aí — ela aponta para minha testa — desde o dia em que nos conhecemos, em setembro.

Está blefando. NÃO ABAIXE A GUARDA.

Meu subconsciente grita.

Não pense. Não pense. Branco, branco, branco.

— E ainda me chama de louca! — Ela diz, me arrancando da minha cabeça. — Vou lhe dizer o que ninguém teve coragem: Você vai acabar sozinha! E você merece isso. Porque você é uma pessoa superficial, uma perdedora, a princesinha da vida perfeita que se revelou como uma louca.

Se algum dia dissesse que suas palavras não me atingiram como um soco no estômago, seria mentira.

Superficial. Perdedora. Princesinha.

Não sei o que sinto no momento, só sei que dói. É triste. Me deixa brava. O que soa ridículo, eu sei.

Continuo olhando para Alyssa, como se ela fosse o motivo de todos os meus problemas.

— Você me chamou aqui para me insultar? Vermelhos costumam arquitetar planos melhores — insulto de volta. Hipócrita.

Alyssa saca uma espécie de adaga do bolso da calça e vem andando em minha direção.

— Lave sua boca com água e sabão para falar de mim! — Ela continua vindo e eu, recuando. — Charlie Miller apoia Adelyn Livermoony. Charlie Miller precisa de uma Vermelha poderosa e tola. Adivinhe? Você se encaixa em ambos requisitos.

Eu não preciso acreditar. Preciso?

Talvez você precise.

Ah, cale a boca você também.

Como ela sabe sobre Charlie? É realmente telepata?

Eu não sei.

Como não? Ela está na sua cabeça e você sabe disso.

Não, não está.

— É disso que eu estou falando! Louca.

Por Deus. CALE A BOCA. Grito na minha mente.

Instável.

Volto meu olhar para Alyssa, encaro seus olhos vermelhos. Ela está parada, a adaga apontando para mim. Encaro, encaro e encaro. E então ela cai. Literalmente. De joelhos. As mãos nas têmporas. Não me aproximo, não tento fugir. Ela está certa? Eu sou Vermelha? Não. Isso seria um grande pesadelo. Não pode nem ser uma possibilidade.

Alyssa pega outra coisa do bolso, mão esquerda na têmpora, mão direita no ar. Me assusto com o que pode ser. Aperto a visão e vejo uma caixinha prateada. Não posso ver de onde estou, então me aproximo. Parece burrice? Sim. Com certeza.

A caixa, não era verdadeiramente uma caixa, e sim um espelho. Chego mais e mais perto.

Meus olhos. Não.

Tiro Alyssa do meu campo de visão, enquanto ela se estabiliza eu encaro meu reflexo.

Nem Marrons, nem Vermelhos, nem Azuis. Roxos.

É mentira. Ela é Vermelha. É mentirosa.

— Garotinha, você é boa — ela diz. — Acredita agora?

Não respondo.

— Livermoony vai entrar em guerra. Precisam de você. Sarah precisa de você. — Volto a atenção para ela. — A outra menina Livermoony, Louise, está morta...

É ainda pior do que a minha definição de pesadelo.

— E como vai Sarah? — indago interrompendo, com medo da resposta.

— Não sei. Não aparece na imprensa faz um bom tempo.

E se...

Não. Ela é forte.

Mas talvez...

Não. Ela está bem e em casa.

Deixe de ser burra, Vermelha imunda. Se Louise que não saía de casa está morta, imagine como está Sarah.

Não.

O fundo do poço é ainda maior agora. E continuarei caindo. Nunca estamos realmente no fim, sempre há como afundar mais.

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