Capítulo Dezesseis

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Sarah

Um dia todos nós estaremos mortos: sua mãe; seu pai; seus avós; seus irmãos; e você. É estranho pensar, não?

A morte é algo que assusta muitas pessoas. Talvez uma maneira de lidar com isso é acreditar no pós morte. A ideia de ver seus entes queridos novamente parece esplêndida. E isso assusta, não?

Algumas vezes o peso de seu corpo parece muito para suportar, então você se deita e pensa: "Por que eu ainda existo? Pessoas melhores poderiam estar em meu lugar" e então você chora. E nem sabe o motivo.

Há algumas semanas, a sombra da morte era algo distante, mas de alguma forma, sempre se esgueirava por perto.

São poucos os livermonianos que sabem da morte de Louise no momento. A notícia se espalhará em poucos dias.

Sinto falta dela como uma criancinha sente falta dos pais no primeiro dia de aula.

Tento mover a droga de uma gota d'água há dias. Como os Vermelhos fazem isso? É infinitamente impossível.

Ultimamente minha cabeça está cheia de parasitas, invasores como costumam chamar. Buracos pretos ao redor dos meus olhos. E eu aceito isso. Porque muita coisa parece não fazer sentido agora.

Não consigo fazer nada. Tudo me lembra Lou e seus olhinhos vermelhos. Os mesmos olhos vermelhos a mataram.

Em Livermoony, só sabemos que estamos no verão quando chove. A primeira chuva é um evento importante.

A água que cai dos céus deveria ser reconfortante, como os livros dizem. Na verdade, o que me traz é uma angústia enorme. E pensamentos como: "E se eu for profana como meu pai?" e "E se a linhagem Livermoony foi arruinada por minha causa?" são frequentes. Vários e vários "se".

Caminho debaixo da chuva no jardim exterior, ocasionalmente passando a mão no nariz e colocando os dedos frios no bolso da calça, com absoluta certeza de que estou resfriada. O que não me impede de dar mais voltas no jardim.

Me sento na grama molhada e vejo o mundo ao meu redor. A calma é tão favorável que sinto como se pudesse me manter para sempre ali.

A transmissão que oficialmente demarcaria o fim de Lou, estava marcada para o dia seguinte. Provavelmente o que me fazia não querer voltar para o casarão, uma atitude egoísta.

O orgulho já me fez perder muito, se parar para pensar. Pedir perdão nunca foi meu ponto forte. Não que eu me odeie por isso, o orgulho também me ajudou de muitas formas.

Se eu for mesmo Aqua, poderia inundar o mundo com um estalar de dedos.

"Inundar o mundo" é uma perspectiva tão boa, que me tenta a fazer uma loucura. Como talvez, tentar o método dos Vermelhos. Não o tradicional. O que envolvia, em alguns casos, acidentes graves. O método que eu não, nem em um milhão de anos, deixaria Louise sequer tentar. Mas não sou tão hesitante quanto à minha própria segurança.

De pé, tento pensar no que fazer. Meus olhos não mudariam de cor, portanto, não adiantaria. Droga, me sento de novo, levantando as mãos para o alto, quase como implorando para que um raio me atingisse.

Não quero me sentir melhor. Digo, alguém realmente me amou e eu a deixei ir, não me recusei a seguir as ordens do meu pai. E foi assim com Zach também, e aos poucos vai acontecer o mesmo com meu pai. Não consigo manter uma, nem mesmo uma, relação estável.

Ouço passos, meu pai vem andando em minha direção. Primeiro, penso em me levantar e sair de perto. Não posso suportar olhar para ele. Depois, vejo que seria tolice, ele vai exigir que eu converse.

— Ficar sentada na chuva não vai resolver seus problemas — ele diz, colocando o guarda—chuva sobre minha cabeça. — Aja como adulta e volte para dentro.

Não respondo, nem me movo.

— Sarah, você não pode se dar ao luxo de ficar doente. Você precisa ser forte, ou Livermoony virará ruínas.

Eu realmente não sentiria falta dessa família. Como poderia?

Me mantenho imóvel.

— Lhe ofereceremos todas as armas necessárias, não que você precise. Poderá levar qualquer um de dentro ou fora da escolta. Você tem livre arbítrio...

— Se eu disser que irei você parará de falar? — Ele me envia o olhar paciente que sempre usa quando me repreende

Não cedo, mas me levanto, me afastando dele.

Vou diretamente para o pequeno escritório de Liz. Batendo a porta ao chegar, me aconchego no chão do escritório escuro e ponho a cabeça entre os joelhos.

— Senhorita? Ah, senhorita! O que aconteceu? — Liz se levanta e vem para perto de mim. — Por que está toda molhada?

— Posso ficar aqui? Não preciso de nada, só me deixe aqui, quietinha... — Falo soluçando e ela parece entender o recado.

— Vou buscar um cobertor, não se mexa. — Concordo com a cabeça e ela sai do escritório.

Não vou me sentir melhor até falar com Zach, penso. Parece ridículo, tenho certeza. Não me sentirei melhor nunca, mas quem sabe me deixe menos preocupada.

Encosto minha cabeça na parede e reflito, começando a bater os dentes.

Liz volta e me envolve com um cobertor verde, se senta ao meu lado e não fala nada.

— Liz, você está sendo ótima, obrigada. Vou te pedir mais um favor: traga Zacharias Carter aqui amanhã. Ainda antes da transmissão, por favor.

— Fico feliz em ajudar. Fique bem, senhorita. — Ela aperta meu ombro levemente.

Me levanto e saio da sala apertada. Sem me preocupar em parecer ter recuperado a compostura.

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