Zach
Acordo tarde como de costume, não havia dormido bem na noite passada. Meus irmãos dormiam na sala, assim como Anne. Vou à procura de Eleanor em passos silenciosos, mas nenhum barulho ecoa em nenhum dos cômodos, nem mesmo no jardim.
Uma onda de desespero tomou conta de mim. Ela tinha passado por uma noite traumática, um massacre Vermelho, não era daqui, não estava acostumada. Era comum nas vilas azuis, acontecia de tempos em tempos, mas Eleanor não sabia disso.
Vou até seu quarto, espero vê—la dormindo, mas nada, o quarto estava perfeitamente desocupado.
Por favor, não esteja morta. Por favor, não tenha ido embora.
O som da campainha ecoa. Ela não foi embora.
Desço rapidamente, ainda me preocupando em não fazer barulho. Abro a porta e encontro cabelos vermelhos brilhantes e olhos marrons, escuros, quase da cor da noite. Ela corre até mim, fecha a porta atrás de si e me abraça. Está machucada. Tem feridas abertas nos braços e ombros.
— Está tudo bem? — pergunto quando ela se afasta.
— Você tem que sair daqui, agora — Lily fala baixo.
— O que? Por quê? Você sabe de Eleanor?
— Eleanor não está aqui? — Ela anda pela casa, vai até o jardim e volta. — Zach, você precisa sair daqui agora. — Lily agarra meus ombros e os sacode levemente.
— Me explica o que está acontecendo. Eu posso ajudar.
— Não, não pode. Sai daqui logo. — Ela não fala assim, não comigo, não sem motivo.
Mas é óbvio que tem um motivo. A porta que antes estava fechada se escancara. Dois homens e duas mulheres. De olhos vermelhos. A mulher da frente aponta uma pistola para mim, têm traços asiáticos pela metade que vejo de seu rosto, a outra está coberta por um lenço. Os outros três vão para os outros cômodos da casa. Will e Emma. Tento correr, mas a mulher é mais rápida. Ela me agarra pela gola e me imobiliza no chão.
— Fique quieto. Eu não costumo dar segundas chances.
Lily fica parada encarando a mulher com um olhar ardente. Por um lado fico feliz que não está sendo machucada, por outro, não entendo, por que a Vermelha não atacou?
— Bom vê—la aqui, Monroe. Achei que tinha amarelado. — Lily ainda a encara, confiante, diferente da perplexidade que eu supunha. Elas se conhecem.
— Solte—o, Ava. — A Vermelha sorri ironicamente — Vamos, você escutou, não é ele quem você quer.
— Como é? Você está mesmo me dizendo o que fazer? — Ela pressionava minha cabeça contra o chão mais fortemente.
— Não, não estou, não ainda. Estou lhe dando uma escolha. Solte—o.
— Ou o quê? Você aprendeu a brincar agora? — A Vermelha pressiona a arma contra minha nuca e ameaça puxar o gatilho.
Lily vai até ela, puxa a arma de sua mão e a joga para um canto antes que a mulher possa reagir.
— Tão tola... Vai querer mesmo isso, Monroe? — Ela me solta e fica de pé.
— Ah, não vou pegar muito pesado, fique tranquila. – Suas mãos soltam fogo de repente. Chamas azuis. Salto para trás enquanto ela mantém o olhar sobre mim por um instante e depois de averiguar que eu estava bem soltou uma das chamas na direção da Vermelha que não me lembro do nome, mas se apaga antes mesmo de chegar nela.
— Nada que você tentar vai dar certo... — Mais uma chama, a mulher troca e a desvencilha para minha direção. Lily a apaga com um gesto da outra mão.
A mulher para por um momento, passa os olhos pela casa enquanto os mesmos trocam de cor, ficam em um tom bronze, laranjas. Lily prepara mais um chama, maior, mais azulada, mais quente, mais poderosa e antes que pudesse lançá—la, a Vermelha ágil tira outra pistola do cinto e atira diretamente em seu peito e mais uma vez em sua perna. Ela cai, pressionando o lábio para não gritar. E a mulher atira na minha direção, sem olhar. A bala atingiu minha perna em cheio, sinto a dor por um milésimo, mas para quando olho ao meu redor.
Os outros Vermelhos saem da casa, uma delas derruba propositalmente um vaso antes de passar pela porta, enquanto a mulher que me atingiu põe fogo em qualquer coisa que faça as chamas se espalharem rapidamente. As cortinas, pelo que me lembro. Não tenho certeza se eles vão voltar e não quero saber. Lily perde cada vez mais sangue. Vou até ela rapidamente. Rasgo um pedaço de minha blusa branca e tento cobrir seu ferimento, para estancar o sangue, em vão. O retalho fica cada vez mais rubro.
— Vai ficar tudo bem, ok? Eu vou chamar uma ambulância, você vai ficar bem, eu prometo.
A cor esvai seu rosto, com dedos trêmulos e frios ela segura meu tornozelo quando tento me levantar.
— Se mantenha seguro ou eu volto para te assombrar — Ela tenta sorrir. Seus olhos não estavam mais quase da cor da meia—noite com aquele brilho lunar de sempre. Ficavam cada vez mais na cor de seu cabelo. Não, eram ainda mais vermelhos e foscos.
— Ei, ei não. — Seu olhar se dirige a meus olhos, vazio, sem vida — Não... Fica comigo — Não adianta, ela não me escuta mais.
E foi assim que eu perdi as duas. Na mesma manhã, as duas escorrem como água pelas minhas mãos.
E acaba assim, sempre assim, mesmo que saiba lucidamente o que acontece depois. Minha camisa está molhada de suor, acordo ofegante, de novo. Faz dias desde o ataque Vermelho na casa de Eleanor. Dias desde que vi Lily pela última vez. Dias desde que voltei para a parte Azul da cidade e moro em um trailer alugado imundo com meus irmãos pequenos.
Emma e Will estão cada um de um lado da cama, me olham preocupados, com aquela expressão que já devia ter me acostumado.
— Estou bem — respondo sorrindo antes que eles possam perguntar.
Me levanto com dificuldade pela perna enfaixada, não me espantaria se inflamasse, e vou até o pequeno lavabo, me sento no chão sujo e apoio a cabeça nas mãos. Lágrimas involuntárias escorrem pelo meu rosto, tento secá—las com raiva, mas não funciona, elas continuam escorrendo. Abraço meus joelhos.
Sou ingrato, meus irmãos estão bem, mas aqui estou eu chorando por uma perda. Duas, me corrijo.
Não posso ficar me lamentando, a vida continua. Nem sei para onde Eleanor foi e Lily provavelmente está a sete palmos do chão. Sequer teve um enterro digno, era naturalmente Vermelha e as leis não permitem. Mas ela era melhor que isso. Nem mesmo as estrelas são imortais afinal.
Que irônico. Eles devem ter uma vida melhor do que a de alguns conhecidos, se passando por Marrons, vivendo livres por aí, enquanto eu fico nessa prisão que costumam chamar de vida.
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Home by Eleanor -Maria Brandão
Fantasía|HOME BY ELEANOR| Eleanor, uma garota que entrou dentro de um livro pego em uma biblioteca, em um mundo onde pessoas eram divididas pela cor dos seus olhos: Vermelhos, Azuis, Marrons e Verdes. Assim, Eleanor se torna uma Marrom e deverá rapidamente...