Aquele que dorme

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Alessia poderia correr, mas para onde? Sabia que se acabasse se perdendo ali poderia ficar por toda sua vida sem conseguir voltar, e sabia que a única coisa que a guiara até ali era as pilastras de onde vinha a criatura. Puxou então sua arma, em uma ideia de tentar atacar a criatura e sair dali, então pegou a tocha e a jogou o mais longe que pode na direção que havia sido atacada, afinal aquilo funcionava apenas para denunciar sua posição. E foi nesse instante que desistiu. A tocha caiu sobre o chão, mas tão nítido como se uma fogueira enorme estivesse ali ela pode ver dez formas se amontoando próxima a tocha. Mas a distração não durou nem um minuto, e logo voltaram a andar em sua direção, como se pudessem senti-la. Não havia como fugir, apenas se entrasse naquela câmera estranha onde ela sabia que havia algo adormecido lá dentro, algo com olhos vermelhos que não deveria estar vivo. Precisou apenas de alguns segundos para virar as costas para a tocha e dar quatro passos apressados em direção a porta, mas precisou sem a tocha acabou por precisar de mais tempo para se encontrar, por fim sua mão tocou a porta e a tateou à das silhuetas, seguindo o movimento de vortex que pulsava em direção ao centro para poder achar o altar.

A mão foi pressionada contra a abertura, e então sentiu pequenas agulhas entrando na sua carne. O sangue que escorreu pareceu brilhar na porta, assim como havia se lembrado na época, começando pelo cilindro do altar. E então sobre toda aquela forma orgânica que se movia sobre a porta, um círculo mágico se formou, e junto com o click da porta se abrindo ela escutou o som pungente e repulsivo atrás de si das criaturas a se mover em sua direção mais apressadamente. Não esperou que a porta se abrisse por completo, e assim que teve espaço se jogou para dentro do salão, e mesmo naquele momento, a imagem do salão a fez perder o fôlego. Ali ainda adormecida sobre o chão estava aquela forma estranha do que parecia ser uma armadura engolida pela pedra sobre algo que parecia ser um enorme altar ou algo do tipo. Lembrava que quando menor não conseguia ver direito o que estava a volta, mas agora ela podia ver com clareza, algo estranho visto que deveria estar sobre completa escuridão. Mas tochas acesas queimavam sobre as pilastras, trazendo uma iluminação lúgubre.

Não sabia se o que iria fazer era o certo, se era por isso que estava ali, mas algo lhe dizia o que devia fazer, que devia repetir o mesmo ritual de quando ela era pequena, caso contrário não iria nunca mais sair daquela escuridão. Sem nem pensar duas vezes sentou-se sobre a armadura, colocando as pernas em torno dela enquanto se debruçou para procurar pela abertura. Podia ouvir o rastejar ficando mais alto, logo estariam sobre o grande portão aberto, e ela não tinha muito tempo nem habilidade para lutar contra eles ao mesmo tempo. A abertura estava ali, e ela podia ver tão claro como o dia o sangue ressecado de quando era jovem, lembrava-se da sensação, a mesma que a assomava agora e mesmo agora diante de toda ao olhar para o sangue ali, foi sua escolha depositar a mão, sabendo que o sangue que flui iria começar a banhar toda a armadura como outrora. Mas dessa vez algo estava diferente, palavras surgiam em seus lábios, e quase como um mantra, saiu baixo, quase um sussurro.

— Se tens sede de sangue, eu de sangue te encho. O aquele que dorme no Vale Negro, eu o invoco e o trago de volta para o mundo... Desperte. Serei de teu alimento para que possa ser o meu triunfo. Liberte-se das amarras que o prendem a esse mundo!

Mal havia percebido quando o círculo mágico que brilhará no portão agora surgia sobre o chão, criando então um campo à sua volta, instantes antes das criaturas subirem sobre os degraus. Quatro delas foram totalmente desintegradas ao toque, enquanto os outros ficavam a circular no local, como se observassem. Pouco a pouco o sangue de sua mão foi sendo drenado, seu corpo ia perdendo a força, como se a cada instante também sugava sua vida, mas apesar disso um sorriso surgia na face da garota até que aquele transe se quebrasse. As trevas a sua volta circulavam o ambiente como se estivesse viva, e algo muito alto soou em suas costas, um grito ensurdecedor de uma criatura que certamente não pertencia àquele mundo e logo o som de outras se juntaram aquela cacofonia de sons, era como um aviso, um aviso para algo que ela nem ao menos sabia. E então algo aconteceu, com uma lufada forte de um vento que surgiu debaixo de suas pernas o silêncio se instaurou assim como as ameaças por fora da barreira se silenciaram.

Vínculos de Sangue - Cronicas dos Filhos das TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora