O vale do Abismo

185 48 334
                                    

Sentiu como se estivesse em uma tempestade em mar aberto, estava à deriva, sendo jogada de um lado para o outro pelas ondas, engolida pelo mar, apenas para ser cuspida contra a tempestade de novo. Quando acordou sua cabeça doía, latejava como se estivesse em uma de suas piores ressacas, sua cabeça girava um pouco e tinha uma sensação nauseante em seu estômago. Seus olhos piscaram algumas vezes até conseguir enxergar algo que não estivesse turvo. Sentia a cama abaixo de si, o que indicava que de alguma forma fora posta em um quarto, seus olhos se voltavam para o ambiente a sua volta, o quarto era simples, nada além da cama, um baú antigo e sua penteadeira quando criança. Espera? Sua penteadeira? Estava no seu antigo quarto? Não, aquele lugar era diferente, o lugar era quase que idêntico, mas ela podia notar que havia algo diferente, maculado. Estava invertido, o quarto estava invertido.

Sua cômoda ficava na outra parede, enquanto a porta de madeira também estava do lado errado, agora a janela que lembrava de ter visto as chamas consumir as torres se encontrava à sua direita, e não à esquerda. Era estranho, talvez sua cabeça ainda estivesse confusa, ainda a sentia doer e pulsar sutilmente, de forma que levou a destra até a testa, massageando as têmporas. Ainda usava suas vestes de viagem, de maneira que se levantou, apoiando uma das mãos sobre a parede. Andava até a janela, não sabia dizer se era noite ou dia, mas a resposta que teve ao se apoiar a mesma foi algo assustador e ainda mais preocupante. Não conseguia ver nada além da janela, era como se apenas a escuridão habitasse o lado de fora, e ainda sim ela conseguia ver o quarto como se fosse dia, aquilo era totalmente surreal, contra as leis da natureza e não entendia como era possível. Aonde ela estava afinal?

Seus olhos se voltavam para a porta, tinha receio de ali também estar dominado pelas trevas e estar presa dentro daquele quarto, mas quando seus dedos puxaram a maçaneta e a porta se abriu, o que viu a surpreendeu. O corredor estava mais escuro, entretanto ainda podia ver claramente um corredor amplo que dava para o que parecia ser o resto do castelo. Mas novamente percebeu ali no corredor que havia algo de estranho, o quarto estava do lado errado, a porta agora percebendo também abriu para o lado contrário, era como se estivesse em um mundo invertido.

— Alguém aqui? — Perguntou deixando sua voz ecoar pelos corredores, mas aparentemente estava completamente sozinha naquele lugar.

Andou pelos corredores a esmo, apenas para notar que de fato aquele era quase igual ao castelo destruído de seu pai mas com algumas coisas diferentes, havia menos duas torres, o salão da ala norte não existia, e a biblioteca de seu pai ficava em outro lugar. Era quase como um labirinto, mas diferente, familiar. Estava a passear pelas estantes da biblioteca, os livros todos estavam em branco, o que era estranho, como se não estivesse conhecimento algum ali para ser lido, e eles fossem apenas um lembrete vazio de que aquele lugar era algo falso, uma imagem talvez? Sim, como nos espelhos de prata de sua mãe, refletisse a realidade, mas era falso, irreal, apenas uma imagem. E se estivesse em um mundo invertido? Será que estava presa em algum feitiço? Bem, se estivesse certa, aquele caminhante da noite que havia encontrado mais cedo certamente deveria estar por ali, ou alguma saída. Aquilo a fazia lembrar que ainda estava viva, bem achava que estava, ao menos sentia seu coração bater e apesar de não ter experiências pós mortes, acreditava que não seria assim.

E então um pequeno pensamento passou por sua mente, talvez a resposta estivesse no mesmo lugar em que havia entrado na escuridão no castelo de seu pai, nas masmorras onde havia encontrado a porta para as escadarias. Alessia não pensou duas vezes, começando a andar pelos corredores, acabou errando o caminho umas três vezes até encontrar o que procurava, o corredor estreito que dava para a escada curta e por fim para as celas. Mas quando chegou não encontrou nada ali, não havia nada de diferente, nada que não disse que aquela era uma masmorra comum de qualquer outro castelo. Não, tinha algo que estava faltando, tinha que continuar a procurar, ela sabia que de alguma forma acharia a saída dali ou ao menos respostas. Continuou a andar pelo castelo, era estranho como o tamanho dele parecia ser menor e ao mesmo tempo ele parecia muito mais complexo do que o castelo de seu pai.

Vínculos de Sangue - Cronicas dos Filhos das TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora