Silêncio

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Enquanto Rafael dirigia o carro, ela tentava prestar atenção aos detalhes do caminho, mas volta e meia sua mente insistia em voltar para aquele dia.

Já fazia cinco meses desde então, no entanto para ela era como se tivesse sido ontem.

Tinha muito vívido na memória aquele dia. Um dia que era para ter sido tão feliz e foi o pior da sua vida.

Ela suspirou fundo e voltou a prestar atenção na estrada. Viu ao longe a casa da fazenda e sentiu-se um pouco aliviada. Finalmente, teria um pouco de paz.

Esses últimos meses foram demais para ela. Chegara da turnê pela Europa toda animada e naquele dia...

Lágrimas começaram a rolar novamente pela sua face. Limpou-as rapidamente. Não queria que ninguém percebesse que ela havia chorado.
Rafael parou o carro, ela desceu, o agradeceu e sumiu pela porta.

Ele abriu o porta-malas e começou a descarregar algumas malas. Logo a Almira apareceu na porta.

-Nem vi que vocês chegaram, Rafael. Cadê a Maraisa? Onde vocês estavam? Aconteceu alguma coisa?

Rafael só fez sinal com a cabeça insinuando que a patroa já estava lá dentro. Almira olhou aquelas malas e logo deduziu.

-Não acredito que a Maraisa voltou àquela casa sozinha!! Rafael, você tinha que ter me avisado! Eu não deveria ter deixado-a sozinha. E como ela está? Ela reagiu bem?

Rafael lembrou-se do pedido da patroa e logo respondeu que estava tudo bem.
-Eu só peguei as malas que a Maria tinha deixado na sala, enquanto a patroa foi checar algumas coisas. Não aconteceu nada.

Almira pareceu não acreditar nas palavras dele. O sexto sentido de mãe dizia que algo muito ruim acontecera enquanto Maraisa estivera lá.

Aproximou-se do carro para ajudá-lo com as malas e viu no banco de trás um urso de pelúcia.

-Meu Deus! Que dor! Minha pobre menina!

Ela ajudou Rafael a levar as malas para dentro e foi procurar Maraisa. Foi de cômodo em cômodo, mas não a encontrou. Saiu no quintal e viu ao longe Maraisa sumindo no horizonte com seu cavalo.

Aproveitou que a filha não estava por perto e ligou para Maiara.
-Filha, você precisa vir até a fazenda.

-Que foi, mãe? Aconteceu alguma coisa com a Maraisa?

-Ela aproveitou que saímos e foi até a casa...

-Não acredito que ela fez isso!! E ela como está, mãe? Você falou com ela? Ela está chorando? Por isso que passei a manhã toda angustiada!

-Eu não falei com ela, meu amor! Ela está andando a cavalo. Vem pra cá.

-Já estamos terminando a sessão de fotos e vou correndo. Beijo, mãe.

Maiara desligou a ligação aflita. Chamou Paulinha do lado e pediu para que ela cancelasse o restante das fotos. Paulinha assentiu, afinal de contas, nesses últimos meses, o que ela mais fizera era cancelar compromissos da Maiara.

Enquanto isso na fazenda, Almira esperava as filhas. Desejava que a Maiara chegasse antes que a irmã voltasse, pois a filha talvez preferisse falar com a sua metade.

Ela ia de uma porta a outra tentando descobrir quem chegaria primeiro. Olhava o relógio e nada.
De repente ouviu um barulho na porta do fundo. Correu até lá, mas Maraisa já havia entrado e se dirigido ao banheiro.

Bateu na porta gentilmente.

Nenhuma resposta.

Tentou novamente.

Nada.

-Filha, meu amor! Você está bem? Quero falar com você.

Maraisa não respondeu. Ela não queria falar com ninguém.

Sua mãe insistiu e ela disse um "está tudo bem" abafado.

Ligou o chuveiro e começou tomar um banho. Queria que água lavasse a poeira do seu corpo e a dor da sua alma.
Esfregava-se freneticamente, mas em vão. A dor permanecia ali.

Após meia hora, saiu do banheiro, passou rapidamente pela mãe e trancou-se no quarto.
Seu desejo era dormir. Tomou um dos remédios que o médico havia prescrito e fechou os olhos.
Maiara chegou à fazenda toda afobada. Não deixou nem Paulinha parar o carro direito e já foi saltando dele.

Almira a esperava na varanda.

-Cadê ela, mãe?

-Ela chegou, tomou um banho e está na quarto.
Maiara nem esperou a mãe terminar de falar e saiu correndo em direção ao quarto da sua gêmea.

-Irmã, abre a porta. Queria deitar com você. Hey, irmã, deixa eu deitar agarradinha com você.

Nenhuma resposta.

Lá dentro, Maraisa dormia profundamente.
Maiara olhou pra trás e viu Almira com o urso de pelúcia na mão.

-Quem trouxe isso, mãe? - disse com lágrimas nos olhos.

-Foi a Maraisa.

-Isso é muito cruel. Será que ela encontrou na casa?

-Creio que sim.

Maiara deu um longo suspiro. Sabia o quanto sua metade estava sofrendo e ela também. Afinal, a família toda estava destroçada, mas eles precisavam ser fortes para dar força para a Maraisa.

-Mãe, será que ela dormiu?

-Espero que sim...

Maiara encostou a cabeça na porta para tentar ouvir alguma coisa. Silêncio.

A vida de Maraisa havia se tornado um vasto silêncio.

Depois da Tempestade Onde histórias criam vida. Descubra agora