29.

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Noah Urrea

O relógio do criado mudo marcava 11:00h. Não me lembrava de acordar tão tarde assim há muito tempo, mas imaginei que isso se desse pela minha atual exaustão. Não somente pela noite anterior, mas por todos esses meses.

Tentando não me mexer com muita força, me virei para o lado e encontrei Sina dormindo profundamente, os cabelos um pouco bagunçados espalhados pelo travesseiro. Os lençóis em volta dela estavam quase lisos, o que me fez imaginar que ela praticamente não tivesse se mexido durante a noite. Sua boca estava consideravelmente inchada e vermelha, o que me fez lembrar imediatamente da noite anterior. Eu era o responsável por aquilo.

A lembrança de tomá-la com força em meus braços e beijá-la violentamente em quase todos os momentos daquela noite estava fresca em minha memória, então todos os hematomas que trilhavam o corpo dela estavam lá única e exclusivamente por minha causa. Seu pescoço, principalmente, estava bastante marcado, assim como seus pulsos e as partes internas de suas coxas: justamente os lugares onde meu corpo esteve a maior parte do tempo em contato com o dela.

Continuei analisando-a, procurando por hematomas menos evidentes, mas no geral pude ver que ela não estava muito machucada. Isso não fez com que eu me sentisse menos culpado, mas pelo menos pude respirar um pouco mais aliviado.

Levantei-me lentamente, sem fazer muito barulho, e rumei para o banheiro. Torci para que o barulho do chuveiro ligando não a acordasse, e ao voltar ao quarto fique grato por isso não ter acontecido. Ela continuava tranquila e linda sobre os lençóis brancos, sua respiração profunda e lenta, e uma expressão de paz em seu rosto que fez com que eu me sentisse repentinamente bem.

Fiquei algum tempo apenas olhando para ela, sem sequer pensar em nada específico. Inconscientemente, estava agradecendo em silêncio por tê-la achado aquela noite e por tê-la comigo agora. Ela realmente muito mais do que eu merecia.

Quando finalmente consegui parar de admirá-la, procurei no closet uma calça e uma blusa informais, vestindo-as e deixando Sina aproveitar um pouco mais de seu sono tranquilo.

Fui para a cozinha preparar o café para nós dois. Estava faminto, e foi procurando por variedades que descobri que minha despensa estava vazia, fruto da depressão dos meses passados. Senti-me imediatmente feliz ao me dar conta de que até ontem, minha vida estava uma merda. Hoje, por contraste, eu estava no céu.

Escrevi em um papel as coisas mais urgentes que estavam em falta, como pão, café, leite, bolo, biscoitos, sucos, chás, frutas e tudo o mais que fazia parte de um bom café da manhã.

Interfonei para Marcos e pedi que ele encontrasse alguém na portaria que pudesse fazer o grande favor de ir até um supermercado e comprar aquelas coisas para mim. Dei a ele um cheque que com certeza cobriria aquela despesa e pedi para que, quando chegasse, ele trouxesse tudo para cima, sem tocar a campainha. Eu estaria atento a qualquer barulho.

O motivo para que eu mesmo não fosse lá era simples: Estava fora de questão deixar Sina sozinha ali. Não tinha absolutamente nada a ver com a minha confiança nela, mas sim com meu medo de que ela simplesmente acordasse e resolvesse desaparecer, transformando minha vida no antigo inferno que era. Eu não poderia permitir que ela fosse embora outra vez, porque se isso acontecesse, eu tenho certeza que enlouqueceria.

Eram aproximadamente 12:10h quando finalmente as compras chegaram. Agradeci muito a Marcos e tratei de colocar tudo para dentro, guardando a maioria das coisas nos armários e deixando o que serviria de café da manhã para Sina em cima da bancada. Comi bastante e, depois de me sentir satisfeito, fui verificar se ela já tinha acordado, mas ao chegar no quarto constatei de que ela ainda dormia, na mesma posição de antes.

𝗗𝗲 𝗥𝗲𝗽𝗲𝗻𝘁𝗲, 𝗔𝗺𝗼𝗿 | 𝗻𝗼𝗮𝗿𝘁.Onde histórias criam vida. Descubra agora