Sem fôlego

624 33 8
                                    

FEVEREIRO, 2017

Com a Mercedes C-Class preta estacionada na entrada da garagem, Elisabeth ficou em silêncio, com a cabeça apoiada no volante. Com os olhos fechados, ela respirava fundo, tentando conter as lágrimas que ameaçavam cair.

Aquele dia tinha sido uma merda.

A pré-temporada estava sendo uma verdadeira dor de cabeça para ela: com os preparativos para o lançamento do W08, o carro daquela temporada, a todo vapor, ela não tinha tido sequer um dia de folga. Para completar, as negociações apressadas com Valtteri para substituir Nico, que decidiu se aposentar repentinamente, sem nem avisar Toto ou Niki, consumiram todo o tempo e a paciência dela, afinal, a Williams não estava sendo muito solícita com seus avanços sobre um de seus principais pilotos.

Eles só conseguiram confirmar o finlandês pouco mais de um mês antes do início dos testes de pré-temporada. Foram necessárias algumas horas de conversa com Sir Frank Williams e sua filha, Claire, para que a equipe liberasse Valtteri. Elisabeth tinha certeza de que o carinho que eles tinham por Toto, da época em que ele ainda era um investidor da equipe, teve grande influência no sucesso da negociação.

No entanto, resolver aquele problema apenas abriu portas para muitos outros. Com a revisão do regulamento naquele ano, menos de um quinto do carro era igual ao do ano anterior. Isso significava horas revisando a contabilidade, bem como os orçamentos dos fornecedores, escalas de funcionários e horas de túnel de vento. No final do dia, Elisabeth se sentia completamente exausta, com forças apenas para se arrastar até a cama e dormir.

Naquele sábado não tinha sido diferente.

Elisabeth acordou cedo, se arrumou, tomou um espresso e foi para a fábrica. Por mais que quisesse a companhia de Toto, ela não teve coragem de acordá-lo. Ele estava trabalhando tanto quanto ela — provavelmente mais. Raras eram as noites em que não passava algumas horas a mais em seu home office, ou mesmo na fábrica, realizando reuniões com patrocinadores. Esse tinha sido o caso da noite anterior. Ele tinha ficado acordado até tarde, conversando com os diretores técnicos da Petronas, que estavam na Malásia, sobre os novos fluidos que estavam sendo desenvolvidos para aquele ano.

Ela teve uma manhã agitada, ocupada quase inteiramente com uma reunião para apresentar o plano logístico desenhado para a temporada. Durante a tarde, Elisabeth conversou com a equipe de marketing sobre as estratégias para o lançamento do W08. Ela também fez um tour pela fábrica para Mark McLaughlin, um dos diretores da Qualcomm. Após se despedir do americano e retornar ao seu escritório, Elisabeth encontrou um prato com um pequeno cupcake de chocolate, além de um cartão onde se lia "Parabéns, Elisabeth", junto com uma foto dela segurando uma das gigantes estrelas prateadas que a equipe utilizada nas comemorações.

Era o aniversário dela.

Ela havia esquecido do próprio aniversário.

— Porra — ela murmurou, levantando a cabeça do volante. Pensando nas mensagens que ela recebeu anteriormente e ignorou, enviadas pelos pais, por Lukas e por Claire, Elisabeth sentiu o coração apertar dentro do peito. Ela sempre passava o aniversário com a família em Viena, jantando em algum restaurante italiano, relembrando a passagem deles por Modena. Mas naquele ano ela tinha estado muito ocupada para sequer pensar em comemorar mais uma viagem ao redor do sol.

Ela pegou o celular que estava em cima do banco do passageiro ao lado de sua bolsa e olhou para a tela de bloqueio, que continha uma foto de Toto, Ben e Rosi, sorrindo para a câmera enquanto posavam em frente ao bolo de aniversário de Ben. Olhando para o rosto de Toto, Elisabeth não pôde deixar de sentir uma pontada no peito. Apesar das inúmeras mensagens de parabéns, não havia nada dele. A única vez que se falaram naquele dia, por telefone, foi durante o almoço, quando ele disse a ela que não iria à fábrica à tarde.

StarcrossedOnde histórias criam vida. Descubra agora