Multiplicação

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MAIO, 2018

Um silêncio sepulcral tomou conta da garagem.

Segurando o capacete de Valtteri nas mãos, Elisabeth o encarava paralisada. O rosto dele não escondia o sentimento de absoluto choque com o que tinha acabado de acontecer. Ela não podia culpá-lo, afinal, quem esperaria começar a sexta-feira de treinos livres em Mônaco com um capacete vomitado?

— Liesl, você tá bem? — ela escutou Toto perguntar, enquanto afastava uma mecha de cabelo do rosto dela.

Porém, Elisabeth não teve tempo de responder antes de uma nova onda de náusea subir pelo peito dela, a boca se enchendo de saliva. E então, ela levou o rosto novamente ao capacete, colocando o que tinha restado do café da manhã para fora, ao som de um gemido coletivo da garagem ao presenciar a cena.

Quando ela levantou o rosto de novo, Elisabeth estava ofegante, uma sensação estranha de vazio no estômago, acompanhada da tontura e do cansaço que a acompanhava há alguns dias.

— Tá se sentindo melhor, meu amor? — Toto perguntou baixinho — Respira pelo nariz, solta pela boca.

— Um pouquinho — ela conseguiu responder, enquanto ele retirava o capacete das mãos dela e entregava para Antti. Elisabeth não conseguiu perceber se o fisioterapeuta tinha feito alguma expressão de nojo ao pegar o objeto, já que Toto a conduziu para uma das cadeiras, enquanto Emilia entregava uma garrafa de água para ela.

— Ela comeu alguma coisa hoje de manhã? — Valtteri perguntou, cruzando os braços.

— Sim, a gente tomou café da manhã junto, tava tudo bem — Toto disse, passando uma mão pelos cabelos de Elisabeth.

Ela tentava se concentrar na própria respiração, ainda ofegante por conta do esforço que tinha feito para colocar tudo para fora. Porém, aquilo estava sendo mais difícil do que ela imaginava, ainda mais com a mente dela trabalhando para descobrir o que estava acontecendo consigo mesma.

Havia algum tempo que Elisabeth estava se sentindo estranha. Muito além de uma dor de cabeça particularmente irritante e de uma fadiga persistente, ela vinha sentindo o nariz constantemente entupido. "Só posso tá gripada", ela pensou, enquanto tomava mais um gole de água, fazendo uma careta ao perceber que o gosto dela parecia um tanto metálico.

Enquanto ela estava questionando o gosto da água, Toto falava algo sobre barco e hotel para Valtteri e Bradley, que pareciam concordar. Então, Elisabeth percebeu que ele estava abaixado na frente dela, a preocupação transparente no olhar dele.

— Você acha que consegue caminhar?

— Eu acho... Sim... Por quê?

— Vamos voltar pro hotel.

Ela piscou, confusa.

— Mas, ainda tem treino hoje...

— Vem, Liesl — Toto disse, se levantando e oferecendo uma mão para ela. Ficando de pé com alguma dificuldade por conta da tontura, Elisabeth tomou mais alguns goles de água antes de deixar os boxes rumo a passarela que levava ao paddock. Dali, eles seguiram em direção a marina que havia logo atrás dos motorhomes das equipes, na intenção de pegar um taxi boat para atravessar a baía, já que as ruas do centro estavam fechadas para as atividades da Fórmula 1.

"Que ideia de merda", Elisabeth pensou, enquanto sentia o estômago revirando com o balanço do barco. Fechando os olhos, ela tentou se concentrar na própria respiração, se recordando do que Toto tinha dito para ela ainda dentro da garagem. "Inspira pelo nariz, solta pela boca", ele repetia na mente dela.

— Liesl? — Toto perguntou baixinho, pegando na mão dela — Você tá bem?

Elisabeth balançou a cabeça positivamente, numa tentativa de tranquilizá-lo.

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