Uma pergunta

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AGOSTO, 2017

Era sempre difícil para Elisabeth voltar para Viena depois das férias, e ela nunca tinha certeza do porquê. Talvez fossem as lembranças desagradáveis dos dias de escola que isso evocava, ou talvez fosse apenas o simples fato de que significava retornar ao papel que ela precisava desempenhar em sua vida profissional — o de empresária séria e comedida.

Ultimamente, desempenhar esse papel a incomodava cada vez mais. Parecia que ela estava escondendo quem era de verdade. A mulher calorosa, gentil e descontraída que ela sabia que realmente era, estava sempre escondida sob os blazers de corte reto, calças sociais e salto alto. Mas ela sabia que, se não colocasse a máscara, ninguém a levaria a sério ou a respeitaria como profissional, principalmente dentro da Fórmula 1.

Não que as pessoas fizessem isso de qualquer maneira.

Foi um pouco diferente dentro da Mercedes, pelo menos. Na fábrica e dentro do motorhome, os funcionários da empresa a trataram com o mesmo tipo de deferência que demonstravam com os demais membros da diretoria, embora ela não esperasse ou exigisse nenhum tipo de tratamento especial. Ela comia no mesmo refeitório que o resto da equipe, usava os banheiros normais e conversava com o máximo de pessoas que podia. Ela os via como seus colegas e os tratava como tal.

Fora do motorhome, porém, a história era outra.

Elisabeth era vista apenas como alguém que havia entrado no automobilismo sem o conhecimento ou formação exigidos, e apenas por causa do pai dela. Quando ela foi anunciada como um dos membros do conselho da equipe, jornalistas e especialistas escreveram artigos sobre se ela teria ou não algo a contribuir para a equipe. Quando um jornalista perguntou a Helmut Marko, que havia competido ao lado do pai dela, sobre isso, ele afirmou que "a Fórmula 1 era muito brutal para as mulheres, mesmo trabalhando em escritórios".

A situação só piorou com a revelação do relacionamento com Toto. Agora havia mais um pilar no qual ela tinha se apoiado, teoricamente, para crescer naquele mundo. Ouvir Christian Horner dizer, no meio de uma entrevista coletiva, que esperava que, em caso de divórcio, a Mercedes ficasse com ela para facilitar a vida deles foi terrível para Elisabeth. Nem mesmo a resposta mal-humorada de Toto depois, dizendo que ela entendia o time tanto quanto ele e que nunca facilitaria a vida deles, doeu menos.

Parecia que ela era completamente minúscula, insignificante para todos eles, não importa o quanto ela trabalhasse tanto quanto cada um daqueles homens. Por isso ela precisava ser forte. Implacável. Perfeita. Mesmo ao custo de sua felicidade.

— Elisabeth?

Elisabeth percebeu que Toto já havia desligado o carro. Ela estava tão concentrada nos próprios pensamentos que nem percebeu que eles haviam parado na rua atrás da cobertura, onde ele costumava estacionar o carro.

— Sim?

— Você tá bem?

Elisabeth assentiu.

— Sim, só pensando no — ela hesitou brevemente, imaginando se deveria trazer isso à tona com ele. Sempre que as dúvidas se instalavam dentro dela, Toto fazia um longo discurso sobre como ela tinha conquistado tudo o que tinha, tanto na empresa quanto na vida. Ela não estava com disposição para a mesma velha ladainha agora — O que eu ainda tenho que fazer hoje.

— O que, por exemplo?

— Ah, bem, desfazer as malas, colocar as roupas na máquina de lavar, fazer o jantar...

— Você pode fazer tudo isso amanhã — disse Toto, enquanto colocava o câmbio em ponto morto — E deixa o jantar comigo.

— Toto, eu não...

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