Cinco

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A sala ainda estava vazia quando eu cheguei para a aula de literatura

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A sala ainda estava vazia quando eu cheguei para a aula de literatura. Subi alguns lances de escada e escolhi um lugar para me sentar, já retirando meu caderno, estojo e o livro que iríamos estudar pelos próximos dias da mochila.

Mesmo sendo a favor da tecnologia e da facilidade dela, não conseguia deixar de lado o papel e caneta, e adorava fazer meus resumos no caderno, sempre o decorando com várias opções de caneta colorida e marca-textos.

Aproveitei o silêncio, para terminar um resumo, distraída nas palavras de Shakespere, quando ouvi o sinal que informavam o início das aulas. Não demorou muito para a sala ser invadida por barulho de passos, cadeiras sendo arrastadas e mochilas sendo abertas.

Não muito tempo depois, o Sr. Smith – nosso professor - entrou na sala, já abrindo sua pasta e retirando o notebook de dentro dela, o posicionando em cima da mesa e o conectando ao telão logo em seguida.

Peguei meu exemplar de Hamlet, folheando as páginas enquanto o Sr. Smith preparava o primeiro slide da aula, quando vi meu pior pesadelo entrar na sala.

Ele olhou diretamente para mim, dando um meio sorriso e ajeitando a jaqueta preta e amarela dos lobos em seus ombros, antes de caminhar até o professor e entregar um papel para ele, que assentiu depois de ler o conteúdo.

Continuei boquiaberta, enquanto o via subir alguns lances da escada, e escolhendo - de todos os lugares vagos disponíveis - o lugar ao meu lado, jogando a mochila em cima da mesa e retirando seu notebook de dentro.

— Tá fazendo o que aqui? — minha voz saiu levemente esganiçada, enquanto eu o olhava de rabo de olho.

Eu sabia que ele me odiava, assim como eu também o odiava, sabia também que ele adorava me provocar até que eu perdesse a paciência – o que era sempre – mas era muita ousadia vir justamente para a aula de literatura, depois de passar três anos me criticando por gostar de ler.

— É minha aula adicional esse ano. — respondeu num sussurro, me olhando de soslaio.

— Você odeia ler, é de se admirar que saiba ler. — respondi ríspida, lembrando de todas as vezes que ele me lançou comentários sarcásticos sobre as obras que gostava de ler. Minha voz saiu um pouco mais alta, atraindo a atenção de outros alunos e fazendo o Sr. Smith me lançar um olhar repreensivo.

— Shiii... — ele levou o dedo indicador aos lábios, fazendo um gesto para que eu ficasse em silêncio. — Tô tentando prestar atenção na aula, e você está me atrapalhando — me repreendeu, voltando seu olhar para os slides à nossa frente.

Rodolffo Rios, queria realmente me irritar.

Senti meu olho direito piscar de nervoso, enquanto meus lábios se partiram ao meio, ao mesmo tempo que apertei a caneta, usando tanta força, que não duvidaria que se partisse em milhares de pedaços.

Voltei meu olhar para os slides à minha frente, talvez ele não quisesse me irritar, talvez estivesse apenas escolhendo uma matéria "fácil" para conseguir mais pontos no fim do semestre. Tentei me concentrar nisso e respirei fundo, tentando controlar as batidas do meu coração, o que era quase impossível.

Rodolffo estava perto demais para a minha segurança, e ele tinha a incrível capacidade de me deixar desconcertada, era por isso que eu evitava tanto ficar perto dele. Seu perfume forte e másculo exalava do seu pescoço, indo diretamente para minhas narinas e me deixavam ainda mais desnorteada.

Olhei de soslaio para ele, que continuava atento aos slides apresentados pelo Sr. Smith, digitando algumas coisas no notebook algumas vezes. Seus cabelos estavam brilhantes e pareciam macios, formando um bonito topete, seus lábios estavam levemente entreabertos, e quando ele o umedeceu com a língua, me ajeitei na cadeira e tentei desviar o olhar, mas parecia impossível.

— A aula é lá na frente, Freire. — disse sem se dar ao trabalho de olhar para mim, mas com aquele irritante sorriso de lado convencido dele.

Tive vontade de praguejar quando ele me flagrou olhando para ele, mas apenas me fingi de desentendida e voltei meu olhar para o Sr. Smith, concentrando todos meus esforços para ignorar a presença dele ao meu lado, e anotando as citações mais importantes da aula.

A sala parecia mais quente do que de costume, e meus cabelos já estavam fazendo a minha nuca suar. Larguei minha caneta na mesa, e passei os dedos pelos meus fios, os suspendendo para depois prendê-los num coque no alto da minha cabeça.

Senti seu olhar sobre mim, acompanhando todos os meus movimentos, o que me deixou ainda mais incomodada. Cruzei as pernas e mordi meu lábio inferior, evitando a todo custo olhar para ele, mantendo meu foco no telão à minha frente e na explicação do Sr. Smith, que nesse momento era apenas um borrão.

Só percebi que estava prendendo a respiração, quando ouvi o sino anunciar o fim da aula, e respirei aliviada por finalmente poder me afastar dele.

Vi todos os alunos juntarem suas coisas e saírem da sala e eu fiz o mesmo, decidindo ignorar a presença do moreno que me atormentava, e desci os lances de escada o mais rápido que conseguia.

Fui até o meu armário e guardei os livros da aula de literatura. Dei um salto e coloquei a mão no coração quando fechei o armário e dei de cara com Rodolffo parado bem ao meu lado.

— Cristo! — exclamei e ele deu um sorrisinho.

— Obrigado pelo elogio, mas pode me chamar de Rodolffo.

— O que você quer, Rodolffo? — perguntei brava, ignorando sua gracinha.

— Quero te levar para sair.

Pisco.

Suas palavras retumbam na minha cabeça e eu pisquei por alguns segundos, ainda tentando assimilar as palavras dele, antes de dar uma risada tão alta, que ele ficou sério e passou as mãos pelos cabelos de maneira nervosa, bagunçando seu topete.

— Não vou sair com você, Rios. — defini, dando de ombros e tentando sair de perto dele, mas ele é claro que me seguiu.

— Se não quiser sair hoje, podemos sair qualquer outro dia. — ele insistiu, e eu travei meus pés no chão, parando de andar e o encarei com os braços cruzados.

— Qual é a pegadinha?

— Não tem pegadinha, só quero sair com você. — ele ajeitou a mochila nos ombros e sorriu, daquela forma irritantemente charmosa, que só ele conseguia. — Já passamos tempo demais nos odiando, quero uma trégua.

— Tarde demais para isso, Rios. — rolei os olhos e voltei a andar, sendo seguida por ele.

— Posso te dar uma carona pelo menos?

— Eu vim de carro. — o cortei novamente, apressando o passo e o deixando para trás.

Olhei por cima do meu ombro enquanto seguia o caminho até o estacionamento, ele continuava parado exatamente no mesmo lugar.

— Garoto doido. — falei para mim mesma, voltando a olhar para frente e vi Rallyson acenar quando me aproximei dele.

A ApostaOnde histórias criam vida. Descubra agora