ADANNA, 1895
Por que as pessoas insistem em odiar o outro por conta de cor?
Deve ser a milésima vez que penso isso enquanto esfrego as roupas da minha sinhá.Pela lei, dizem que estamos libertos. Dessa vez oficialmente libertos.
Mas do que adianta se a liberdade é apenas escrita num pedaço de papel?
Muitos ainda nos olham com desdém e nojo. Como se fôssemos inferiores a grandeza que eles representam. Ou dizem representar.
Muitos não nos oferecem trabalhos dignos. Muitos ainda acham que são benfeitores ao nos fazer trabalhar de sol a sol por um prato de comida.
Muitos de nós ainda tem medo de andar pelas ruas, medo de esbarrar em alguém ruim. E o que mais existia por ali era gente ruim.
Por isso que quando eu era pequena, minha mãe ainda grávida me pegou uma noite e fugiu comigo. Ela apenas tinha colocado a mão na minha boca pedindo silêncio quando me tirou da palha que era minha cama.
Estava chovendo demais, uma chuva pesada e tudo parecia mais escuro do que o possível. Mas minha mãe me guiava como se soubesse o caminho de cabeça.
Eu tinha apenas cinco anos, mas sabia desde nova o que o barulho podia atrair. Se mostrasse qualquer sinal de agitação, pessoas más viriam. Então me calei e segui minha mãe pela chuva que gelava meus ossos e a terra molhada que várias vezes me fazia escorregar.
Andamos o que parecia serem horas. Nos escondemos por dias. Comemos da mata e bebíamos água do rio e voltávamos a andar.
Foi assim também que vi que minha mãe mesmo cansada, parecia ter só um objetivo na mente. E eu? Só estava feliz de não estar mais na senzala. Feliz por não ver tanta criança e gente que nem eu com rosto de dor, com corpo machucado e um cheiro ruim constante. Apesar de termos nosso momentos bons, parecia que os momentos ruins sempre se sobrepunham.
Depois de muito tempo andando, minha mãe de repente havia parado estática, e lágrimas corriam pelo rosto dela como um rio abundante.
Estava tão atentada olhando ela que não vi quando uma moça passou pela mata com um sorriso no rosto.
E desde então, eu experimentei o gosto da liberdade.
Mesmo que escondida.
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Até quarta!
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ENFIM, LIBERTA
RomanceSINOPSE: Ana sempre sentiu um vazio, uma desconexão com o mundo desde criança. Ela foi abandonada quando bebê na porta de um orfanato e adotada aos doze junto com sua irmã de coração. Mesmo assim, ela se sentia estranha. Esse vazio só aumenta quando...