Conseguimos?

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Maiara narrando

Assim que Julia me avisou que estava indo até a casa de Maraisa, eu me arrumei rápido saindo com Ricardo em seguida. Ela não me disse o que exatamente estava acontecendo, não disse o que minha irmã disse, ou por que estava indo pra lá, mas fomos. Cheguei lá primeiro, Ricardo veio dirigindo, Julia chegou em uma ambulância e uma viatura atrás. De fora tudo parecia bem. Não havia nenhum sinal de algo horrível acontecendo, muito pelo contrário, parecia uma casa normal e muito bem silenciosa.

Mas eu sabia que tinha alguma coisa errada, um aperto no meu coração gritava que alguma coisa estava acontecendo com a Maraisa, e isso nunca costuma errar. Os policiais entraram primeiro pra ter certeza que podíamos entrar, e logo ouvi um deles gritar:

Xx: Achei o corpo dela.

Sua voz parecia vir da área externa, não tinha nenhum rastro de nada ali. Meu coração quase parou quando ouvi ele dizer "corpo". Julia estava acompanhada por outro médico, e sem pensar muito fomos pra área externa da casa. Os policiais tentavam tirar Maraisa da piscina, estava frio pra caramba, chovendo muito, e ventando também. Eu só não entendia porque ela estava afogada se ela sabe nadar.

Eu: Ai meu Deus, Ricardo. – Sussurrei – Ela tá amarrada.

Aquela cena dilacerou meu coração. Eu nunca tinha visto ela tão frágil ou machucada como agora. Meu coração palpitou, meus olhos se encheram, e a coisa mais forte que eu sentia era raiva. Raiva daquele babaca que deixou a minha irmã desse jeito. Provavelmente ela não estava aqui a muito tempo, mas a estava com quase 7 graus de temperatura, tá frio o suficiente pra ela ter uma hipotermia em minutos.

Seus pulsos estavam completamente amarrados, ela estava nua, completamente roxa e gelada. Seu corpo inteiro estava machucado, muitos hematomas cobriam todo o seu corpo, marcas de arranhões na parte interna da sua coxa, fora o sangue que deixou a piscina de outra cor. Ela estava completamente exposta, e isso deixava meu coração dilacerado.

Julia: Preciso que vocês saiam daqui. – Se referiu aos policiais.

Xx: A gente precisa coletar provas sobre o estupro. – Julia negou.

Julia: Coletar provas sobre estupro, significa mexer em cada cantinho que ele a tocou, fazer isso sem a permissão dela, seria abuso sexual! Saiam logo daqui. – Gritou.

Xx: Só estamos fazendo o nosso trabalho.

Julia: O trabalho de vocês é manter as pessoas seguras. E não estão fazendo isso agora, porque enquanto perdem tempo tentando ensinar o meu trabalho, o agressor da vítima está solto por aí. – O policial se preparou pra falar – A vítima tá completamente exposta, isso não é confortável, principalmente pra família. Então, preciso que saiam daqui! Agora.

Eu nem sabia que ela podia falar daquele jeito com policiais, mas eles saíram. Eu tentei cobrir minha irmã com algumas toalhas na tentativa de aquecer ela, mas nada parecia adiantar. Julia media a pressão e os batimentos da minha irmã, enquanto o outro médico imobilizava ela e tentava aquecer ela.

Eu: De onde veio tanto sangue? – Julia me olhou.

Julia: Sua irmã vem sendo estrupada da forma mais violenta possível, não é nenhuma surpresa que tenha tanto sangue aqui. E isso tá me preocupando.

Ricardo: Ela tá ficando mais roxa.

Julia: Tá entrando em choque, a gente precisa ir pro hospital. Ela vai parar se ficarmos mais tempo aqui. – Alertou se levantando – Vamos, rápido.

Julia correu com ela e o outro médico pra ambulância, enquanto eu e Ricardo fomos de carro. Ainda tinha policiais por ali. Eles estavam tirando algumas fotos das coisas que estavam no chão, e de algumas horas de sangue no chão. Não sei se Gabriel realmente fugiu, mas não o vi ali. Quando fomos pro hospital, as coisas começaram a acontecer rápido demais. Os médicos corriam de um lado a outro, carregavam máquinas, tentavam aquecer ela, ultrassom portátil, média pressão, verificava os batimentos, estava tudo uma loucura.

Julia: Ela tem uma fratura na coluna. – Falou enquanto examinava a minha irmã – Tá vendo alguma coisa aí, doutor Matias?

Matias: Machucado no colo do útero. Gravíssimo, não sei como ela aguentou tanto tempo. – Ele olhou pra mim – A gente vai precisar cuidar dela, e tecnicamente, algumas coisas apagariam as provas de que algo aconteceu – eu assenti sem deixar ele terminar.

Eu: Podem fazer. Façam tudo pra prender aquele canalha. – Ricardo apertou minha mão como se perguntasse se eu tinha certeza do que estava fazendo – Ela vai querer provas. Eu conheço ela. Podem fazer.

Matias: Ok.

Logo surgiu um policial ali, o mesmo que ajudou a tirar Maraisa da água, não fui com a cara dele. Julia olhou pra ele sem dizer nada, mas ele entendeu o que ela queria saber.

Xx: Sou o agente Felipe. Eu preciso de algumas provas das agressões.

Julia: Não sei se o senhor está vendo, mas estamos examinando ela. – Respondeu sem prestar atenção nele – Fora que eu já disse que não podem fazer sem o consentimento dela ou de alguém da família.

Felipe: Tá me dizendo como devo fazer o meu trabalho?

Julia: Não, tô te dizendo que estou fazendo o meu e quero que saia daqui. – Ordenou.

Felipe: Você deveria ter mais respeito com um agente policial, eu mando aqui.

Julia: Você pode mandar lá fora, mas na minha sala e no meu hospital, quem manda sou eu! Agora sai daqui e me deixa fazer o meu trabalho.

Ele resmungou alguma coisa olhando pra Julia, e se virou saindo do quarto. Ainda não tinha entendido qual era a dele. Mas tinha alguma coisa muito errada com aquele homem. O clima piorou no quarto, tinha alguma coisa dando errado, a temperatura de Maraisa parecia não colaborar com os médicos. Tudo estava cada vez pior.

Eu não deveria estar ali, eu sei que não, mas eu queria, sentia que precisava ficar ali pela minha irmã. Aquilo era desesperador, eu só queria que ela acordasse, queria que ela levantasse agora e dissesse que estava bem. Eu não consigo parar de me culpar, eu sei que não foi minha culpa eu tentei avisar, mas é inevitável, não consigo parar de pensar que poderia ter dito mais, poderia ter insitindo mais.

Minha atenção voltou a movimentação no quarto, quando a máquina que media os batimentos dela parou em um "pii" infinito. Aquela era a linha que diziam muito sobre nossa vida, e naquele momento, a da minha irmã estava parada. Olhei pra Julia, que se levantou rápido iniciando as compressões, e eu me encolhi no cantinho do quarto começando a chorar.

Julia: Tirem ela daqui! – Olhou pra mim – Ela tá parando, carreguem o desfibrilador em 100.

Matias: Rápido pessoal. Estamos perdendo ela. – Julia olhou pra mim outra vez.

Julia: Desculpa, mas não posso deixar que veja isso. – Disse – Tira ela daqui, Ricardo! Agora!

Dessa vez não pareceu como um pedido. Ricardo me levou pra fora daquele quarto, me colocou sentada em uma das poltronas na sala de espera, e buscou água pra mim. Eu não conseguia mais respirar, meu coração se corroía por dentro, eram tantos questionamentos.

Ricardo: Respira! Respira! – Segurou minha mão – Ela vai cuidar bem da sua irmã.

Eu: Não posso perder ela de novo. Não aguento isso. – Ricardo se sentou ao meu lado me puxando pra um abraço.

Ricardo: Não vai, baixinha. Não vai perder ela outra vez. – Beijou minha testa.

Eu: Ela não só foi jogada lá. – Ricardo me olhou confuso – Ela sabe nadar. Ganhou medalha no oitavo ano. Sabe nadar sem as mãos. – Vi ele engolindo a seco.

Ricardo: Maiara, você acha que ela fez de propósito?

Eu: É de se esperar depois de tanto sofrimento. – Minha voz embargou – Eu não consigo nem imaginar como foi horrível. Eu tô com tanto medo.

Ricardo: Olha só, vamo pensar positivo agora. Ela vai ficar bem. E tiramos ela de lá, já é meio caminho andado. – Assenti limpando o rosto.

Eu: Tem razão. – Olhei pra ele – Obrigado por estar comigo.

Ricardo: Nem agradece. Por que não descansa um pouco? Eu chamo você quando a Julia vier. – Me aconcheguei em seu braço – Vai ficar tudo bem. – Ele sussurrou – Tudo bem.

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