Oto se revirava na cama sem conseguir dormir. Não conseguia parar de pensar em Brisa, que naquele momento estava sozinha na cadeia lidando com uma culpa que não era dela. Ele descansar enquanto ela estava nessa situação não era nem justo.
Um pensamento o angustiava mais do que tudo: ela certamente estava achando que ele tinha a abandonado.
Tentava arquitetar um plano para tirá-la de lá sem precisar se expor. Mas, para isso, precisava achar algum advogado competente - e influente - que conseguisse a libertação imediata dela. Se demorasse muito, ela poderia ser enviada para um presídio e tudo seria muito mais complicado. Andava pelo quarto tentando lembrar de alguém no Brasil que pudesse indicar um bom advogado. Estava muito tempo fora do país e não mantinha contato com praticamente ninguém. Ainda que achasse algum amigo da adolescência, seria arriscado ter que contar qualquer coisa da história para justificar o pedido de indicação.
Até que se lembrou de uma das poucas pessoas de sua família em que podia confiar minimamente. Uma "meia-tia" de seu pai, embora fosse uma parente distante, era a única que lhe tratava com carinho e compreensão na infância. Não a encontrava com muita frequência, pois ela também não gostava de seu pai, mas tinha afeto por ela - e ela por ele. Era uma senhora sábia e muito bem articulada socialmente. Tinha certeza de que conheceria algum advogado ou alguém que pudesse indicar um que atuasse na área criminal.
Estava decidido a procurá-la assim que amanhecesse. Fazia muitos anos que não a via, mas lembrava de onde ela morava. Era no mesmo bairro do apartamento em que estava.
Um pouco mais tranquilo de ter encontrado algum meio de começar a resolver o problema, lembrou que Brisa havia lhe mostrado seu perfil no Instagram. Voltou no histórico do aplicativo e deitou na cama navegando pelos vídeos e fotos. Passou as horas da madrugada que faltavam para poder sair esgotando o conteúdo daquela timeline. Tinha um sorriso bobo no rosto, encantado com o canto e a dança de Brisa.
***
No começo da manhã, chegou à porta de sua tia Cotinha e tocou a campainha ansioso. Não demorou até que a simpática senhora aparecesse olhando quem era pela janelinha da porta.
- Oto? É você?
- Oi, tia Cotinha. Sim, sou eu.
- Entre, meu filho. Que surpresa boa!
Eles se abraçaram e ela passou as mãos em seu rosto como se quisesse atualizar a imagem que tinha dele.
- Pois é , tia, são mais de quinze anos que não nos vemos. Desde que fui morar em Portugal ainda não tinha voltado nenhuma vez ao Brasil.
- Imagino que não. Mas é uma alegria poder te ver novamente. Está tão bonito, meu querido! A melhor coisa que você podia ter feito você fez: ir viver sua vida longe daqui. Mas me diga... Você está precisando de alguma coisa? Estou sentido que você está angustiado....
Oto achava incrível como ela conseguia interpretá-lo melhor do que ele mesmo. Apesar do pouco contato que tiveram ao longo da vida, ela sempre parecia conseguir ler seus pensamentos - e sentimentos.
- Eu vim a trabalho. Acabou que um amigo me procurou, ele está passando por uma situação delicada, sofrendo perseguição de um sócio e enfrentando algumas acusações caluniosas. Eu queria muito ajudá-lo, mas não conheço nenhum advogado no Brasil, muito menos criminalista. Aí eu lembrei da senhora. Conhece algum? - Sentia-se mal por mentir para ela, mas não queria assustá-la, nem havia a necessidade de envolvê-la naquela situação.
- Conheço, conheço. Uma advogada. Laís. É uma mulher encantadora, muito séria e competente. Poucas vezes vi alguém tão apaixonado pelo trabalho como ela. Adoro todos eles, a família Monteiro.
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Dois mundos
FanfictionUma órfã de vida simples em Mandacaru, no interior do Maranhão. Criada em meio à natureza e imersa nas tradições do povo que a acolheu. Cantora e dançarina, mas também lavadeira, passadeira, costureira e o que mais fosse necessário na rotina de muit...