Em suas mãos

342 15 93
                                    

De volta, Oto entrou em casa cheio de bolsas na mão, além de sua mochila. Brisa tinha a testa franzida olhando para ele sem piscar.

- Oto, você tinha levado esse tanto de coisa?

Ele riu da pergunta.

- Não, amor, levei só umas roupas na mochila. Essas bolsas aqui são compras de Natal. Que você não vai saber o que são até o Natal... - Deu uma piscadela provocativa.

- Oxi! Vai fazer mistério, é?

- Vou! É surpresa. - Largou as bolsas no sofá e se aproximou dela para lhe dar um beijo. 

Ela puxava a gola da blusa dele sem notar. Reagia instintivamente à lembrança corporal da ausência dele todos aqueles dias.

Eu queria conversar com você.- disse se afastando para olhar em seus olhos. 

- Algum problema?- Sua voz saía oscilante, em tom de dúvida preocupada.

- Não. Na verdade, é para a gente começar a resolver os que a gente já tem. Aconteceu muita coisa, né? Muita coisa.

- Vamos lá para o quarto que daqui a pouco Tininha tá chegando com Tonho.

Oto pegou as bolsas no sofá e seguiram juntos para o quarto. Sentaram na beira da cama se olhando. Brisa tinha uma expressão de espera angustiada.

Ele segurou nas mãos dela, parecendo pensar nas palavras. Mas não demorou a começar a falar. Tinha pressa em se libertar daquilo.

- Brisa... Eu quero te contar o que eu fui fazer em São Luís, quando a gente se conheceu. Para a gente recomeçar sem segredos. Eu acho que a gente precisa...cuidar disso aqui, de nós. Precisamos ser mais cuidadosos com a gente. Não deixar qualquer coisa que acontece nos atrapalhar tão facilmente.

A expressão nos olhos dela mudou rapidamente da angústia para uma audição curiosa e cheia de expectativa.

- Nesse tempo que a gente ficou separado, eu pensei muito naquilo que a Tia Cotinha falou para a gente. Lembra? Parecia que ela tava adivinhando, né? Ela sempre enxerga além. E ela tem razão. Quando o amor é forte a gente consegue resistir a tudo no caminho. Mas não basta só o amor. A gente tem que cuidar, fortalecer a relação. Se proteger e manter essa proteção todos os dias. Você sabe que tem tanta coisa, tantas pessoas querendo ficar entre a gente, dificultar nossa vida. Não vamos deixar ninguém mais separar a gente! Vamos cuidar do nosso amor?

- Vamos, vamos cuidar! Eu também acho isso. - Passou a mão no rosto dele e o beijou.

- Então a gente precisa confiar um no outro. De verdade. - Suspirou criando coragem. -  Mas você tem que me prometer que vai ser como se eu nunca tivesse te contado isso. Você vai saber e só. Pela sua segurança, pela segurança do Tonho. Isso é a vantagem que eu tenho para segurar o Moretti longe da gente. Você entende isso?

- Entendo. Ninguém nunca vai saber. Pode confiar.

- Eu confio. Brisa, quando você apareceu naquele porta-malas, eu tinha acabado de finalizar o que eu tinha ido fazer em São Luís. Já estava indo embora  com a missão cumprida, praticamente sem falhas no que eu tinha planejado. Exceto o fato de que eu me atrasei. Esqueci o pen drive com as informações que eu tinha justamente ido atrás e tive que retornar para buscar. Foi quando você entrou no meu carro. Eu ainda não sabia, mas a minha vida tinha começado a mudar ali. - Fez uma pausa se aproximando mais dela. - Você sabe que eu trabalho com computação, com sistemas virtuais?

- Sei.

- Então. Desde bem novo eu comecei a gostar dessa coisa de internet, programação, criar modos de fazer as coisas virtualmente. Era como se eu pudesse criar o meu próprio mundo, do jeito que eu queria. Bem diferente da realidade aqui fora. Mas na internet existem barreiras de segurança, da mesma forma que a gente faz aqui. Para proteger nossas coisas, nossos bens. Isso cria uma série de restrições, de limites. Quando eu ainda estava aqui no Brasil, antes de ir morar fora, eu me divertia superando essas barreiras. Fazia pelo simples prazer de saber que eu conseguia superar aquelas limitações. Mas depois, quando eu comecei a trabalhar junto com o Moretti, eu fiz isso algumas vezes para a gente ter vantagens em certos negócios. Eu não me orgulho disso. O fato é que eu consigo desviar dessas barreiras, burlar sistemas de segurança e chegar em informações que estavam protegidas. Não deixa de ser um roubo, uma invasão. Até porque informações muitas vezes são mais valiosas do que objetos.

Dois mundosOnde histórias criam vida. Descubra agora