Parte 6 - A história de Einar

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Com o tempo descobrimos que tudo tem movimento, primeiro a terra, depois a lua, os planetas e por fim o sol, todos fazem sua própria rotação e translação, entorno de si ou de algo extremamente massivo, estamos em movimentos constantes e rápido e tudo que parece próximo pode estar mais longe do que imaginamos. Lembro quando pisamos em solo marciano, o planeta vermelho e rochoso, a gravidade de nossos corpos que ainda pareciam flutuar sutilmente, instalamos o primeiro laboratório de estudos naquele local inóspito e tudo fora filmado, as filmagens sim viajavam na velocidade da luz para terra, em tempo real éramos assistidos, nos tornamos celebridades do espaço suponho. As vezes pensar nisso tudo é como pensar em um sonho, um sonho ou delírio coletivo que eu e meus amigos tivemos. Queria ter uma roupa de mergulho, assim iria ao fundo das aguas buscar algo sobre o Módulo que desceu rumo a terra, voltaria à aquela praia e mergulharia naquele mar nem que fosse atrás algo pequeno como o relógio que tirei de meu pulso e deixei cair na praia e talvez ainda esteja lá, sim, eu pegaria nossas mochilas, embora fossem inúteis aqui, de certo cada uma delas havia algo para se lembrar de tudo o que vivenciamos não fora um delírio, de que de fato esse não era nosso mundo, de que realmente tínhamos cruzado uma linha, um paradoxo, um buraco de minhoca talvez? Eu tragaria a câmera de filmagens que Ana usava e fotografava, mesmo que fosse impossível ver alguma de suas gracinhas com fotos ou vídeos desprevenidos de nós seja dormindo, comendo ou reclamando. Eu saberia que aquilo era real, mesmo que nada funcionasse fosse apenas o objeto, seria ume lembrança do que um dia foi real.
Eu esperava que mesmo que o Módulo afundasse no fundo do oceano, quando fossemos resgatados a Marinha enviaria uma embarcação e submarinos para retirar o módulo, e caso estivéssemos em nossa época todos os eletrônicos molhados seriam recuperados.
Me arrependo de ter deixado tudo na sonda terrestre, se ao menos algo boiasse para a praia, como as nossas roupas ou qualquer coisa, qualquer coisa que me fizesse lembrar do que vivi e vivenciei para que ao menos guardasse de recordação. Talvez eu devesse ir até praia, olhar toda a bacia aquífera de Valkahein, talvez eu encontrasse algo, ou não, que diferença iria fazer de fato? Será que poderá acontecer novamente, mas de volta ao futuro? Refleti mergulhando em meus pensamentos.

As vezes pensar de mais me entristecia de mais, a ponto de achar que tudo aquilo era um sonho lucido, uma loucura novamente. Era melhor que eu pensasse em coisas boas, o futuro casamento com Davidson, meus pais, a viagem espacial, e depois a ida a marte, o contato com um novo planeta que só ocorrerá daqui a milhares de anos novamente, sendo que de certo modo eu não seria o viajante, um dos tripulantes de um foguete. Além disso vou mais a fundo, será que eu poderia mudar as coisas? Mudar o futuro estando no passado, se sim como saberia sobre o feito?

Se adaptar não era uma tarefa fácil, mesmo que já tivesse se passado semanas todos os dias parecia descobrir algo novo, de povos novos, de uma cultura nova, mas Nina estava se saindo tão bem quanto eu, acho que o vindouro em sua barriga lhe fizera pensar que talvez fosse melhor que ela se acostumasse com a ideia, com que ela não contestasse muito ou ficasse colocando sua vida em risco. Ela estava parada observando as ovelhas no pequeno pasto, embora tenha nevado não fora o suficiente para cobrir as raízes e as gramíneas ainda visíveis no solo, Kalef se aproximou carregando algo de baixo do braço, uma capa feita de lã na cor verde-musgo, tudo que havia cor aqui era sem muita vibração, sem muita vida, sem muita cor de verdade, ele a lançou a capa em seus ombros em seguida se ajoelhou cochichando algo em sua barriga. Eu não era um voyeur maluco, mas lembro que eu e Davidson gostávamos de observar casais, era o nosso hobby, de ver o modo como se tratavam, se havia amor ou não, tentar deduzir o tipo de relação que tinham, nesse caso Nina e Kalef estavam tentando não ficar juntos querendo ficar juntos, parece estranho, mas ela não admitia gostar dele, enquanto ele se derretia por ela. Dentre todos os homens acredito que Kalef seja o mais "descente" entre muitas aspas, ele é educado, preocupado, gentil, menos brutamonte que outros como Einar. Talvez as coisas mudem quando ela ganhar esse bebê, talvez ela pense que a criança precisara de proteção e talvez já até pense nisso, ainda mais depois do fato que lhe ocorrera. Lembro que antes observava durante a viagem Ana e Will, a graça de observar esses casais que não se assumem em ser um casal é justamente a presença de amor entre eles, muito afeto, presumo que eu Davidson éramos assim se nos olhasse bem iria notar as trocas de olhares, os risos bobos, as caricias escondidas. Nina disse algo a ele e ele se animou, dava para ver o riso e o brilho nos olhos em seguida ela pegou sua barba castanha escura que estava sendo tomada pelos fios pratas de sua idade e a puxou delicadamente, ela sempre fazia isso e ele sempre ria. Kalef deixava tudo de lado, seu machado seu escudo e sua pose de guarda guerreiro com a chegada e a proximidade dela, observar isso sem dúvida era minimamente engraçado, como assistir um filme de romance. Me aproximo de ambos após analisá-los por alguns minutos sentado em uma pedra ao longe, Nina estende os braços para mim.

Einar - Amar, Sangrar E MatarOnde histórias criam vida. Descubra agora