Pt 14 - Dois mundos?

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Não era um sonho, essa era a única prova que eu de fato pertencia ao futuro, um relógio digital, smartwatch da época, que não estava funcionando — é claro. Dei um leve sorriso olhando para o relógio em minha mão, quase que acariciando o objeto.

— Vou ajudar você a tentar voltar para o seu reino se essa for sua vontade, mesmo que eu não queira que parta — explicou ele — Isso é do seu mundo, não é? O que é?

— Um marcador de tempo...

Fiz que sim com a cabeça, e sorri, quase que involuntariamente tossindo um riso. Por muito tempo duvidei se eu realmente vinha do futuro, mesmo que tivesse Nina e Ana , não havia mais nada que provasse aquilo, mas agora? Agora entendo que sou um viajante e tenho algo para me refrescar a memória.

— Obrigado — pulei nos braços dele o abraçando. — Obrigado — Murmurei

O apertei firmemente nos braços, afagando meu rosto em seu ombro, sentindo tecido do linho pumfoso afagar meu rosto, ele me abraçou de volta, senti os cantos dos meus olhos se inundar, o apertei forte e ele apenas envolveu seus braços em mim, me afasto o olhando nos olhos, e inevitavelmente minha boca tocou a dele em um beijo tênue, carinhoso e demorado, ele me segurou nos braços, e aquele beijo se tornou algo um pouco mais quente, um beijo de verdade, na qual nossas línguas se encostaram e se embolaram atiçando um calor em nossas almas. Devo admitir que aprendi a usar a língua no beijo, após me apaixonar pelo Gabriel, um garoto cuja conheci no Brasil. Beijar com a língua, daquele modo é bem mais... Intenso, eu diria. Já entre eles é algo um tanto íntimo, não se há o nojo estrangeiro mas há um grau de intimidade, também não é como no Brasil...

Até que tudo ficou mais quente, excitante.
Segurou meu rosto ao nos afastar, com suas mãos nas laterais da minha cabeça, e com o polegar sutilmente acariciou as maçãs de meu rosto.

— Eu prometi à Nina que ajudaria ele com os enfermos. — murmurei o roubando outro beijo e ele sorriu.

— Tudo bem, pode começar por mim? — riu — Quero que troque meus curativos, e esse também....

Mostrou sua mão com o pequeno curativo no dedo mindinho.

— Tá,  tudo bem — falei baixinho saindo de seus braços e me levantando — Farei isso quando aparecer lá na cabana dos feridos.

— Ei, tenho mesmo que ir lá, por que não faz isso aqui?

— Por que não há curativos aqui — falei me retirando do ambiente.

Escutei ele me gritar ao fechar a porta.

Afkárr! — verberou sua voz grossa

Eu ri olhando o relógio em minha mão. Estava muito feliz, muito mesmo.

Corri imediatamente para a cabana dos feridos, entrei sem hesito cruzando o enorme cômodo cumprido e estreito, até que abri a cortina onde estava Ana e inesperadamente Nina, ambas estavam conversando. Que alívio encontrar as duas aqui! Eu esperava que eu fosse esperar nina chegar, mas pelo visto não seria necessário.
Me olharam supressas com expressões risonhas como se tivessem acabado de rir de algo.

— Bom dia — falei um tanto animado

— Bom dia vossa majest... — disse Nina zombando de mim

— Não me chame assim — falei constrangido e a interrompendo.

— Alguém acordou com um passarinho verde hoje — disse Nina me olhando estranhamente.

— Verde, verde... Eu não sei, mas um bem rosinha com certeza — Ana falou, Nina explodiu um riso, e há muito tempo eu não a via rir daquela forma.

Acabei por rir também no embalo de suas gargalhadas, mas tão breve ergui a mão mostrando o relógio, as duas foram tomadas por uma expressão inescrutável, inenarravelmente espantosa.

— Pensei que nunca veria algo tecnológico de novo — disse Nina tomando o relógio — Pela barba de Odin.

Ana riu, eu também. É engraçado usar essas expressões culturais que já estavam preguinadas em nós.

— Einar me deu, achou no corpo de um dos homens que lutamos. — falei tentando conter a animação, — Não sei se é o meu, ou do Wes, ele tinha um lembra? Se for dele significa que esse relógio veio do módulo, e que talvez nossas coisas estão a deriva, por aí, podemos tentar pegar...

— O quê? — Ana fez uma careta — Por que iríamos querer isso? Não faz sentido.

— Quite médico, as maletas de primeiros socorros eram impermeáveis, tem antibióticos, penicilina, vacinas, remédios que te melhorariam em instantes Ana, uma maleta daquelas e poderíamos até tentar replicar o remédios...

Ana olhou para Nina meio confusa, parecia perder as palavras e Nina também me olhou e negou a cabeça.

— Isac, eu não acho certo usarmos algo tão.... Tão avançado em uma época que as coisas simplesmente não existem, e se causarmos um desequilíbrio no futuro? E se deixarmos de existir.

— E se não houver futuro Nina? — falei com firmeza

— Como assim?

— A vidente, lembra ela me disse que são dois mundos diferentes, dois universos diferentes.

— Está se baseando numa vidente? Como...

— Não, não, não — disse Ana — ele pode estar certo — falou me apontando com sua mão boa. — Ele pode estar certo, lembra da teoria da relatividade?  A teoria foi comprovada um ano antes de nossa viagem, o que gerou uma onda de suicídios coletivos lembra? As pessoas se matavam achando que essa era a maneira de ir para o "ouro mundo"... dois mundos, um buraco de minhoca? Também tem outra coisa, estamos na Noruega, e nessa época era para o neto de Herald estar reinando toda a extensão de terra.... Nina — Ana pegou em seu braço —, Zach pode estar certo, se isso for verdade isso aumenta a probabilidade de conseguirmos voltar para casa, só precisamos saber como descruzar a fronteira dos mundos.

— Isso é maluquice gente, não há como, não há recursos — rebateu Nina.

— E se a fronteira estiver aqui, nesse mundo? Não precisaríamos de recursos algum, só acha-la a vidente disse...

— A vidente não sabe nada! — Nina esbravejou irritada.

Me entregou o relógio ao se dar conta de seu surto e se retirou as pressas.

— O quê deu nela? — perguntou Ana.

Não tive tempo de responder, saí do ambiente correndo confuso atrás de Nina, ao sair para fora me dei conta de como o ar estava abafado do lado de dentro sendo tomado por uma brisa gelada, uma sensação estranha, talvez estivesse muito acalorado.

Einar - Amar, Sangrar E MatarOnde histórias criam vida. Descubra agora