Capítulo III || Brooklyn Baby

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Não estou tendo o suficiente de Vivian. Achei que ela estaria pronta logo, mas seu espírito é mais forte do que eu poderia imaginar. O que é um problema, porque não posso passar muito tempo com ela para evitar que caia em tentação e que sofra os efeitos deletérios da outra dimensão, ao mesmo tempo em que não aguento ficar longe. Isso está me deixando no limite. A única solução é pedir a ajuda de Rowena.

Envolver Rowena em meus assuntos pessoais não é uma coisa que eu goste de fazer. Ela me lembra muito a Prostituta sem Nome da minha infância — não oferece nada sem que possa tirar algo antes (ou depois). E assim como tive que fazer com minha molestadora, eu a mantenho por perto porque ela é útil. Eu a odeio, mas admito que é brilhante.

Rowena Shultz, assim como a maioria de nós em Nícta, era só mais uma vadia com um passado a esquecer. E, como muitos de nós, não conseguiu abandonar suas más inclinações. Assim, buscou o ocultismo e descobriu como poderia manipular a energia para caminhar entre as duas dimensões que conhecemos. Descobriu que era possível absorver a energia mental das pessoas da outra dimensão, a custo da perda da sanidade delas. Era um preço baixo a se pagar. E como resultado, poderia passar mais tempo em outra dimensão, sem sofrer grandes prejuízos.

No início, usava sua capacidade para se divertir, conseguindo amantes, levando-os de lá para cá, seduzindo-os e enlouquecendo-os em seguida, ficando cada vez mais poderosa. Ela tinha que brincar bastante com suas presas, porque uma vez que transassem, com sua mente inútil, os homens não tinham mais serventia para ela.

Foi quando se envolveu com um político que precisava de seu adversário morto. Uma ideia surgiu em sua mente e, imediatamente, ela se ofereceu para matá-lo, a um preço exorbitante. Seria o crime perfeito, ela não estaria sequer na mesma dimensão para ser pega e com a natureza das interações entre as realidades, em pouco tempo o mandante do crime a esqueceria como num sonho. Assim, mesmo que precisasse passar pelo polígrafo, ele seria inocentado, já que sequer se lembraria de qualquer contato com ela. Rowena exigiu ser paga em ouro e usou todo o seu poder acumulado para transportá-lo entre as dimensões. Depois, foi fácil vendê-lo, convertendo-o em Nicquim, nossa moeda comum.

Seu primeiro trabalho foi um sucesso e logo vieram outros. Os negócios se expandiram e ela precisou contratar funcionários. O primeiro passo era enviá-los à outra dimensão, acessando com facilidade os fracos e deprimidos. Os idosos eram naturalmente o alvo mais procurado. Sua mente mais desgastada permitia um trabalho rápido. Não era preciso nada além de que provassem uma gota de sangue e fossem a Nícta uma ou duas vezes. Quando o escolhido era um homem ou uma mulher jovem e com a mente saudável, era necessário um pouco mais de esforço, com uma troca maior de sangue para um melhor enfraquecimento da consciência e por fim, o sexo que terminaria tudo e tornaria a loucura definitiva.

Ela passou a se encarregar de buscar os contratantes, enquanto seus empregados, de executar os serviços.

Foi quando Rowena me encontrou. Aparentemente, mesmo em Nícta, minha fama me precedeu e chamou sua atenção.

A verdade é que quando contei minha história a Martin, pouco depois de chegarmos aqui, omiti uma parte que hoje, anos de convivência depois, eu receio que ele já conheça bem.

Eu não apenas gosto de matar, mas desenvolvi uma grande afinidade com o sangue e a tortura. Já naquela época, quando contratado para um serviço limpo, eu o executava, mas nada me dava mais prazer que ter carta branca para exercitar minhas habilidades de causar dor e sofrimento. Os gritos de agonia passaram a ser a única música que eu queria escutar. Daí as histórias criadas a meu respeito. Dizia-se que eu tinha o hábito de beber o sangue de minhas vítimas, o que era um grande exagero, claro, isso nem sempre acontecia. Eu prefiro quando me é oferecido voluntariamente e apenas por algumas pessoas selecionadas.

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