Capítulo XI || Living Legend

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— O quê? — Ela pergunta, subitamente petrificada.

— Eric está morto, Vivian.

— Sim, nessa dimensão, ele agora está em Nícta... — Sua frase termina com um tom mais alto, transformando afirmação em pergunta no último momento.

— Não, não está. Essa é mais uma coisa que não te contei, e nem poderia, mas Nícta é um exílio para pessoas que estão num mau caminho nessa dimensão, mas que ainda têm alguma esperança de redenção. As pessoas são enviadas vivas para lá. Geralmente estão dormindo ou desmaiam e acordam na outra realidade. Nenhum morto ressuscita, nada é tão mágico assim.

— Mas Eric pode não estar morto, eu não vi seu corpo, nem o vi dentro do caixão... — Aquilo que chamo de coração se parte um pouco, à percepção de quão bem feita foi a manipulação que realizei em seu subconsciente para que ela acreditasse em tudo que coloquei em seus sonhos e pensamentos, através do poder mental. Seu semblante é de frágil esperança, como o de uma criança implorando para que eu confirme que o Papai Noel existe.

— Vivian, amor, Eric morreu. A avó dele fez o reconhecimento do corpo, o legista assinou o laudo, era realmente ele, e ele se foi, para sempre. Eu vi o papel. — Mal posso acreditar no que estou dizendo, estou eu mesmo, acabando com tudo pelo que trabalhei ao longo de meses. Nem no auge de uma tortura senti a adrenalina correndo com tanta força pelas minhas veias.

— Isso... Isso não é possível... Há quanto tempo você sabe? Por que não me contou? — Agora o desespero pinta lágrimas abundantes em seu rosto, meu peito se aperta e mais uma vez me seguro para não abraçá-la. — Sei que ela não vai querer isso nesse momento, não de mim.

É tudo ou nada, já cheguei até aqui, não posso retroceder.

— Eu sempre soube. — Declaro, tentando esconder as muitas emoções que poderiam ser reveladas pelo meu tom de voz.

— Você sempre soube? Desde o começo? Desde quando nos encontramos pela primeira vez? — Ela pergunta.

— Desde sempre. Desde antes de nos conhecermos pessoalmente.

— Dmitry, isso não faz sentido. Quando nos encontramos você disse que tinha vindo oferecer uma proposta, uma proposta para que eu buscasse meu marido que estava em algum lugar na sua dimensão, como... Como é possível... — Ela soluça, e não consigo resistir mais. Cubro a distância que nos separa e a pego nos braços. Sei que ainda está confusa porque aceita sem restrições o meu abraço. Acaricio seus cabelos, sinto seu cheiro pelo que pode ser a última vez e represo o rompante de dor que ameaça rasgar o meu peito. Ainda não, ainda não posso sucumbir.

Antes que tudo entre nós mude para sempre, eu a beijo faminto, engolindo suas lágrimas e querendo levar junto seu sofrimento e sua angústia, a que ela está sentindo e a que estou prestes a causar. Eu sou um monstro, um pária, o pior dos homens e eu a amo, é o que quero dizer. Não me arrependo de nada porque o que fiz me levou até ela. Vivian corresponde ao beijo, se entregando a mim, como sempre e, de alguma forma, isso torna as coisas ainda mais dolorosas, porque pela primeira vez tenho muito a perder.

Assim que nossos lábios se separam, eu olho no fundo dos seus olhos castanhos e quentes, como chocolate derretido e conhaque e admito de uma vez por todas:

— Eu menti.

Vivian se afasta imediatamente de mim, como se se desse conta de que está tocando algo impuro, e eu continuo.

— Foi tudo uma mentira. Eu sempre soube que seu marido estava morto. Só usei esse artifício para convencê-la a ir à Nícta comigo pela primeira vez.

— Que loucura é essa? Eric está morto, está realmente morto e você mentiu pra mim. Por quê? — Noto que suas lágrimas são agora de indignação e não mais de desesperança.

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