Lamento

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Logo pela manhã, Marcela dirigiu até a casa de Tereza, necessitando de um rosto e ombro amigo para desabafar. A viúva de seu primogênito também lhe era uma fonte de agradáveis lembranças, algo que lhe fazia falta.

No entanto, longe de concordar com suas reclamações, Tereza indicou com uma serenidade que irritou Marcela:

— É só um quarto.

— Não é "só um quarto", é o quarto do Luiz — retrucou ofendida. — Pensei que ficaria do meu lado.

— E estou — Tereza disse pegando a mão de Marcela com carinho. — Por isso peço que deixe o Luiz descansar.

Marcela ergueu-se revoltada.

— Insinua que faço mal em exigir que respeitem a memória do meu filho?

Permanecendo elegantemente sentada, Tereza elevou o olhar para a face contorcida de fúria de Marcela.

— A memória do Luiz é respeitada, o que você nem o senhor Roberto respeitam é o filho que continua vivo — Tereza disse fitando a ex-sogra com pesar.

A constante amabilidade de Tereza, sua capacidade de dizer as piores notícias com doçura, que Marcela sempre valorizou, agora lhe causava uma aflitiva vontade de gritar com a ex-nora.

— Tudo que fiz nos últimos oito anos foi pra proteger o Diego — falou na defensiva.

Sendo uma pessoa avessa a discussões, Tereza poupou ambas de apontar que Marcela protegia a si mesma.

— Perdoar o protegeria melhor — retrucou com suavidade. — Enrique garante que Diego nunca esqueceu a Penélope.

E esse era um dos motivos para Tereza não embarcar na sede de vingança de Marcela. Não o mais forte, nem o mais importante, mas o seguro, com o qual podia lidar.

— Diego aceitou retornar pra essa maldita cidade a fim de ocupar a presidência e expulsar aqueles filhotes de serpente da minha casa — Marcela bradou indignada com a suposição do irmão de Tereza. — Garanto que Roberto fez algo para obrigar Diego a aceitar aquela mulher.

— Como fizeram com o Luiz?

A acusação na pergunta desnorteou Marcela.

— Luiz jamais foi obrigado a nada.

— Vocês controlaram a vida e a morte do Luiz, e estão fazendo o mesmo com o Diego e com aquela pobre criança — Tereza expôs duramente.

A doçura presente nas íris azuladas e o leve sorriso na boca rosada aumentavam a aparência angelical de Tereza, um contraste com a declaração que Marcela recebeu como um tapa. Estava claro que a viúva de Luiz não a apoiaria. Pior, demonstrava ter pena do bastardo que arruinou suas vidas.

— Percebo que não terei sua ajuda e nem compreensão — concluiu revoltada, agarrando sua bolsa para partir. — Encontrarei em outro lugar.

Tereza levantou e segurou o braço da mulher de Marcela para evitar sua partida. Apiedou-se por encontrar no rosto da mulher de sessenta anos muita mágoa, raiva e tristeza. Sentimentos que abafavam a alegria e força de outrora.

— Marcela, esqueça e perdoe. Vingança só atrai desgraça.

Marcela impressionou-se pela face serena e impenetrável desde o começo da conversa, ser substituída por dor e algo mais que não conseguia identificar.

O problema era o pedido. Como esquecer e perdoar?

Puxou o braço e saiu apressada da casa de Tereza. Como havia dito: Encontraria ajuda em outro lugar. Tinha algumas poucas amigas na cidade que ajudariam a provar que Penélope não passava de uma interesseira. Encontraria uma forma de convencer Diego a se divorciar e destruir os Teixeira, como idealizou quando ele aceitou o chamado de Roberto.

~*~

A propriedade da praia mostrava-se um verdadeiro sonho. Por dentro tinha o conforto do ar condicionado, dos televisores enormes e opções de jogos familiares. Cercada por muros de pedras e árvores frutíferas, por fora tinha gramado, jardim florido e uma área com escorregador e banco de areia, tudo bem cuidado e conservado. A casa contava também com duas piscinas, uma menor e rasa, perfeita para crianças, e outra enorme e funda, ambas aquecidas, embora não fosse necessário naquele dia quente.

Acomodada em uma espreguiçadeira, Penélope observava Diego, na piscina maior, instruindo Samuel a como mover os braços e pernas na água. Ele mantinha o menino seguro com as mãos, auxiliando-o com toda calma e divertindo-o no processo.

Samuel ria alto a cada comemoração de Diego por seus avanços.

Era obvio, pelo menos para Penélope, que a felicidade do menino não se dava só pela aula de natação. Samuel resplandecia de alegria por ter um pai.

Embora crescesse com a presença masculina de Roberto, Samuel jamais teve aquele tempo de diversão, de atenção e risadas irrestritas. Roberto amava o menino, não havia dúvidas disso, mas, sempre focado no trabalho, a relação deles foi baseada em relatórios sobre os estudos e as refeições.

Compreendia essa necessidade e, ao mesmo tempo, tinha medo dela. O que aconteceria quando se divorciasse? Samuel se conformaria em se afastar de Diego?

Observando Diego pousar Samuel na beira da piscina e bagunçar os fios molhados do menino com os dedos, perguntou-se o que o Freitas sentiria.

Balançou a cabeça, afastando a esperança de que a afeição dele não fosse fingida, nem por obrigação. Era tolice, para não dizer loucura, imaginar que Diego se importava com Samuel e o quisesse em sua vida quando se divorciassem.

De dentro da casa, Hortência avisou que fez bolinhos de chuva. Samuel correu em direção a caseira sem olhar para trás. Penélope sentou-se, dividida entre segui-lo ou aproveitar um pouco mais o sol.

— Posso te ensinar a nadar agora — Diego ofereceu sentando na espreguiçadeira ao lado da dela.

— Sei nadar. Embora não o faça desde os dezesseis — contou olhando para a água límpida da piscina, tentando ignorar o corpo másculo só de sunga. — Ana, Jess e eu costumávamos nadar no lago da divisa com Rudá.

— E porque não nada desde os dezesseis?

— Passei por muita coisa...

A mão de Diego segurou seu queixo e a fez encara-lo.

— Lamento não ter te ouvido quando pediu minhaajuda.

Desejos ~ O filho secreto do CEO ~ DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora