Esperei alguns minutos depois que voltamos para o salão, para evitar levantar muitas suspeitas. Não voltei a ver Martynes, nem sabia onde ele estava, mas sabia que me encontraria no lugar combinado. E o momento se aproximava cada vez mais.
Poderia ter esquecido aquela história se Kyle tivesse me levado mais a sério, se tivesse pelo menos me beijado, mas, agora...
Parte de mim só estava frustrada com ele, decepcionada por sua falta de interesse, mas, por mais que corresse o risco de sair ainda mais machucada de tudo aquilo se contasse a verdade a Martynes, não me importava.
Me sentia tola por ter fantasiado um amor incondicional e épico com meu soldado, e agora mais do que nunca, queria desesperadamente que alguém me enxergasse de verdade. Que me ouvisse, que... me entendesse.
"O que ela mais quer é ser livre."
— Tudo bem, Clarissa? — Kyle murmurou de repente atrás de mim.
Estava parada perto de uma pilastra, apenas observando a multidão que ria, conversava e dançava alegremente ao som do quarteto de cordas.
— Estou. Eu só... — olhei o imenso relógio de pêndulo na parede nos fundos do salão — está um pouco calor. Será que você podia...
— Vou providenciar algo para você beber — falou prontamente, fazendo careta para as taças de champanhe que passavam. — Algo que a refresque ao invés de deixá-la zonza.
Típico.
Mas sorri em agradecimento, e Kyle deu dois passos para longe de mim antes de parar e me olhar por cima do ombro, uma sobrancelha arqueada.
— Sem fugas dessa vez, milady.
Quase revirei os olhos, mas consegui me obrigar a sorrir mais uma vez, com doçura.
— Não se preocupe. Estarei bem aqui quando voltar.
Ele assentiu, andando a passos largos pelo salão como se não quisesse se demorar muito, e dei apenas uma rápida olhada ao redor para me certificar de que ninguém prestava muita atenção em mim antes de deslizar para trás da pilastra e me embrenhar no meio das cortinas que decoravam as paredes.
Inventaria uma desculpa qualquer para Kyle mais tarde, certa de que ele ficaria uma fera comigo independente do que dissesse, mas não parei de correr até alcançar as portas duplas nos fundos do salão que davam para o jardim.
Era um lugar enorme, com várias trilhas, árvores e flores, e me apressei pelo caminho que sabia que daria no labirinto, vazio, escuro e fechado para visitação naquela noite. No entanto, a pequena corrente na fachada florida não me impediu de entrar, e corri pela trilha de cascalhos conforme me guiava pela memória para chegar no pequeno pátio no centro que abrigava uma grande árvore de flor de cerejeira, toda a paisagem iluminada apenas pelo brilho prateado da lua.
Martynes ainda não tinha chegado, então dei uma volta ao redor da árvore, passando distraidamente o dedo pelo tronco áspero enquanto tentava acalmar a respiração e colocar as ideias no lugar.
Esperava que ele chegasse logo, mas, ao mesmo tempo... ainda não sabia muito bem o que dizer.
Como deveria contar aquele tipo de coisa? Seria melhor começar desde o início, contar minha história e o que me levou a fazer o que fiz, para finalmente revelar minha identidade, ou simplesmente dizer... "surpresa, a dançarina mascarada do bordel sou eu"?
Suspirei, apoiando as costas contra o tronco, a folhagem cor-de-rosa da árvore pendendo elegantemente acima da minha cabeça.
— Talvez seja melhor contar de uma vez, e só depois tentar me explicar — murmurei com meus botões. — Quem sabe, assim, ele não fique tão chateado ou bravo comigo. — Baixei o olhar, mirando a grama aos meus pés. — Ou decepcionado.