Yan

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Locke não tinha salvação.

As coisas que Kal viu naquele encontro no bosque... as coisas que descobriu...

O irmão estava perdido. Completamente corrompido pelo poder nefasto. Talvez até sua alma já tivesse se partido.

Mas o Arquimago continuava lutando, tentando combater aquela doença, tentando impedir que toda Paradise sucumbisse àquele mal. Por mais que estivesse esgotado, por mais que seu corpo praticamente implorasse para parar... ele não parava. Lutaria até morrer.

Já estava travando aquela batalha por três dias incessantes, seu exército começando a perder terreno para o cansaço conforme as chamas negras infinitas e nymphas corrompidas, mortas-vivas, avançavam sob a liderança do irmão mais novo.

Será que é possível?, se perguntava entre uma respiração ofegante e outra, alternando entre combates físicos e mágicos. Derrotar um exército de seres que nem sequer estão vivos? Parar um fogo que simplesmente não se extingue?

Locke parecia ler sua mente, aquele sorriso macabro e perverso contorcendo seu rosto em uma máscara irreconhecível e perturbadora, lançando um feitiço maligno seguido do outro.

Kal, àquela altura, mais bloqueava do que atacava, a lateral do corpo sangrando sem parar depois que uma das lanças flamejantes do irmão o acertou, tentando a todo custo permanecer em pé, mas quando Locke ergueu o escudo e invocou o poder da terra, fazendo uma lança rochosa e pontuda se erguer do chão, o golpeando com tudo, teve tempo apenas de sentir o corpo ficar mais leve à medida que era lançado nos ares... e aterrissou com tudo no chão duro, rolando por vários metros.

— Desista, irmão... — Locke falou, a voz perturbadoramente tranquila e suave conforme se aproximava, e teve a covardia de lançar seu poder de fogo em um grupo de Elfos que lutava a alguns metros de distância. Como se quisesse limpar o caminho. — Pare de resistir. Nós dois sabemos que não tem como você vencer dessa vez. Apenas me dê o que eu quero, e descanse em paz.

— Locke... — Se arrastou pelo chão, até uma área rochosa ali perto. — Sei que já disse isso várias vezes ao longo dos anos, mas vou dizer mais uma. — Esticou a mão até um amontoado de pedras, os dentes trincados conforme lutava contra a dor dos ferimentos e de todas as costelas quebradas. — Vai se foder.

Fechou os dedos ao redor da espada que tinha sido arremessada para longe depois de um feitiço aquático que quase o tinha afogado, invocou os ventos e girou, arremessando a lâmina na direção do peito do irmão no exato segundo em que um raio atendia ao chamado da magia.

O barulho do impacto foi estrondoso, mas Locke apenas ergueu a mão, segurando a lâmina e absorvendo o golpe entre espasmos e gritos agonizantes, que Kal sabia que não seriam o suficiente para matá-lo apesar da brutalidade.

No entanto, a distração deu tempo suficiente para que se levantasse aos tropeços e usasse seus resquícios de força e energia para levantar os braços e invocar o feitiço dos ventos mais uma vez, criando um enorme furacão que ergueu e jogou Locke e seus mortos-vivos para os limites das chamas negras ao mesmo tempo em que servia de barreira.

Recuem! — gritou para seu exército. — Corram! Para trás!

Não sabia se seu plano teria sucesso, ou se serviria apenas para que seus companheiros ganhassem algum tempo, mas sustentou o furacão o quanto pôde enquanto os sobreviventes obedeciam.

Locke gritava de pura raiva, já recuperado do golpe e lançando um feitiço atrás do outro para extinguir a tempestade de vento, areia e relâmpagos, mas era uma técnica que ainda não tinha dominado. Um elemento que não tinha dominado.

No que dependesse de Kal, nunca dominaria. Preferia morrer antes que o irmão cumprisse seu objetivo.

E como se o momento estivesse mais próximo do que pensava, o Arquimago caiu de joelhos, praticamente sentindo a magia drenar o restante de suas forças enquanto a visão começava a escurecer.

— Kal! — o irmão gritava do outro lado da barreira. — Pare! Vai acabar se matando!

É claro que Locke ainda não queria sua morte. Mas por motivos completamente diferentes.

No entanto...

— Kal! — outra voz chamou, familiar, vindo do alto. — Kal!

Ergueu o olhar, a visão começando a embaçar... mas reconheceu o Backhast negro e esquelético, as asas encouraçadas abertas batendo furiosamente enquanto seu cavaleiro o encarava com olhos arregalados de um azul intenso no rosto pálido.

Yan... tinha acordado...

— Kal! — gritou. — Não pare! Continue!

Pare! — Locke berrou. Provavelmente sabia o que o irmão pretendia. — Kal, pare!

Kal não entendia, não conseguia mais raciocinar além do que estava bem à sua frente, mas fez como Yan mandou. Trincou os dentes, invocou sua espada de volta e a ergueu até os céus, chamando ventos, tempestades e relâmpagos, que explodiam e estouravam no limite das chamas negras, impedindo que o inimigo passasse.

Yan aterrissou ao seu lado, ainda claramente fraco e debilitado, mas afundou sua própria espada no solo e afundou os dedos na terra.

— Aguente mais um pouco, irmão — falou, respirando fundo. — Só mais um pouco. — E, encarando o ponto onde a silhueta envolta em magia corrompida de Locke era visível através da enorme coluna de vento e areia... — Agora você vai ver o que é um terremoto de verdade, seu pirralho.

E a terra começou a tremer.

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