2. A próxima fofoca

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"Comporte-se", as palavras firmes da minha mãe, enquanto apertava meu espartilho até quase quebrar minhas costelas, ecoavam em minha mente conforme a carruagem se dirigia até o Palacete. "E pare de olhar o soldado daquele jeito. Você está prestes a ficar noiva, pelo amor dos deuses!"

Engoli com força, tentando acalmar o coração acelerado. Ia dar um jeito de acabar com aquele casamento, só precisava ter paciência. E um ótimo plano que não jogasse minha família na lama.

Afastei a cortina e olhei pela janela, deixando que a brisa da manhã refrescasse minha pele. Aquele vestido era quente, e o espartilho dificultava a respiração, mas tive uma bela visão do vale no horizonte conforme a estrada que separava nossa residência do centro da cidade se estendia logo à frente. E, por mais que nunca tivesse visto, sabia que logo depois daqueles altos campos se encontrava o cintilante Marine, um oceano cristalino de águas que se mesclavam em tons de verde e azul.

E que separava Lux do terrível território de Tenebris.

Há muito tempo, antes que minha geração, ou até mesmo a dos meus avós e bisavós existisse, o mundo que conhecemos hoje era um único e amplo pedaço de terra, repleto de farturas, riquezas e magia, com um grande oceano o rodeando. Diziam que era um verdadeiro paraíso, onde humanos e seres mágicos, as chamadas nymphas, conviviam em paz e harmonia, governado por três irmãos poderosos, os Arquimagos, adorados e reverenciados como verdadeiros deuses. E, por isso, deram àquele território o nome de Paradise.

No entanto, um dia, o mais novo e ambicioso dos irmãos se rebelou e começou uma verdadeira guerra de poder, dominando uma parte de Paradise com a ajuda de magia profana, o que levou a muitas mortes catastróficas e uma maldição que se espalhou pela terra, a corrompendo como uma doença.

Depois de três dias de guerra incessante, o irmão mais velho conseguiu impedir que a maldição chegasse no lado norte do território, usando seus últimos resquícios de força e poder para erguer uma barreira, mas tanto o lado sul quanto o irmão mais novo já não tinham mais salvação. Então, o irmão do meio também usou suas últimas forças e separou as duas terras, colocando o Oceano Marine entre elas, e a antiga Paradise, unida e pacífica, se dividiu no que conhecemos hoje como Lux e Tenebris.

Dois territórios inimigos.

Parte considerável das nymphas ficaram presas do outro lado do oceano, e aqueles em Tenebris que sobreviveram e ergueram seu império corrompido agora eram praticantes de magia proibida. Nefasta. Porque é a única coisa que o solo produz, a única fonte de poder que existe lá.

Já em Lux...

Até onde eu sabia, ainda existia magia, mas se concentrava principalmente na capital. Vez ou outra os magos apareciam nas províncias que faziam fronteira com Apóllon, em viagem ou convocação, e tínhamos um pequeno vislumbre de suas habilidades fantásticas. Diziam que o Rei tinha uma frente considerável de magos e aprendizes, mas a verdade, e que não era segredo para ninguém, é que ainda estávamos em desvantagem em comparação a Tenebris.

Por isso, ir além do vale era estritamente proibido. Apenas os guardas e soldados tinham permissão de ir até lá, onde mantinham uma base reforçada e constante de vigia em cada centímetro de areia que cercava o Marine, para evitar invasões do inimigo. Era assim em todas as províncias de Lux, por mais que Tenebris estivesse em silêncio há séculos.

A primeira e única tentativa de invasão aconteceu alguns séculos depois da Divisão, na geração do meu tataravô, quando ele ainda era um simples soldado do exército. Inferis, a capital do reino sombrio de Tenebris, enviou uma frota e invadiu uma pequena província de Lux, a dominando e contaminando com sua maldição. Nosso lado conseguiu evitar maiores danos e deu o troco na mesma moeda, invadindo uma de suas províncias, mas serviu apenas para "equilibrar" o domínio e posses de terra, uma vez que aquele território é amaldiçoado e inabitável.

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