Capítulo 24

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Sexta-feira, dia seis de Setembro, vinte e uma hora e oito minutos, Alfonso abre a porta do meu apartamento, com uma cara de tanto faz, desejando Boa
Noite, joga as chaves em cima da mesa e se joga no sofá ao meu lado,
ignorando minha cara de raiva e meus braços cruzados.
Se vira e me dá um beijo. Que não foi correspondido.
— Podemos ir? — perguntei me levantando.
— Será que eu posso beber uma água antes? — Apontei para a cozinha
com um bico torto.
— Vou esperar lá em baixo, por favor traga minha mala.
— Mala? Serão quatro dias!
— E você quer que eu leve minhas roupas, sapatos, calcinhas, vestido de
festa, shampoo, condicionador, chinelo, biquíni, chapéu de sol, cremes hidratantes, aonde? Na bunda?
— Nossa, você tá pilhada... Vai descendo que eu levo suas coisas...
Soltei o ar de uma vez pela boca, tipo “que saco!” e desci.
...
— Qual o problema, meu amor? Eu não tô aqui?
— São nove da noite Alfonso, que horas vamos chegar lá?
— No pior dos casos meia noite. Por quê? Saudades de ver o Rodrigo?
Olhei o Alfonso, incrédula! Ele falou mesmo isso??
— Como é?
— Não tô entendendo esse desespero de chegar cedo!
— Rodrigo não tem nada a ver com isso! Estava preocupada com você! Passei o dia todo sem notícias suas!
— Desculpe! Mas não podia ligar, só isso!
— Alfonso tanto você faz hein?!
— Trabalho, pra ganhar dinheiro. E não estou gostando do seu tom de voz,
você está falando com quem? Com seu contratado ou com seu namorado?
Isso me pegou de surpresa, namorado? Ele acha que a gente tá
namorando?
— Namorado. — escolhi uma das opções e deixei pra ver o que ele iria
dizer.
— Então para de falar comigo como se fosse minha patroa, eu não gosto.
Além disso a gente vai chegar na melhor hora do dia.
— Melhor hora? ...
— Claro. — ele me olhou com cara de safado e isso me quebrou completamente, sorrir foi inevitável — E aí? Como foi seu dia?
— Foi médio... passei uns currículos...
— Alguma coisa?
— Tenho uma entrevista na semana que vem, esqueci o nome da empresa... Um nome diferente... mas é pra cuidar de contratos, então tá tudo certo.
— E a Maite?
— Sei lá... ela cismou que quer abrir uma loja de bolinho de chuva.
— Tá falando sério? — me perguntou com ar divertido.
— Sério! Disse que não existe loja de bolinho de chuvas e ela vai abrir uma.
— Ela é doidinha...
— Somos todos né, Alfonso?
Ele parou um pouco pra pensar, me olhou de cenho franzido.
— Tá falando isso por quê?
— Nada. — ficou um silêncio estranho e eu resolvi abrir a boca — Então, somos namorados?
— Bom, tenho pensado muito em você desse jeito, como minha namorada.
Você quer ser?
Caí na gargalhada e ele ficou ofendido.
— Desculpa! Alfonso! É que... — mais um pouco de risadas — ...parece que
voltei pra escola, mas esse seu pedido foi... fofo.
— Estou confuso. Isso foi um sim... Um não? ...
— Ai Alfonso, eu também estou bem confusa com relação à você.
Ele se fez de desentendido, mas ambos sabíamos do que estávamos
falando.
— Como assim?
— Como assim? Qual seu nome completo? Onde reside? Seu estado civil? Sabe o que você sabe de mim, Alfonso? Tudo. E o que sei de você? Nada.
— Você se prende a cada detalhe...
— Essa é sua resposta? Que isso é detalhe?
— Detalhe. Você sabe quem sou e isso é o mais importante, sabe que pode
contar comigo quando precisar confirmar uma mentira pra sua família, pros seus amigos, sabe que faço comida pra você não ficar se entupindo de biscoito recheado, que te fodo com vontade, que sou capaz de te dar banho, de conversar, te ouvir. Isso é o importante.
— Me diz que essas viagens que você faz não são ilegais.
— Não são ilegais. Você tá achando que sou traficante? — fiquei sem graça
e foi a vez dele cair na gargalhada.
— Nem sei mais o que pensar!
— Olha, façamos o seguinte, assim que voltarmos desse casamento, te
conto os detalhes da minha vida pra você sossegar essa sua imaginação.
— Tá. Mas pelo menos me diz se o seu nome é mesmo esse.
— É... é? É.
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— Isso foi ridículo Alfonso.
E lá estava ele rindo de mim mais uma vez.
Não paramos no caminho, fomos direto, estava tão cansada que dormi já na entrada de Itatiaia.
Nem percebi o carro parar, olhei para o lado e nada do Alfonso, pela janela
pude vê-lo conversando com um homem, próximo a um restaurante, cheguei a pensar que pedia informação, mas reparando bem no entorno, estávamos tão próximos da pousada, impossível se perder.
O homem que conversava com ele era de meia idade, falavam tranquilamente, por fim o homem lhe puxou pelo aperto de mão que se deram e encerrou o cumprimento com um abraço.
Eles se conheciam! Nossa! Alguém que conhecia o Alfonso! Precisava voltar
naquele restaurante!
Assim que se afastaram, Alfonso olhou para o carro e eu fechei os olhos com a
cabeça de lado, melhor fingir que ainda dormia, o fato do vidro do carro ser
escuro ajudou bastante.
Passou em frente ao carro e entrou, continuei paradinha.
— Any. — não respondi e ele seguiu para a pousada.
Voltou a me chamar quando entramos pelo portão, ainda aberto. Abri os
olhos, fingida que só a porra, fazendo de conta que havia acabado de ser
acordada, olhei para o relógio do painel, quase meia noite. Me espreguicei e abri a porta do carro.
Alfonso já estava tirando minha mala do banco de trás.
— Ei, acordou de vez ou te levo no colo?
— Acordei. — mentira, já estava acordada.
Assim que desci do carro minha tia apareceu na varanda com um baita
sorriso. Aí foi aquilo de família né?
Sumida”, “só assim pra gente se ver”, “tá sabendo que seu tio vai operar a
próstata?”, “menina seu cabelo tá grande, tá bonito”, “soube que a Dona
Jaciara morreu? Não? Morreu coitada”, “mas você arrumou um tipão hein minha filha?!”
Apresentei o Alfons e os constrangimentos seguiram conforme o protocolo familiar...
e vocês casam quando?”, “tá se cuidando né?!”, “não porque bebê tem que planejar”, “se bem que você tá ficando velha, não pode também passar muito...”.
Aff... E foi só minha tia que estava acordada, ainda teríamos de encarar meu tio, meus primos e meus padrinhos, mas... nada a fazer quanto a isso.
— O seu chalé. — tia Ana me deu as chaves do meu cantinho preferido
sempre que ficava em Penedo.
— Obrigada, tia, estou realmente cansada, amanhã de manhã a gente
conversa mais tá?
— Sim, vão descansar que essa viagem quebra a coluna da gente, te contei
que seu tio foi daqui em Mauá e ficou cheio de dor na lombar?
— É mesmo tia? Contou não... E ele tá melhor?
— É, tive que passar um remédio, mas... Sabe como é velho né?
Olhei para a cara do Alfonso que parecia se divertir muito com a situação.

Por fim conseguimos ir para o chalé. Meu cantinho, meu quartinho, meu...
— Ué, cadê a minha lareira?
— Como assim? Olha a lareira aí.
— Não Alfonso! Essa aqui é à gás! Quero saber cadê a minha lareira de pedra e lenha!!
— Quer voltar lá pra perguntar pra sua tia? — me olhou tentando segurar o
riso, debochado.
— Melhor não.
— Deixa de ser boba, você acha mesmo que vou deixar você com frio?
Perfeito. Um abraço perfeitamente colocado, no melhor momento, com as
falas certas, na hora certa. E um celular apitando. Maite.
— Chegamos agora sim, mas não posso falar. (...) Adivinha? É falta de
educação falar de boca cheia. (...) tchau.
Maite me olhando e segurando o lábio.
— Boca cheia? ... Cheia de que?
— Disso. — segurei o pau dele e Alfonso me beijou

Aluga-se um Noivo (Adaptada - AyA)Onde histórias criam vida. Descubra agora