Capítulo 2 - O monstro da floresta

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— Que porra foi aquela?! — Matheus perguntou assim que a pick up ganhou a estrada que conduzia para a cidade.

— Eu não sei, do nada aquela coisa apareceu e... — Sid estava arfando, passando as mãos suadas pelos cabelos de forma nervosa, mal conseguia terminar um pensamento, quanto mais uma fala.

— Era o Ren? Isso é impossível, né? Porque ele morreu... — Jeneth disse as palavras pesarosamente, porém com uma pitada de dúvida.

— Aquilo não pode ser o Ren, era o monstro da floresta! — Jesse falou roucamente, as mãos apertando firmemente o couro do volante, ele mordia o lábio inferior com força o suficiente para arrancar sangue.

Sangue, Sid olhou para a marca de mão ensanguentada na janela ao lado de Lina; "Aquilo era mesmo o monstro da floresta?", pensou, absorto demais para dar atenção aos amigos.

A lenda era bem clara: aqueles que morriam na floresta voltavam como monstros para se vingar daqueles que guardavam rancor. Esse mito era passado na cidade pelos mais velhos e se tornou popular depois que uma sucessão de mortes misteriosas começou a ocorrer. Eles encontravam cadáveres que aparentavam ter sido mordidos, sempre era uma bagunça na cena do crime, muito sangue e vísceras espalhadas pelos cantos.

Como filho de um policial, Sidney sabia mais do que gostaria sobre esses casos de homicídio. Nunca conseguiram determinar o culpado e, como as mortes sempre ocorriam na floresta, passaram a dizer que era um monstro para por medo nas crianças e não deixá-las irem até lá.

De fato, tudo o que motivou o grupo a ir ao despenhadeiro naquela tarde de inverno foi a suposta lenda do monstro da floresta. Sid obrigou Ren a acompanhá-los dizendo que, se ele encontrasse o suposto monstro, eles parariam de fazer bullying com o pobre coitado. O Amorim acreditou, pois já estava desesperado naquela altura do campeonato, então aceitou o desafio.

E pensar que as coisas acabariam daquela forma...

— E agora, o que vamos fazer, Sid? — questionou Lina, sua voz estava imersa na tensão — Sobre o Ren... Sobre aquele monstro... O que faremos?

— Por que está perguntando para mim, cacete? — Novamente o loiro passou as mãos pelos cabelos, trincando os dentes de nervosismo. — Era para ser só uma puta brincadeira, como foi acabar assim?

— Sim, uma brincadeira! — Jeneth exclamou — Mas vocês tinham que ir além, como sempre!

— Não vem tentar colocar a culpa na gente, não, Jeneth. Você também tem culpa, estamos nessa porra juntos!

— Eu nunca quis ir até o despenhadeiro!

— Mas não nos impediu de ir e ainda foi junto, tu é cúmplice.

— Todos somos cúmplices — Jesse colocou um ponto final na discussão — Cúmplices do Sid, que matou o Ren.

— Vai se foder, Jesse! Agora a culpa é toda minha?

— Você que começou a fazer bullying com ele! Nós só te seguimos porque somos seus amigos, mas, no fim das contas, por que você escolheu justo ele para fazer bullying? Por que não parou conforme os anos passavam? Não somos mais crianças, nós realmente passamos dos limites!

Era verdade, por que Sidney havia elegido Ren Amorim dentre todos os adolescentes da faculdade? Era por sua aparência exótica? Não eram todos que nasciam com albinismo e Ren certamente chamava a atenção por ter cabelos e pele tão branca quanto a neve, além de estranhos olhos vermelhos vivos — mesmo que sua expressão geralmente fosse mortiça. A parte disso, por que mesmo que Sid escolhera ele?

Ah, sim, foi porque Sidney Luiz Serra secretamente tinha uma queda por Ren Amorim, porém este fato ninguém poderia saber.

Jamais.

— Vamo voltar pras nossas casas e ficar quietos — disse o Serra, sacando seu maço de Parliament, e, com os dedos trêmulos, levou um dos cigarros até os lábios, acendendo-o com o isqueiro logo depois — E se por acaso a polícia vier até nós...

— Você quer dizer quando a polícia vier até nós — disse Jesse com um sorriso amargo.

— Que seja, nós apenas precisamos dizer que não estávamos com o Ren hoje. Vamos fazer parecer que ele escolheu se suicidar. Aquele monstro não vai nos seguir até a cidade, então vamo ficar na nossa e calar a boca.

— Mas nós matamos alguém...! — Jeneth sussurrou, enfática, estava pálida agora que o calor do momento havia passado, seu sotaque espanhol escorrendo junto ao desespero — Dios mio, nós realmente matamos alguém!

— Calma, amor. — Matheus passou um braço por seus ombros magros e a puxou para encostar a cabeça em seu peito. — Vai ficar tudo bem, não foi de propósito. Quando os policiais ouvirem nossa história eles vão entender que tudo foi culpa do Sid.

— Agora eu virei o alvo de vocês, seus filhos da puta? — esbravejou o loiro ao soltar uma baforada de fumaça.

— É a mais pura verdade! Foi você que o empurrou, eu pensei que nós só íamos tirar uma com a cara dele, não pensei que você fosse empurrá-lo do penhasco!

— Não foi por querer, eu só... — Sid se deteve, o cigarro amargo em seus lábios — Vocês não ouviram o que aquele maldito disse?

— O Ren disse alguma coisa? — Lina perguntou cínica — Ou você só está inventando isso para parecer menos culpado?

— Eu tô falando sério, porra! Aquele Cara de Fuinha me provocou!

— Estamos falando da mesma pessoa? — Jesse murmurou em tom de desaprovação.

— Que se foda se vocês não acreditam em mim. — Sidney voltou a olhar pela janela, olhando o retrovisor por um momento, como se quisesse se certificar de que o ex-companheiro não estava seguindo-os, porém seria impossível para um humano seguir um carro.

Certo?

Bem, quem disse que estamos falando de humanos agora?

Número de palavras: 943.

Kill BoyOnde histórias criam vida. Descubra agora