Capítulo 17 - Pistas

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— Pela última vez, eu não faço ideia do que aconteceu! — Erzel defendeu-se mais uma vez, quantas haviam sido até agora? Talvez três, talvez quatro, de qualquer forma, ele estava completamente irritado e cansado.

Outro corpo havia sido encontrado na floresta perto de onde ele morava, mas desta vez a vítima estava morta quando os policiais foram acionados. O lugar também era um pouco distante de onde Ren Amorim havia sido achado, entretanto não mudava o fato de ser na mesma floresta.

E, claro, Erzel foi o primeiro suspeito.

Agora, o homem encarava a face cansada de David Serra, internamente, o loiro sabia que o Giordani não era capaz de matar um ser humano, não, Erzel estava ocupado demais entalhando coisas em madeira para sequer prestar atenção nas pessoas que o rodeavam, por isso a floresta era seu lugar favorito, porque lá não existiam distrações para sua arte.

— É sério que pensam que eu matei alguém? — cuspiu, como se desacreditasse na simples e ingênua ideia dele ser considerado um assassino — Ora, por favor, Davi, você me conhece bem o suficiente para saber que isso é uma coisa estúpida.

— Tudo o que eu sei é o que os outros policiais também sabem: duas pessoas foram encontradas na floresta perto de onde você mora, uma morta, outra com sangue em suas roupas. Isso não parece suspeito demais? — Bufou, ele também sabia que aquele interrogatório era inútil, mas o protocolo exigia que investigasse o mais jovem.

A equipe forense estava demorando demais para trazer pistas que livrassem a barra de Erzel, talvez porque a neve tenha tornado tudo mais difícil de discernir, então, até lá, ele ficaria naquela salinha pequena e abafada com David. Não que a ideia desagradasse tanto assim o mais velho, afinal, eles já se conheciam há um tempo e, se não estivesse irritadíssimo, com certeza jogar conversa fora com o Giordani não seria ruim, mas agora... Agora aquele projeto de artista estava fumegando de tão bravo.

— Que motivos eu teria para assassinar alguém?

— Não sei, talvez queira uma nova "inspiração" para suas obras de arte.

— Está zombando de mim, Davi? — Sua voz soou ferida. — Sabe muito bem que tenho princípios rígidos a seguir.

— É, mas eu também sei que você faria qualquer coisa por sua arte.

Para essa alegação, Erzel apenas resmungou um palavrão em italiano e largou o corpo na cadeira de metal, suspirando porque sabia que aquele interrogatório era inútil, mas resistir a David era mais inútil ainda.

Então ele decidiu mudar de tática.

— Se eu soubesse que essa porcaria iria demorar tanto, teria trazido meu caderno de esboços... — Ronronou, voz baixa, lenta, e com uma pitada de calor ao adicionar: — Quando você vai posar para mim novamente, Davi?

O sargento fez um pigarro, tentando disfarçar o quanto aquela pergunta o surpreendeu, porém foi inegável que seu rosto ficasse minimamente mais corado, mesmo que fosse tão pouco. E o artista notou aquilo, ah, se notou.

Por baixo da mesa de metal chumbada ao chão, Erzel cruzou as pernas, encostando a ponta da botina na coxa do policial enquanto com uma das mãos apoiava o rosto. Um sorriso brincalhão apareceu em seu rosto jovial, os olhos cinzentos divertindo-se.

— Sabe — sussurrou novamente, parecia que estava prestes a cantar uma canção de ninar com aquela voz macia —, eu gosto do contato com a natureza, mas também gosto de contato humano de vez em quando...

Então, com a mão livre, ele tocou a destra de David que estava postada em cima da mesa, os dedos finos acariciando a pele desnuda.

O sargento engoliu um nó de saliva; uma beldade como Erzel Giordani estava se insinuando para ele! Ah, quantos não pagariam fortunas para estarem em sua pele? Qualquer mero mortal cairia perante o feitiço de um anjo como aquele: pele alva, cabelos castanho-claros, rosto delicado, feições andróginas, corpo jovem e aqueles belos e nebulosos olhos cinzentos... Era um filho perdido de Afrodite ou talvez fosse um incubus que se esgueirou para a mente de David e agora ele estivesse no meio de um sonho quente.

Não, aquilo era bem real, tão real quando o movimento da língua de Erzel sobre os lábios, humedecendo-os levemente.

"Concentre-se!", exigiu para si mesmo, travando a mandíbula em uma expressão sisuda, como se os gestos do mais novo não tivessem efeito algum nele.

— Você sabe muito bem que eu sou casado — disse, afastando a mão das garras do artista.

— Você também era casado cinco dias atrás, ainda assim nós transamos na minha cabana — ele deu de ombros, como se suas palavras fossem banais.

A tez do Serra ficou um tom mais rosada enquanto ele expelia uma baforada quente de ar. Brincar com Erzel sempre o levava para um único lugar: sua cama, ou, quando estavam com pressa, para o banco de trás de sua caminhonete desgastada.

— Sabe que minha porta sempre estará aberta para você, não sabe? — questionou retoricamente o mais jovem, um sorrisinho malicioso no rosto — Minha porta e minhas pernas...

— David. — Outra voz surgiu para atrapalhar o momento de quentura que havia se instaurado entre aqueles dois homens.

O Serra automaticamente se levantou de sua cadeira, agradecendo a todos os santos que conhecia por terem interrompido aquele desastre iminente. Ele se voltou para a porta, para outro policial que estava com documentos em mãos.

— A equipe forense não encontrou nenhuma pista que conecte o senhor Giordani ao corpo encontrado.

— Eu disse — proclamou o artista, vitorioso, mas também com um tom cansado — Já posso ir embora?

David revirou os olhos e acenou com a cabeça, vendo-o se levantar e prosseguir até a direção dos dois policiais. O companheiro do sargento disse que o levaria até a saída da delegacia e o loiro estava convencido de que havia superado aquele obstáculo quando, inesperadamente, ao passar por ele, Erzel roçou uma das mãos sobre sua calça, provocantemente olhando-o de rabo de olho.

"Cretino...!", o Serra controlou-se para não deixar nenhuma fibra de seu corpo se manifestar, porém, ah, como ele gostou de sentir aquele toque, mesmo através de suas roupas.

Erzel se foi e, logo depois, o policial que o escoltava — Mauricio — voltou-se para David com rugas na testa franzida.

— O que foi? O que encontraram para você estar com essa careta? — perguntou o sargento e ouviu um longo suspiro antes da resposta.

— Encontraram uma composição parecida com saliva no corpo da vítima.

— Saliva de animal?

— Também, foi encontrada saliva de lobos, porém... Outro tipo de saliva foi encontrada, mas nada apareceu no banco de dados dos cientistas.

— Meu Deus. — O Serra passou a mão pelos cabelos loiros, bagunçando-os levemente. — Conseguiram descobrir a identidade da vítima?

— Ainda não, apenas que a causa da morte foi por perda de sangue. — Em seguida, Mauricio pareceu afoito por algum motivo. — Parece que a vítima foi atacada por algo... ou alguém.

— O que está insinuando?

— Não pode ser o monstro da floresta, pode?

David deu uma risada nasal, tirando o companheiro por menos.

— Não seja idiota, essa é só uma história pra boi dormir.

— Então o que mais pode ser?

— Talvez um pobre infeliz tenha tentado se suicidar e deu certo.

— Não brinque com isso, senhor.

— Desculpe — o loiro riu um pouco mais.

O companheiro estava exagerando, claro, ninguém deveria brincar com a vida de alguém, mas provavelmente aquilo se tratava apenas de um incidente infeliz e nada mais.

Certo?

Número de palavras: 1.228.

Kill BoyOnde histórias criam vida. Descubra agora