Capítulo 10 - Instintos e desejos

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Embrulhado entre os cobertores, Ren mordiscava a unha do polegar enquanto encarava as duas bolsas de sangue que havia roubado da casa de repouso instintivamente.

Por que o gosto era tão bom? Ele havia virado um vampiro ou coisa do tipo? Não, parecia pior, algo mais terrível. A comida não tinha sabor, seus instintos estavam apuradíssimos e ele não tinha mais noção de dor — ao menos sua pele não ardia mais no Sol.

O que isso tudo poderia significar?

— Almas vingativas são almas que foram atormentadas em vida ou que nutrem um forte sentimento de desgosto acerca de suas mortes, elas vivem na floresta.

As palavras de seu avô surgiram em sua mente. Então agora Ren era uma alma vingativa? "Bem, se parar para analisar minha vida, é um pouco previsível", um sorriso amargo escapou por seus lábios.

Ele morreu, e ninguém sabia ou saberia disso, porque a simples ideia de alguém voltar à vida depois de cair de um despenhadeiro era algo ridículo. Naquele momento, quando estava caindo, o que se passou por sua cabeça? Fragmentos de sua vida? Suas questões não resolvidas? Os rostos de seus entes queridos?

Não! A única coisa que passou pela mente do Amorim foi o mais puro e simples ódio contra aqueles idiotas que lhe causaram tanto infortúnio em vida.

Mas e então, o que ele faria agora?

DING, DING!!!

A campainha o assustou, porém Ren conseguiu guardar as bolsas de sangue em seu armário antes de se apressar e desceu ao primeiro andar do sobrado para atender quem quer que fosse.

Assim que espiou pela janela, viu os cabelos loiros e cacheados por entre as barras do portão. Por um segundo, ele temeu se tratar do infame Sidney Luiz Serra, porém os olhos azuis o receberam com grande alívio conforme ele se aproximou.

— Ren?

Era Marcus Jose de Andrade.

— Marcus. — Suspirando, abriu um sorriso labial confortável para o amigo. — O que o traz aqui?

— Você não apareceu na faculdade hoje e nem me mandou mensagem, então vim ver se estava bem.

O Amorim o deixou passar pelo portão, os dois caminharam juntos até a casa e entraram. Era incrível como Ren conseguia se sentir confortável na presença do mais novo, foi assim desde o primeiro dia que se conheceram na biblioteca da faculdade, quando o albino estava se escondendo dos imprestáveis que o incomodavam.

— Desculpe se te preocupei, eu... — "Morri e voltei à vida, e agora sou um tipo de alma penada", as palavras não saíram, pois pareceram estúpidas até em formato de pensamento. — Só me senti um pouco enjoado hoje e decidi ficar em casa.

— E por que não me mandou mensagem dizendo isso? — Marcus inflou as bochechas com um biquinho teatral, fazendo Ren sorrir mais alegremente com seu lado infantil.

— Meu celular quebrou.

Na verdade, Matheus havia "confiscado" o celular dele no dia de sua morte. Provavelmente o Garcia já o havia jogado no lixo para se livrar de quaisquer provas de seu crime. E pensar que todos os seus contatos — escassos amigos e familiares — estavam registrados naquele celular, assim como anotações e fotos importantes para o Amorim...

Vendo que o amigo estava imerso em pensamentos, Marcus colocou as mãos na cintura e abriu um sorriso sapeca.

— Então você não está bem do estômago? Que tal eu preparar uma canja de galinha para você, Ren?

Antes que pudesse pedir para o amigo não se preocupar, o loiro se encaminhou para a cozinha, afinal, já estivera naquela casa algumas vezes e sabia exatamente onde se encontrava tudo o que precisaria. Com um suspiro desistente, o albino o seguiu.

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