Epílogo

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— Você certamente se divertiu, Ren. — Erzel se aproximou dele com uma caneca de sangue de veado fresco e se sentou ao seu lado.

— Desculpe pela confusão, Erzel.

— Está tudo bem, fazia um tempo que eu pretendia deixar essa cidadezinha.

Juntos, eles observavam a cabana de madeira do Giordani arder em chamas no meio da noite mais escura que já testemunharam na vida. Tudo ali estava queimando, sejam os móveis aos restos mortais dos humanos que os dois monstros da floresta abateram.

— E para onde você vai agora? — questionou o Amorim despretensiosamente enquanto bebia.

— Para onde nós vamos, você quer dizer.

— O quê? Eu tenho que ir também?

— É claro, seu idiota! Toda a cidade está te procurando. — Com um longo suspiro, Erzel recostou-se contra as pedras recobertas de neve e apreciou sua casa crepitando. — Vou tomar a responsabilidade por você, não posso te deixar sozinho ou você será pego e isso me comprometeria também.

— Mas eu mereço algum tipo de castigo... — murmurou o albino, os olhos carmim observando o líquido em sua caneca — Estava pensando em me entregar para a polícia e viver o resto da minha vida na prisão.

— Bobagem, você ainda é jovem, tem muito pelo que viver, não pode se contentar com apodrecer na cadeia.

— Mas eu matei pessoas... muitas pessoas...

— E daí? Isso não precisa te incomodar, lembre-se, você é um monstro e monstros não se importam com as coisas que fazem.

— Não existe moralidade para você?

— Ah, Ren... — Erzel ergueu-se minimamente e tocou o rosto do mais jovem com uma das mãos. — A moralidade é flexível dependendo do contexto e da época. Você se vingou dos imprestáveis que fizeram da sua vida um caos, agora está na hora de virar a página.

O albino se recolheu em pensamentos profundos por um momento, a luz das chamas que queimavam a cabana do Giordani eram lindas em plena lua cheia. Será que ele conseguiria mesmo deixar tudo o que passou para trás e recomeçar uma vida em outro lugar?

Bem, não era como se algo naquela cidadezinha do interior o prendesse. Seu avô estava morto, seu melhor amigo também, e todos os filhos da puta que o infernizavam foram mortos por suas próprias mãos.

Olhando-as agora, Ren sentia o sangue escorrendo entre seus dedos, mesmo que suas mãos estivessem tão limpas e brancas quanto a neve. Ele era um assassino, era um monstro, entretanto ainda não havia perdido a vontade de viver.

Se as coisas que Erzel lhe contou sobre a maldição do monstro da floresta estavam corretas, agora ele era imortal, envelheceria muito mais devagar do que os outros humanos, nunca ficaria doente ou sentiria dor e, contanto que consumisse carne fresca, não sentiria impulsos homicidas para atacar outras pessoas.

A carne de animais não era tão saborosa quanto a dos humanos, porém Ren poderia se acostumar com essa vida.

Sim, ele era um assassino, um monstro, o monstro da floresta, mas isso não precisava impedi-lo de ter uma vida feliz dali em diante depois de passar por tantos anos de sofrimento.

— E para onde você pensa em me levar, Erzel?

— Que tal o litoral? Eu sempre fui apaixonado pela paisagem marítima. — Sua voz soou como a de um amigo comum enquanto ele terminava de beber o sangue em sua caneca.

Era isso, eles eram monstros e seguiriam sendo monstros até o fim, pois o monstro da floresta permanece vivo enquanto seu rancor existir. O problema é que o rancor de um ser humano pode nunca desaparecer.

Esta era a lenda do monstro da floresta.

Número de palavras: 594.

Kill BoyOnde histórias criam vida. Descubra agora