Capítulo 4 - Arrependimentos

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Jesse Barbosa chegou a sua casa e nem ao menos cumprimentou seus pais ao simplesmente subir para seu quarto apressadamente. Quando se viu finalmente sozinho, encostou as costas na parede e escorregou até o chão, dobrando-se com a cabeça apoiada nos joelhos.

"Céus, o que nós fizemos, meu Deus?", indagou-se, as mãos esfregando a face com força, embrenhando-se em seus cabelos ruivos e longos, "E agora? O que vamos fazer?".

Não havia resposta para essa pergunta, apenas o silêncio.

Em seu íntimo ele ainda conseguia ver a face de surpresa e terror de Ren Amorim no instante em que seu pé escorregou pelas pedras lisas do despenhadeiro, aquele sentimento que reluziu nas íris vermelhas como morangos: "socorro" foi o que elas gritaram, mas Jesse não conseguiu fazer nada.

Ele nunca conseguiu fazer nada, nunca foi contra perturbar um pobre coitado que já devia ter a vida complicada por suas condições genéticas, nunca se questionou sobre o quão errado era tudo o que seu grupo de amigos fazia, nunca parou para refletir em como ele deveria tê-los parado enquanto ainda tinha tempo.

Todavia era inútil pensar nisso agora, Ren estava morto, ao menos era nisso o que ele tentava em vão crer, pois vira a criatura horrenda na qual o ex-companheiro se transformou.

"E se o monstro da floresta vier atrás de nós?", pensou, um sorriso amargo nos lábios, "Seria bem merecido, sem sombra de dúvida...".

— Jesse? — a voz de seu padrasto irrompeu através do silêncio, Antônio parecia preocupado — Aconteceu alguma coisa?

— Não é nada, eu estou bem — apressou-se em dizer.

Sim, ele estava bem, precisava estar bem, pois os dias que se seguiriam seriam apenas um gostinho do tormento que o aguardava.

( . . . )

— Lina, querida, não vai comer? — perguntou Amélia Oliveira ao ver o prato intocado da filha.

— Estou sem apetite, mãe.

— Então deixa que eu como o seu. — Esperto como sempre, Luiz, seu irmão gêmeo, pegou seu prato com raviolli e almondegas, pescando um assunto delicado logo de cara enquanto se banqueteava. — E aí, mana, saiu com o Sid essa tarde?

— Sim.

— Onde vocês foram? Também queria ter ido junto, vocês nunca me levam nos roles — disse em tom acusatório.

"Você sem sombra de dúvidas não iria ter gostado de ir nesse 'role", pensou amargamente.

No fundo, Lina ainda não estava pronta para aceitar os ocorridos daquela tarde. Para ela, que sempre se manteve afastada do grupo de amigos e via suas ações como simples formas de extravasar a infantilidade reprimida de Sid contra Ren, acreditar que as coisas acabaram tão tensas era difícil.

Olhando para o molho vermelho do raviolli, seu estômago se contorceu e ela de repente pediu licença da mesa e seguiu para seu quarto.

"Por que tudo isso teve que acontecer?", perguntou-se lamentavelmente, mas, apesar disso, a ficha não havia caído, ela ainda não sabia que era uma assassina porque, aos seus olhos, sempre se manteve alheia às perturbações que Ren Amorim sofria.

O que Lina era incapaz de entender era que o silêncio também poderia ser uma forma de assassinato e seu silêncio durou tempo demais. Se ela tivesse conversado com os amigos antes, se tivesse dito um simples "chega!", talvez as coisas não teriam terminado de forma tão amarga.

De qualquer maneira, ela tirou os óculos e deitou-se em sua cama para dormir.

Lina não conseguiria dormir por algumas noites, pois sempre que fechasse os olhos, o rosto deformado e cheio de sangue de seu ex-colega de faculdade viria lhe dar boa noite.

( . . . )

Por fim, depois de chorar rios, Jeneth Gomez finalmente adormeceu com a cabeça sobre o colo de Matheus, que afagava seus cabelos tingidos artificialmente de verde com mechas laranja.

Com um longo suspiro, o Takakura enxugou uma trilha de suor que escorria por sua testa. "Caralho, eu vi alguém morrer", um sorriso estarrecido apareceu em seus dentes, lábios se contraindo involuntariamente no tique que ele odiava, pois o fazia parecer um maldito psicopata.

Ren estava morto, o mesmo Ren que ele viu chorar diversas vezes por conta de suas brincadeiras e assédios. O que Matheus podia fazer? Era simplesmente divertidíssimo zombar daquele branquelo com cara de rato de laboratório.

O moreno se lembrava perfeitamente de uma vez que tirou as calças de Ren a força e tomou fotos dele de cueca para depois postar na internet. Era engraçado como ele chorava implorando para que parasse, e, apesar de saber o quão filho da puta sempre foi, Matheus não conseguia parar de rir ao se lembrar de cada reação estúpida do Amorim.

Mas agora, pensar nessas coisas divertidas também significava pensar na morte dele, na morte de Ren Amorim.

Como prosseguiriam a partir dali? Aquele monstro... ele realmente existiu? Não, não há como negar aquela aparência medonha; aquilo era real, muito real. "Monstros existem", Matheus sabia melhor do que ninguém porque, aos olhos de Ren, ele também foi um monstro durante muitos anos.

— Que patético — murmurou, de novo sucumbindo ao seu tique labial, passando uma das mãos pelos cabelos negros — Estamos fodidos.

( . . . )

Sidney Luiz Serra se revirava na cama, os lençóis pesados demais, então os afastou, mesmo que estivesse fazendo um frio de trincar os dentes. Ele foi dormir sem jantar, sem falar com os pais ou com a irmã, apenas se trancou em seu quarto quando chegou, tomou um banho quente para tentar relaxar, porém foi um esforço em vão.

E não era no mundo dos sonhos onde ele iria se refugiar, pois o que lhe aguardava era um pesadelo vívido e excruciante.

Sid estava lá, parado sobre o despenhadeiro, encarando o vazio de um céu vermelho, até que mãos agarraram seus calcanhares. Ele olhou para baixo, para o mar de sangue que o rodeava, e viu emergir aquela figura desfigurada que um dia foi nomeado como Ren Amorim.

Um rosto de mandíbula quebrada o saudou, a boca escorrendo em uma confusão de sangue e dentes quebrados. A coisa se jogou em cima de Sidney, seus membros se retorcendo em volta do corpo, um grunhido de ossos estalando e vísceras se esparramando ao redor do loiro.

O corpo de Ren se precipitou sobre o do Serra, mergulhando suas roupas em vermelho; e então eles se encararam, os olhos carmim do mais jovem bem focados nos de Sid.

— Você vai pagar pelo que fez, Sidney!

A voz gorgolejava enquanto sangue escorria de sua mandíbula deslocada, pingando no rosto do loiro, as gotas eram tão quentes que pareciam queimar sua pele.

Só então ele despertou, no meio de um grito mudo onde sua boca se abriu, mas som algum saiu. Estava suando, tremendo, as lágrimas presas em seus olhos verdes, a saliva tentando descer pela garganta; medo, o grande e poderoso Sidney Luiz Serra estava com medo.

— Ren... — sussurrou no meio da escuridão da noite — Me desculpa...

Mas agora já era tarde para pedir perdão.

Número de palavras: 1.131.

Kill BoyOnde histórias criam vida. Descubra agora