02•FELICIDADE

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Clary Miller

Você pesquisa no Google o que é felicidade e encontra:

1. Qualidade ou estado de feliz; estado de uma consciência plenamente satisfeita; satisfação, contentamento, bem-estar.

2. Boa fortuna; sorte.

Mas o que é satisfação contemporânea? Seria viver rindo constantemente? Ignorar o que acontece ao seu redor? Fazer apenas o que se deseja?

Quero entender o que é "bem-estar". Minha vida está longe disso.

Ultimamente, tenho pensado mais na morte. Talvez ela seja uma fonte de alívio, já que todos nós vamos morrer um dia, mais cedo ou mais tarde.

São 12 horas do dia. A cortina está aberta e a luz entra, trazendo vozes do outro lado da rua.

Levanto-me e vou até a janela. Vejo meu vizinho, Red, com uma camisa de manga curta cinza, calça preta e bota. Ele está com um amigo, Renan, um rosto que vejo frequentemente em frente à minha casa.

Red e Renan estão sentados na moto, conversando e tomando o que parece ser uma cerveja. O Rottweiler de Red está ao lado dele, sem coleira, apenas uma corrente de prata no pescoço.

Preciso tomar um banho e me despertar. Dormir é a coisa mais fácil que tenho. Não há dor, não há enjoo; é tão tranquilo que poderia dormir para sempre.

Assim que saio do quarto, vejo as gêmeas olhando pela janela e rindo. Já imagino o que tanto as diverte.

— Ele é tão gato! Red é meu, e você pode ficar com o Renan.
— Por mim, tudo bem.

Reviro os olhos e passo por elas em direção ao banheiro. Depois de um rápido banho, ao abrir a porta, dou de cara com Paloma.

— Limpe a casa e não esqueça de colocar as roupas para lavar na máquina.

Não respondo, apenas balanço a cabeça afirmativamente.

— Vamos, meninas.

Ela chama as gêmeas, que ainda observam Red e Renan pela janela, e sai com elas em direção à garagem.

No começo, eu dizia que não faria, mas isso só levava Paloma a me torturar da pior forma. Com o tempo, acabei me rendendo, para não sofrer mais. Assim que elas saem, consigo respirar. Essa casa me sufoca, tudo aqui me sufoca.

Decido esquentar a comida para mim. Quando me aproximo da janela, risos e conversas ainda ecoam do lado de fora. Red e Renan continuam na mesma posição.

Red tem presas que se mostram sempre que ele ri. Ele levanta a garrafa à boca, mas para e se vira para olhar na minha direção. Tenho certeza de que ele consegue me ver.

Ele me encara com aquele olhar penetrante, como se lesse a minha alma. Por alguns minutos, não consigo desviar o olhar.

Renan observa Red, depois olha em direção à minha casa. Nunca troquei uma palavra com ele. Viro-me e sigo em direção à cozinha.

Red não olharia para mim; sou um completo desastre. Não que ele não seja, mas sou um desastre diferente. Ele é chama e destruição; eu já sou algo destruído. Somos muito diferentes.

O tipo dele é igual ao das gêmeas: peito e coxas grandes, cabelo arrumado. Elas vivem maquiadas e vestindo roupas lindas.

Eu não tenho roupas assim, apenas blusões, moletons e calças jeans. Minha única maquiagem é um gloss labial que escondi das gêmeas quando comprei com meu pai. Se eu comprar uma roupa mais feminina, elas somem com ela. Se eu optar por algo menos extravagante, elas não se importam. Elas vivem em salões, com o cabelo sempre arrumado.

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