68• FURIOSA

176 16 12
                                    

Clary Miller

O ar da noite ainda carregava o peso do encontro no banheiro. Cada vez que eu respirava, sentia o cheiro de tabaco impregnado nas minhas roupas, a lembrança viva do quanto eu tinha deixado Red me afetar. Eu estava sozinha agora, em pé na calçada, longe do bar, longe dele, mas a sensação ainda não tinha passado. Meus ombros estavam tensos, minha mente fervilhando com pensamentos confusos.

-Eu sou uma idiota, murmurei para mim mesma, socando o bolso do casaco em frustração. Meu peito subia e descia rápido. -Como eu pude deixar isso acontecer? Como deixei ele me afetar assim de novo?

A cada vez que fechei os olhos, as sensações voltavam: o calor do corpo dele contra o meu, o toque dele descendo lentamente pelo meu pescoço, e a forma como ele me prendeu contra o espelho. Era como se estivesse marcado na minha pele. Eu odiava o quanto meu corpo parecia responder a ele, mesmo quando minha mente gritava para fugir. Odiava o quanto, por mais que tentasse negar, meu corpo lembrava. Cada toque, cada provocação... tudo gravado em minha pele, nas minhas memórias.

Eu queria, eu queria muito aquele toque de novo.

Respirei fundo, tentando afastar a sensação, mas não adiantava. O som da música do bar ainda ecoava pela rua, mas eu não ouvia mais nada além do eco da voz dele na minha cabeça. As palavras dele se repetiam, como se fossem uma maldição: "Você me quer. Sempre quis." Eu odiava o quanto aquilo era verdade, e ao mesmo tempo, me recusava a aceitar.

Suspirei novamente, frustrada, e comecei a caminhar mais rápido, tentando me afastar tanto do lugar quanto dos pensamentos. Eu sabia que tinha que ficar longe de Red. Sabia que, se continuasse permitindo que ele se aproximasse, as consequências seriam devastadoras.

- Ele só quer me controlar... me destruir aos poucos... - eu sussurrei para mim mesma, tentando me convencer.

Mas não era só isso. Havia algo nele, algo que me puxava, uma atração perigosa que eu não conseguia ignorar, por mais que tentasse, eu o amava.

O dia seguinte se arrastava como se uma sombra tivesse caído sobre mim, afetando cada aspecto da minha rotina. O cansaço estava impregnado em cada célula do meu corpo, como se a noite anterior, repleta de pensamentos atormentadores sobre Red, tivesse roubado toda a minha energia. No entanto, o calor e a agitação da faculdade apenas intensificavam o meu desconforto.

A sala de aula estava abafada, e a luz fluorescente piscava intermitentemente, criando um ambiente quase surreal. O ar parecia estar preso, cada respiração era um desafio. As janelas estavam fechadas, e o calor estava tão opressor que parecia quase tangível, uma pressão física que contribuía para o meu crescente mal-estar.

Ana se aproximou, segurando um café na mão, e se sentou ao meu lado. Ela me observou com um olhar que deixava claro que percebia meu estado perturbado. A preocupação estava estampada em seu rosto, mas eu tentei manter uma aparência normal.

- Clary, você está bem? - A voz dela era suave, quase como um sussurro, como se estivesse temendo que eu pudesse desabar a qualquer momento.

Eu balancei a cabeça, forçando um sorriso que não chegou a alcançar os meus olhos cansados.

- Eu só... não dormi bem, Ana. Só isso.

Ana não parecia convencida. Ela se inclinou na cadeira, com um olhar que falava de um conhecimento implícito. Sua voz baixou ainda mais, como se estivesse prestes a revelar algo importante.

- O André machucou a mão?

Eu levantei o olhar, confundida, e vi André entrando na sala. Sua palma estava enfaixada, e ele me lançou um olhar indiferente antes de rapidamente desviar o rosto. Sentia-me estranha, como se houvesse uma desconexão entre a realidade e o que eu acreditava ser verdade. Ontem, tudo estava normal. Havíamos nos divertido no bar, rido juntos. O que poderia ter acontecido para que ele me olhasse dessa maneira?

ATORMENTADOS Onde histórias criam vida. Descubra agora