CAPÍTULO V

11 2 0
                                    

Júlio acordou com a luz forte que o  cegava. Abriu os olhos lentamente sentindo a cabeça latejar. Ficou imóvel por algum tempo, tentando recordar onde estava.
Surpreso, notou que não se encontrava mais na cabine. A luz forte era o sol penetrando por uma janela aberta e refletindo nas paredes brancas do quarto minúsculo. Estava deitado em uma cadeira dura e estreita, coberto por um velho cobertor e, quando se movia, as molas rangiam, protestando.

Sentou-se  rapidamente, tentando descobrir o que aconteceu. Chocado, percebeu que estava nu. Deu uma olhada no quarto. Além da cama, havia pouca mobília; uma pequena cadeira, uma cômoda com o tampo abaulado. Nada que reconhecesse ou que lhe pertencesse. Nenhuma de suas coisas e, com certeza, nenhum de suas roupas.
Júlio colocou as mãos sobre os olhos, tentando entender o que havia ocorrido. Estava à espera de Alex, lembrou-se, quando mergulhou no sono. Mas era muito antes da meia noite e, pela posição do sol, já era mais de meio-dia. Será que ele havia dormido doze horas ininterruptamente? E como ele havia chegado em tal casebre, quando na noite anterior estava na luxuosa cabine do Clio? De repente, começou a sentir-se terrivelmente assustado.
  Lembrou-se de um artigo que havia lido recentemente sobre a pirataria moderna. Será que o Clio fora atacado durante a noite por piratas que a haviam sequestrado, enquanto dormia? Se isso fosse verdade, o que aconteceu com o capitão e os outros? E Alex, onde poderia Júlio encheu- se de determinação e enrolou o lençol no corpo, antes de colocar os pés no chão de concreto. Levantou- se e sentou-se em seguida, sentindo a tontura voltar enquanto esperava que o mal-estar passasse, escutou passos subindo a escada.
Buscou freneticamente algo com que pudesse se defender, porém, não havia nada, exceto a cadeira, mas não haveria tempo para alcançá-la. Encostou-se na parede, o terror dominando-o, quando viu despontar na porta um rosto escuro.
Assim que o reconheceu, Júlio emitiu um grito de alívio.

— Alex! Ah, graças a Deus! Eu estou apavorado. O que aconteceu? O que estamos fazendo aqui? Que lugar é esse? Pelo amor de Deus — Júlio com os nervos à flor da pele.
— Você estava dormindo, disse ele. E eu estava esperando que acordasse.

Alex puxou a única cadeira do quarto, virou-se ao contrário e sentou-se, os braços apoiados no encosto.
Júlio olhou-o, sentindo remorsos. Havia estragado a noite de núpcias deles.

— Oh, Alex. Sinto muito.
— Mas não deveria. Era minha intenção que você dormisse tanto.
— Sua intenção? - Júlio ficou atônito

Júlio sentou-se melhor e encarou-o. Outra vez, lembrou- se daquela horrível tortura que o deixou tão fraco.

— O suco de frutas... havia algo nele? - perguntou - Mas por quê, Alex? Por quê?

Júlio está ficando indignado com essa situação.

— Porque pensei que meus planos para a nossa lua-de- mel talvez não fossem do seu agrado - respondeu, lacônico. —  E eu quis evitar qualquer tipo de cena.
— Não estou compreendendo nada. Onde está o Clio? E que lugar horrível é esse?
— O Clio já partiu. E esse "lugar horrível" é a casa onde eu nasci.
— Oh, sinto muito — tentou se desculpar. Eu não sabia. Foi o choque de acordar em lugar estranho.
— Era exatamente o que eu havia planejado.
— Planejado? Alex, pelo amor de Deus! – essa foi a gota d'água para ele, — O que significa tudo isso? Por que estamos aqui?

Júlio já estava sem paciência, não queria levantar a voz para Alex, já estava frustrado suficiente para aturar enigmas que Alex estava fazendo.

— É bastante simples. Você se casou com um camponês, agapitós. Agora vai descobrir como é a vida de um camponês. Vai ser muito...  instrutivo, não é mesmo?
Permaneceram em silêncio por algum tempo. Júlio cobriu os olhos com as mãos.

— É alguma brincadeira?
— Não.
— Você espera que eu passe a lua-de-mel aqui, nesta casa?
— Espero muito mais do que isso, retrucou ele, autoritário. — Você vai cozinhar para mim, lavar minhas roupas, limpar a casa e cuidar do  jardim. Vai alimentar as galinhas e tirar leite da cabra.
Júlio começou a rir de nervoso.

— Haa meu Deus, será que eu choque pedra na cruz. Você ficou louco? Só pode ser, sou seu marido, seu companheiro não algum tipo de escravo doméstico e...
— Não, você não é meu marido nem companheiro. Ainda não. É só um homem com quem me casei. Mas você não tem lugar nem na minha cama, nem em meu coração.

 UMA VIAGEM SEM VOLTA Onde histórias criam vida. Descubra agora