Adèle
Claude na verdade é Ömer Ahmet.
Tento repetir a dura verdade no subconsciente inúmeras vezes até que a ficha caia de uma vez por todas.
O homem com quem minha mãe dividiu a casa, a vida, a própria "segurança" nos últimos meses, é o mesmo monstro que procurou me assassinar na semana passada. O homem com quem fiquei sob o mesmo teto nesses últimos cinco dias.
A verdade, até este momento, surge como um gosto amargo na boca.
Claude é o homem por quem Camille foi disciplinada e abusada fisicamente durante todos esses anos. Não só ela, tal como Hanna também. E agora, é quem procura matá-lo.
O cara com quem minha mãe está nesse instante.
O pânico toma conta de todo o corpo e no minuto seguinte não sinto mais a ponta dos dedos ou muito menos os gritos desesperados da morena ao redor.
Minha mente permanece decidida a acreditar e transmitir imagens de Elisa morta, torturada, e mil e uma outras coisas horríveis possíveis. Tenho certeza de que ele não irá se opor em fazer o pior com ela agora que sabemos da verdade.
E como Camille uma vez frisou:
"Pensamos iguais. Assim como eu sinto, ele sente. Assim como planejo, ele planeja. Assim como mato, ele também...mata."
-Você pode por favor dirigir mais rápido? -Minha voz sai embargada em meio ao soluço preso na garganta. Faço o pedido, embora tenha consciência de enxergar a pista como um completo borrão em nossa frente e o hodômetro marcar 200 km/h.
Camille acena uma vez e pressiona com mais força o acelerador. Meu corpo sobressalta em meio ao toque repentino de sua mão no rosto. O dedão varrendo a lágrima solitária que escorre pela bochecha ao passo que puxo os cabelos com força.
-Preciso de você sã, Adèle. -Sua voz é baixa, porém firme. De esguelha, noto as pupilas negras me esquadrinharem. -Vou resgatar Elisa. Eu te prometo. Te juro a porra da minha vida que a trarei viva para você. Mas precisa confiar em mim, compreende?
Respiro fundo e assinto em silêncio. Saco o celular do bolso do casaco e desbloqueio a tela com os dedos trêmulos. Camille continua a me fitar vez ou outra, intercalando com a estrada, e mordo o lábio na esperança de estancar as lágrimas à medida que busco o número de Elisa na lista de contatos.
Por mais que tenhamos a certeza plena de que Ömer saiba da descoberta e do nosso plano de resgatar minha mãe com vida, e Camille acabar com a sua, preciso tentar.
Transmitir segurança e indiferença por mais que esteja explodindo de medo por dentro.
Após dois toques, escuto a voz doce do outro lado da linha.
-Querida! Estava agora mesmo pensando em você, acredita?
Engulo em seco, limpando a garganta com o intuito de disfarçar o tom embargado.
-Oh, jura? Por que? Aconteceu alguma coisa?
Ouço uma risada baixa e em seguida outra voz preenche a linha. Minha espinha se arrepia de imediato ao presenciar Ömer na ligação.
-Adèle, querida! Sua mãe havia me assegurado de que é uma ótima estraga surpresas...mas eu não acreditei. -Há uma pausa e ouço o som da porta do carro bater. Arqueio a sobrancelha e olho em confusão para Camille, que me perscruta com o semblante parecido. Ele continua:
-Estávamos morrendo de saudades. Então...Esqueça! Sua mãe te dará as boas-novas.
Segundos depois, a voz de Elisa retorna à chamada e meu coração aperta.
-Você como sempre uma desmancha prazeres. -Exclama entusiasmada e volto à enrugar o cenho, ainda mais confusa. -Decidimos vir à Paris! A princípio, foi totalmente ideia de Claude. Mas entrei no embalo e...
-O QUÊ?! -Grito, incapaz de afugentar o desespero no tom. Minha mãe está em Paris. Com ele. Engulo em seco, ignorando os chamados urgentes de Camille pelo olhar. -Como...O que estão fazendo em Paris?
-Querida, viemos te visitar. Claude insistiu e achei uma ótima ideia. Adèle, por favor, não seja intransigente. Não está feliz de ter sua mãe aqui? Nosso passeio de barco acontecerá mais cedo do que o esperado...
A ligação corta.
-Mãe? -Sem resposta. Apenas ruídos. -Mãe? Você está aí? Me responda, por favor.
Alguns segundos se prorrogam e de repente o som da fala dele preenche a ligação. Detecto a entonação ácida de primeira.
-Elisa pediu para que o porteiro liberasse a vaga para estacionarmos no prédio. Espero que não se importe, Mon lapin. -Sinto o canto dos olhos lacrimejarem nos segundos estendidos durante a chamada. Sua respiração é calma, o que me apavora ainda mais. -Toc, toc, toc. Não irá abrir para nós, Adèle? Viemos de Chartres até aqui apenas para vê-la.
Respiro fundo, fechando os olhos. As lágrimas resvalando sem parar pelas bochechas. Camille escrutina de forma preocupada o meu rosto e pergunta em silêncio o que está acontecendo. Não respondo.
-Não estou em casa. Eu...
Mas Ömer me corta.
-Realmente uma pena, querida. O porteiro, cara gentil aliás, acabou de nos informar. Sua mãe está decepcionada, Adèle. É assim que pretende nos receber? -Noto o tom amargo na fala e o arrepio retorna à coluna. -Francamente, nunca esperaria isso de você. Como está a viajem com Camila? Ela está ao seu lado nesse instante, não está?
Arregalo os olhos após ouvir a menção do nome enquanto sua risada perversa ecoa pela ligação.
Ele sabe.
Direciono o olhar desesperado para a morena ao lado e Camille trinca o maxilar ao mesmo tempo que aperta os dedos no volante, até os nós ficarem brancos.
-Não a machuque. Por favor. -Imploro com a entonação sôfrega. Ao longe, ouço a voz baixa de Elisa voltar à ligação.
-Aguardamos vocês. Seja uma boa anfitriã, Adèle. E diga à Camila que senti saudades.
E por fim desliga.
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𝐎 𝐒𝐄𝐆𝐑𝐄𝐃𝐎 𝐃𝐄 𝐌𝐎𝐍𝐓𝐌𝐀𝐑𝐓𝐑𝐄
RomanceEm meio às ruas sinuosas de Paris, uma série de assassinatos brutais de ex-presidiários deixa a cidade em pânico. A jovem jornalista Adèle, determinada à investigar e documentar os crimes chocantes, se vê envolvida em uma teia de mistério e perigo. ...