A vida e a morte constituem o limite extremo da existência humana. Os seres humanos nascem para morrer, respiram para deixar de respirar, seus corações batem para deixar de bater e suas vidas surgem para desaparecer.
O ciclo sempre foi assim, se rep...
Não importa onde você esteja, você sempre estará olhando para a mesma lua que eu. ~ Querido John
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Narrado por Lorenzo.
Há quase três dias que não a vejo. E hoje, nessa quarta-feira, sentado nessa praça com Ísis ao meu lado enquanto observamos o chafariz, eu sinto a sua falta mais do que sinto vontade de viver.
E é estranho pensar que sinto falta do seu calor, dos seus olhos brilhantes, da sua risada por qualquer coisa idiota que eu dizia. Sinto falta de observá-la enquanto dorme, do seu cheiro que é possível reconhecer a distâncias.
E mesmo que eu não respire mais, é impossível não sentir o seu cheiro.
— Três dias para conhecer o inferno. Eu acho que tô animada, viu? — Ísis fez uma piada com a sua situação, mas tanto ela como eu sabíamos o quão no fundo do poço estávamos. Não sobrava espaço para rir.
Observei enquanto alguns patos nadavam tranquilamente pelo lago, sem ter que lidar com problemas como paixões, vida após a morte, inferno e céu.
— O que planeja fazer nesses últimos três dias? — Perguntei, sem muita empolgação na voz. Acho que preferia estar no lugar de Ísis que vai sumir mais rápido do que eu desse mundo.
— O que estou fazendo desde que a semana se iniciou: em casa observando a minha família. — Um sorriso fraco surgiu em seu rosto. — Me arrependo tanto de não ter aproveitado a vida como deveria ser aproveitada. Passava grande parte do meu tempo ocupada com os afazeres do mundo. Me preocupava mais em entregar um TCC da faculdade do que perguntar ao meu irmão se ele estava bem. Me preocupava mais com o estágio em uma clínica odontológica do que passar um tempo com a minha família. Sabe, eu vivia por construir um futuro que de repente foi arrancado de mim, tirando completamente o controle que eu achava que tinha sobre a minha vida. Morrer foi perceber que eu não aproveitava as dádivas do presente pois só tinha em mente o futuro. E eu acabei perdendo tudo. — A menina cruzou os seus braços e parecia imersa nas memórias tristes de sua vida quando abaixou a sua cabeça.
— Como... como você morreu? — A questionei, me perguntando se aquela era uma boa hora para perguntar.
— Bati o carro ao cochilar no volante de tão cansada. — Sorriu sem mostrar os dentes. — Estava saindo do estágio e... e bom, aconteceu tudo. Eu me lembro de acordar com uma buzina e um farol vindo em minha direção. À medida que se aproximava pude contemplar o caminhão e... já era muito tarde. — Sua tristeza era nítida nos olhos, as lágrimas presas e o arrependimento eram infelizmente coisas que se manteria ali para sempre.
Pois Ísis não tinha alguém que a permitisse viver de novo e chorar. Chorar até não aguentar mais e se livrar de todas aqueles sentimentos ruins. Ísis não tinha a pedra preciosa que eu tenho.
Mas eu também estava perdendo.
— Eu sinto muito. — Disse, em uma tentativa de consolar a sua alma abatida. Mas tenho certeza que nenhuma palavra no vocabulário seria suficiente para sarar a ferida que morrer deixou em sua alma.
— Eu sei que sente, deve ser igualmente doloroso para você. — Declarou. — Pois afinal... não tem visto ela, né? — Suas palavras foram como um soco em meu peito, trazendo a dor de ter que manter a distância para salvar a sua vida.
— É o certo. Não posso mantê-la por perto sabendo que posso tirar a sua vida. — Respondi, olhando nos seus olhos e percebendo que já me encarava curiosa.
— Quem te garante que eles não irão atrás dela mesmo com a sua distância? — Perguntou seriamente, com a testa franzida e os braços ainda cruzados.
— Eles não irão... se ela não me ajudar eles não... — Minha voz foi se perdendo aos poucos, preso no pensamento de que eles realmente poderiam ir atrás dela.
— Já parou para pensar porque eles a querem? — Franzi o cenho, confuso. Ísis endireitou a sua postura e arregalou os olhos. — Já pensou que... que talvez ela seja o seu assunto inacabado? Talvez não seja para ela te ajudar com assunto, talvez o assunto seja ela! — Ísis levou as mãos até sua cabeça, me encarando como se aquilo fizesse sentido o tempo inteiro. — Isso explica o porquê ela te enxerga, porque te devolve a vida quando te toca, porque você retornou a cidade da família dela já que a sua não mora mais aqui... E se o assunto for ela?
— Isso não faz sentido algum, Ísis. — Eu balancei a cabeça para os lados. Seu pensamento estava completamente fora de lógica, pois a minha frase diz que eu deveria encontrar alguém para me amar e faria mais sentido fazer alguém que já me viu em vida me amar, Ayla me viu em vida quando ainda era muito nova e...
Dez anos se passaram desde que eu morri.
Dez anos se passaram desde que eu morri para que eu pudesse fazê-la me amar quando já soubesse o que é o amor...
— Espera... — Ergui o meu corpo, olhando para ela com o mesmo choque e surpresa que ela me olhava a minutos atrás.
— Agora que sua ficha caiu? — Um sorriso debochado surgiu em seus lábios. — Ayla é seu assunto inacabado.
— Mas isso ainda não faz sentido para mim... porque Deus decidiu que eu deveria ama-la para prosseguir para o pós vida? — Muitos questionamentos surgiam em minha cabeça.
— Talvez isso estava escrito no destino de vocês. Talvez Ayla seja a sua alma gêmea, mas por um momento você se descuidou e acabou pondo um ponto final na história que nem chegaram a construir. Você interrompeu o destino, você interrompeu o que estava escrito no livro da vida. E é por isso que é um assunto inacabado, e é por isso também que você é o único que pode resolver. Pois você interrompeu a história que estava sendo construída por Deus. — Ela falava sem parar, criando milhares de teorias enquanto a minha mente parecia perdida no meio de toda aquela informação. — Talvez seja por isso que sejamos os únicos culpados por tudo aquilo que enfrentamos. Pois Deus escreve histórias perfeitas até resolvermos tomar a frente e mudar o roteiro.
Minha mente mergulhou em suas palavras, presa na ideia que prevalecia dentro de mim. Algo que ardia e dizia que aquilo era certo. Que era certo manter Ayla por perto pois estava escrito nas estrelas que nos apaixonaríamos.
E era por isso que eu adorava observar as estrelas todas as noites.