Capítulo 101

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Felipe vinha entrando e Micael caminhou na direção do rapaz. Sophia estava logo atrás, temendo por mais uma discussão.

O adolescente estava claramente alterado, tinha os olhos vermelhos e um sorriso diferente no rosto. Pretendia passar direto e ignorar o pai que estava parado em seu caminho, mas Micael o segurou pelo braço, o parando diante de si.

— Onde esteve?

— Sai com uns amigos depois da aula. — Puxou o braço e Micael o soltou. — Já vai começar com o interrogatório? Não fizemos nada demais.

— Devo presumir então que esses seus olhos vermelhos e fedor de erva foram conseguidos nessa saída em que não fizeram nada demais?

Devo presumir então que esses seus olhos vermelhos e fedor de erva foram conseguidos nessa saída em que não fizeram nada demais? — Remendou o pai que trincou o maxilar no mesmo instante em que fechou a mão em punho. — Quer parar de ser careta? Não tem nada de errado em fumar uma erva as vezes.

— Quero você longe desses moleques. — Micael explodiu, apontando o dedo no rosto do filho, que apenas deu risada da situação. — Não fiz piada nenhuma, eu vou mudar você de escola.

— São meus amigos, não vou mudar de escola.

— São delinquentes e você está ficando como eles. — Falou ainda mais alto e Sophia se aproximou, segurou em seu braço numa falha tentativa de controlar seu marido. — Isso já passou dos limites faz tempo.

— Talvez eu seja como eles, talvez finalmente eu tenha encontrado o lugar onde me encaixo. — Falou com calma. — Você já parou de pensar que eu posso não ter nascido pra ser bom?

— Mas que ladainha é essa agora? Claro que nasceu. — Berrou e Sophia via a hora das meninas aparecerem ali na sala por conta da gritaria. — Esse pessoal que você anda por ai não está te fazendo bem.

— Não pode me proibir de ver meus amigos, Micael. Você não é meu pai. — Sophia sentiu o corpo de Micael se retrair ao ouvir aquelas palavras vindas do filho.

Sempre foi muito difícil pensar no fato de não ser biologicamente pai de Felipe, vê-lo dizer aquilo com tanto desprezo o devastou.

Pensou em tudo o que viveu ao longo dos anos e em como tudo tinha se transformado nos últimos meses. Felipe havia lhe dito a pior coisa que podia.

— Eu não sou seu pai? — Falou alto. — EU NÃO SOU SEU PAI? — Berrou ao repetir. As veias saltavam no pescoço devido ao estresse.

Sophia agarrou ainda mais seu braço, as meninas apareceram no topo da escada e Felipe deu um passo pra trás, um recuo por puro instindo de sobrevivência.

— Fui eu que estava na sala de parto quando você nasceu, eu que acompanhei toda a gestação da vagabunda da sua mãe. Eu amei você desde o instante em que soube da sua existência. Eu vesti, alimentei, eduquei você até aqui. Estive com você quando disse papai a primeira vez, quando teve sua primeira queda da bicicleta e fui a todas as suas apresentações de dia dos pais na escola. Você é menor de idade e tem o meu sobrenome, então eu posso sim dizer com quem você deve andar.

Terminou o discurso ofegante, tinha um dedo apontado no peito do filho que estava acuado na parede de tanto que estava recuando da ira do pai.

— Você viveu isso tudo porque a vagabunda da minha mãe te enganou. — Ele deu ênfase no xingamento. — Você foi um otário e todo mundo sabe disso.

Por mais acuado que Felipe estivesse, escolheu atacar ainda mais Micael. Sabia que não era a melhor opção alimentar ainda mais a raiva dele estando assim tão perto, mas não seria oprimido.

Micael fechou a mão tão forte em punho que o coração de Sophia quase saiu pela boca. Ela se enfiou entre os dois e se Micael não tivesse o mínimo de consciência, tinha acertado um soco na esposa.

— Por favor, isso não. — Pediu, defendendo o sobrinho que a essa altura já era maior que ela. — As meninas...

— Você sabe bem que meu pai é o Lucas. — Felipe disse, não contente de ter escapado por pouco de apanhar.

— Então faça um favor a nós dois. — Micael respirou fundo e relaxou a mão. — Vai morar com o seu pai.

— MICAEL. — Sophia disse alto, alarmada com a ideia de Felipe ser expulso de casa. — Não pode estar falando sério.

— Deixa tia, ele tem razão. — Felipe saiu de trás da tia e deu de ombros, caminhando com a mão no bolso. — Eu devia ter feito isso no instante em que tive noção de quem era meu pai de verdade. — Saiu de perto e subiu as escadas com uma pressa exagerada.

Sophia se virou para o marido e colocou as mãos em seu rosto, sabia o quão abalado ele estava.

— Amor, isso é uma loucura. Você precisa conversar direito com Felipe quando a poeira abaixar. Não pode deixar que ele vá embora de casa.

— É tarde demais, você ouviu as coisas que ele me disse? Nem pai dele me considera, o que eu posso fazer? — Fungou, prendia as lágrimas com sucesso, mas seus olhos começaram a ficar vermelhos. — Eu lutei por esse menino com a minha vida, nunca esperei que fosse acontecer algo do tipo.

— Felipe é um adolescente, conversamos hoje sobre não bater de frente e você quase deu um soco no garoto.

— Ele me chamou de otário, mereceu muito mais que um soco. — Trincou o maxilar. — Eu não vou esperar ele se acalmar e muito menos quero me acalmar. Lucas não é pai dele? Não foi isso que esse ingrato acabou de jogar na minha cara sem dó? Então eu o quero fora da minha casa.

— Lipe vai embora? — Maiara se aproximou com a irmã maior e os dois se viraram na direção das filhas.

— Engraçado, pensei ter mandado as duas pro quarto. O que estão fazendo aqui? — Disse alto, com a voz grave e as meninas se encolheram no mesmo instante. — Voltem pro quarto de vocês antes que eu prolongue o castigo por uma semana.

— Micael! — Sophia arregalou os olhos. Não tinha costume de desautorizar o marido diante das filhas, mas ele estava tão estressado que tinha ultrapassado os limites.

O homem apenas bufou e saiu de perto das três, precisava de um banho pra esfriar a cabeça, embora nada que fizesse o ajudaria a superar aquela recente discussão com seu filho tão querido.

— Ninguém vai embora. — Sophia contou as duas. — Foi só mais uma briga entre os dois. Eles vão se acalmar e logo tudo voltará ao normal, tá bem?

— Temos que ir para o quarto? — Emily perguntou receosa.

— Que tal nós três irmos assistir um filme juntas? Vamos deixar os rapazes sozinhos por alguns instantes. — As duas sorriram e juntas caminharam até o sofá. 

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