ELA FEZ COMO ele mandara.
E se for uma armadilha...
Ela ficava remoendo essa frase; como se ela não fosse sua, como se não fosse seu cérebro que havia a formulado. Algo primário gritava para não ir. Para não esperar. Mas como ela poderia não esperar por ele?
Era um entardecer bonito e nebuloso, como aqueles das pinturas renascentistas, combinava com a folhagem que caia. Começava a gelar. Enrolou o cachecol vermelho no pescoço, e fechou o sobretudo preto. Talvez ela estivesse internada naquele momento em um manicômio, tendo aquelas alucinações. Sorriu. Nunca conseguiria criar um pôr do sol tão belo e melancólico, nem no mais profundo delírio. Aquele era o horário em que se sentia viva de verdade. Era a prova de que estava lúcida.
— Demorei muito?
Ellie virou-se.
— Não.
— Estou vendo que não mudou de ideia.
— Por que mudaria?
— Ah, não sei, esperava que tivesse corrido ao primeiro sinal de emboscada que eu fizesse.
Ela riu-se.
— Você deve fazer isso com todas as garotas humanas que conhece. Primeiro as assusta, depois conquista com esse seu jeito galanteador e charmoso...
— Charmoso?
— Não me interrompa.
— À vontade, senhorita Scherer.
— ... as impressiona com paisagens exuberantes, lugares mágicos e depois some as deixando loucas, por fim aparece do nada e as leva para conhecer sua família. O que vem depois? Irá me matar de uma forma romântica?
Liam a fita, perplexo.
— Não sei como vivi esses 200 anos sem você.
A garota sentiu o rosto queimar. As vezes parecia que eles se conheciam a tanto tempo, que quando estavam juntos, todas as conversas que nunca tivera, pareciam repetidas.
— Tem certeza, Ellie?
Já havia tentado a convencer de todas as formas a desistir. Desistir de tudo aquilo. Se ela desistisse dele, seria mais fácil.
— Se acha que vai se livrar tão fácil assim de mim, está redondamente enganado.
— Muito bem – soltou um falso suspiro e falou sério – não aceite nada que ele lhe oferecer. Não concorde com nada que ele falar e acima de tudo, se ele lhe estender a mão não a aperte.
— Isso seria falta de educação, não?
— Ellie! Ele não machucaria você, mas tenho certeza de que manipularia de alguma forma. E se achar necessário, corra. Não vai adiantar muito, mas pode ser que dê tempo para que eu faça alguma coisa. Então fique atenta e não se distraia.
Esse era um pedido difícil. Ela fez um muxoxo, mas suspirou, vencida.
— Certo.
Ele a pegou nos braços bem devagar, como quem dá tempo de a vítima espernear e correr. Mas ela não o fez, apenas segurou firme. Como sempre veio o vento forte e os vultos, Ellie já conseguia manter um olho semiaberto para testemunhar o evento, não que adiantasse, já que tudo acontecia em um piscar de olhos.
Pararam em cima da uma pequena colina, observou a casa que parecia afundar dentro daquele vale. O vento soprou as folhas alaranjas naquele gramado amarelo. Aquela mesma sensação ruim no dorso de suas costas a atingiu, fazendo-a estremecer. Havia um caminho de pedras até a entrada. Começaram a descer então. A casa era feita de grossos troncos de madeira, onde uma varanda corria a sua frente, assim como no primeiro andar, as grandes janelas eram seladas por cortinas azuis, e a imensa porta dupla de mogno esculpida lhes convidava para entrarem.
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Despertar: entre a ordem e o caos
Fantasia[Livro I da trilogia "Despertar"] O equilíbrio entre os mundos há muito foi quebrado - não sabe quando e como - mas cabe aos Guardiões restaurá-lo, para que a magia e a corrupção não leve tudo à ruina. Mas o ódio desses três grandes Guardiões foi ta...