Dentes-de-leão, rosas e casacos

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O SOL SE PUNHA atrás das montanhas. Aquela pesada nuvem monstruosa havia retornado. Descansava no telhado da mansão preguiçosamente. Ellie não havia comparecido a cafeteria. Não queria encarar Zahara nem Ariane, com as mesmas perguntas de sempre, principalmente depois daquele dia, em que voltara para casa mais tarde que o habitual, elas estavam mais desconfiadas.

Então preferiu vagar pelo campus para evitá-las. Precisava ensaiar uma desculpa, pois sabia que não era boa nisso. Passou pela estufa, onde Trudie White cuidava de suas flores. A senhora White era uma senhora simpática que amava plantas. Depois do 'incidente' na floresta, o senhor Collins havia pedido para que Ellie ajudasse na estufa por uma semana. Foi o melhor castigo que já recebera. Parou para cumprimentar a senhora.

—Ah, menina Ellie. – Ela lhe mostrou um sorriso e uma orquídea. Os cabelos meio cinzentos presos por uma fita em um coque meio frouxo, as luvas rosadas, a mesma jardineira amarela e o avental surrado.

—Já está esfriando, a senhora deveria ir para casa.

—Minha casa é onde minhas plantas estão, não posso deixá-las sozinhas assim.

Ellie sorriu, iria começar a usar essa filosofia.

Trudie era a pessoa mais gentil que ela conhecera. Sempre com balas sortidas no bolso da jardineira, oferecendo para os alunos que a ajudavam na estufa.

—Tem algo incomodando você, minha menina?

A garota aspirou longamente.

—Não – soltou de uma vez.

—Alguém fez alguma coisa a você?

Baixou a cabeça.

—Não.

Trudie sorriu amavelmente.

—Você não é muito boa em esconder o que pensa, não é mesmo? – a garota enrubesceu. A senhora foi até uma das roseiras e cortou com o alicate uma rosa branca – todas as flores tem seu significado e são especiais da sua forma. Apesar de aparentarem ser frágeis elas carregam em si muita força, apesar do frio, elas resistem, aqui, nessa estufa, mesmo nos jardins mais frios elas resistiriam até a chegada da primavera. Somos como flores, não? – ela lhe estendeu a rosa e sorriu – resistimos.

— Eu devo ser um dente-de-leão. Se espedaça com a mais leve brisa.

Trudie riu-se.

— E suas sementes geram outras vidas – ela apontou para a flor em mãos – Rosas brancas significam amor eterno. Acho uma bela acompanhante para os dentes-de-leão.

Quando saiu e se despediu de Trudie percebeu que havia em seu olhar um pouco de dor, talvez fosse porque suas flores eram suas únicas companhias.

Ela desceu a colina, na parte acidentada do campus, a que ia de encontro com a floresta de bétulas. Parou na fileira de árvores nuas, os galhos a apontar para cima. Recostou as mãos enluvadas no tronco esbranquiçado. Então sentiu uma presença estranha. Conhecia aquela sensação. Era perigosa. Esperou atenta.

—Aonde vai?

virou-se sobressaltada.

— Ah, é você.

Liam recostou-se no tronco e fitou a rosa em sua mão.

Ela escapou de seus olhos e entrou na floresta, vagando por entre as árvores. A presença estranha não era Liam, mesmo assim resolveu esquecê-la, talvez só estivesse paranoica. Desde o incidente aquela sensação não havia a abandonado.

Despertar: entre a ordem e o caosOnde histórias criam vida. Descubra agora