036. COMO MULHER.

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𝐀𝐍𝐈𝐓𝐀 𝐂𝐀𝐌𝐏𝐎𝐒

Ele mal consegue segurar o sorriso ao se apressar, e eu fico aqui, observando a cena como se fosse uma comédia. Me encosto na moto e solto uma risada baixa, imaginando o quanto essa história vai render mais tarde.

Eu me sinto o próprio "macho hétero" da relação, enquanto ele tenta manter a compostura depois de praticamente grudar em mim de tanto medo durante o trajeto. O jeito desengonçado de andar, apressado e ainda com o cabelo bagunçado, só me faz querer rir mais.

Subo na moto de novo, mas dessa vez sozinha. A sensação do vento batendo no rosto me dá uma paz estranha, como se o mundo fosse um pouco mais simples quando estou pilotando. Enquanto dirijo de volta pra casa, começo a pensar na gente, em tudo que aconteceu nesses últimos meses.

Raphael e eu finalmente estamos juntos sem precisar nos esconder como antes, e isso... Isso é uma sensação que eu nunca pensei que pudesse ter. Claro, ainda somos discretos, não tem jeito. Ele é o Veiga, a mídia adora uma fofoca, e qualquer passo em falso pode virar manchete. Mas mesmo assim, é diferente de antes. Não é mais aquela pressão constante, aquele medo de sermos descobertos a cada segundo. Agora é mais leve, mais gostoso.

Esses meses têm sido como um teste, mas um teste que eu amo fazer parte. A gente se conhece cada vez mais, nas coisas pequenas, nos detalhes que só vêm com o tempo. Tipo como ele odeia dormir com a TV ligada, ou como eu sempre roubo a coberta de madrugada sem perceber. E claro, tem o jeito que ele sorri de lado quando eu digo alguma besteira, como se ele fosse o mais sério do mundo, mas no fundo tá adorando.

Parece que finalmente a gente encontrou um ritmo. Ainda que tenha que ser discreto em público, dentro de casa é só a gente, sem filtros. E é gostoso poder viver isso, sem aquele peso constante da culpa

Agora ele me enxerga além, me enxerga como sua mulher. Não só aquela amante secreta que eu fui por tanto tempo, mas a mulher que ele escolheu estar ao lado. Ouvir isso sair da boca dele é incrível, é como se tudo finalmente estivesse no lugar certo.

E justo nesse momento, enquanto um sorriso discreto surge no meu rosto com esse pensamento, sinto um impacto violento do lado esquerdo da moto. O mundo ao meu redor vira de cabeça para baixo num piscar de olhos.

O barulho estridente do metal contra metal ecoa nos meus ouvidos, e antes que eu possa entender o que aconteceu, meu corpo é lançado para longe. A moto derrapa no asfalto, faíscas saltando enquanto ela raspa no chão, e eu... Eu estou no ar, o coração disparado, o vento chicoteando meu rosto enquanto voo sem controle.

O tempo parece desacelerar. Tudo o que vejo são flashes: o chão, o céu, o chão de novo. Então, o impacto vem com força, e o ar é arrancado dos meus pulmões enquanto rolo no asfalto. A dor que eu esperava não chega, mas o choque faz o corpo inteiro vibrar. Fico deitada, imóvel por alguns segundos, tentando processar o que acabou de acontecer.

Estou viva? Não sinto nada quebrado. A adrenalina corre tão rápido que nem sei se estou machucada.

Aos poucos, o som volta: buzinas distantes, passos apressados, e então uma voz feminina, quase desesperada.

– Meu Deus, você tá bem? — a voz se aproxima, os passos cada vez mais rápidos. – Eu não te vi! Me desculpa, por favor...

Eu tento me levantar, me apoiando nos cotovelos enquanto a figura à minha frente se ajoelha ao meu lado, me ajudando a sentar.

– Tá doendo alguma coisa? Você tá machucada? — a voz pergunta novamente, quase sem fôlego, cheia de preocupação.

Quando finalmente levanto os olhos, meu estômago dá um nó. A pessoa que está ali, com as mãos tremendo e o olhar em pânico, é Bruna. Sim, a Bruna.

𝐀𝐃𝐔𝐋𝐓É𝐑𝐈𝐎. - 𝐑𝐀𝐏𝐇𝐀𝐄𝐋 𝐕𝐄𝐈𝐆𝐀.Onde histórias criam vida. Descubra agora