Azul

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De volta à galeria, Juliana caminhava com cuidado, temendo piorar ainda mais o estado já desordenado do lugar. Seus passos eram lentos, e seus olhos pareciam procurar algo perdido entre as manchas de tinta secas e os móveis cobertos de poeira.

Foi quando avistou, no meio do chão de madeira, a persistente mancha amarela. Apesar de todas as tentativas de Camila para removê-la, ela permanecia ali, imutável.

"Mais que droga, mal chegamos aqui e já manchamos o assoalho", Camila resmungara naquele dia, enquanto esfregava o chão com uma determinação quase cômica.

Juliana sorriu ao lembrar da cena. "Que bom que ela não conseguiu", pensou, permitindo-se ser invadida por lembranças.

– Para onde você está me levando? – Camila perguntou, com as mãos entrelaçadas às de Juliana, após ser puxada do chão.

– Calma, não é como se eu fosse te sequestrar... de novo – respondeu Juliana, em tom de brincadeira, guiando-a até um grande espelho no canto da galeria. – Aqui, pare.

Camila ficou de frente para o espelho, um tanto confusa. Instintivamente, mexeu no cabelo, percebendo o quanto o roxo havia desbotado, revelando suas raízes loiras.

– Tá, estamos aqui... e agora? – perguntou, arqueando as sobrancelhas. – O que você quer me mostrar?

– Você já está vendo – respondeu Juliana, posicionando-se atrás de Camila e envolvendo sua cintura com os braços. – Olhe com atenção.

Camila franziu a testa, genuinamente tentando entender. De repente, abriu um sorriso confiante.

– Já sei! Roxo! Mas sério que você escolheu me dizer que essa é sua cor favorita justo quando meu cabelo está todo desbotado?

Juliana riu, balançando a cabeça.

– Não é roxo – corrigiu, com uma serenidade cativante. – Olhe melhor.

Camila inclinou a cabeça, analisando seu reflexo.

– Hm... Eu realmente não faço a menor ideia.

Juliana virou Camila suavemente em sua direção, segurando suas mãos.

– Azul – disse, com a voz baixa, mas carregada de convicção.

Camila piscou, surpresa. Por um momento, pensou em rir, mas o olhar sincero de Juliana a fez recuar.

– Sério? Por causa dos meus olhos? – perguntou, apontando para seus olhos azuis brilhantes.

– Obviamente, seus olhos são lindos – respondeu Juliana, afastando uma mecha de cabelo que caíra sobre o rosto de Camila – mas eles são apenas parte de uma história que gosto muito.

Camila inclinou a cabeça, interessada.

– Ah, é? Qual história?

Juliana respirou fundo, buscando as palavras certas.

– Os gregos antigos conheciam a cor azul, mas não tinham uma palavra para ela. Para eles, o mundo era dividido entre dia, branco, e noite, preto. Azul era um conceito que existia, mas não conseguia ser nomeado.

Camila arqueou as sobrancelhas, surpresa com a explicação.

– Então é por isso que azul é sua cor favorita? E não amarelo?

Juliana sorriu de canto.

– Não exatamente. Quer saber o que isso realmente significa para mim?

Camila assentiu, seus olhos azuis fixos nos de Juliana.

– Azul sempre me lembra que algo pode existir mesmo que não possamos expressá-lo com palavras. Quando te conheci, você estava exibindo um quadro de um céu limpo. Era um azul tão bonito que precisei parar para olhar mais de perto.

Juliana corou levemente ao se lembrar da cena.

– Você apareceu do meu lado e começou a falar rápido sobre tudo o que queria expressar naquela obra. Foi então que percebi que o céu que você pintou não era o azul mais bonito que eu já tinha visto... eram os seus olhos. Desde aquele dia, nunca consegui encontrar uma palavra que explicasse o que sinto por você. Igual ao azul que, por tanto tempo, existiu sem nome, mas sempre esteve lá.

Camila sentiu o peso da confissão de Juliana, e um sorriso suave surgiu em seus lábios. Sem dizer nada, envolveu Juliana em um abraço apertado antes de beijá-la, um beijo longo, profundo, cheio de tudo o que nenhuma palavra conseguiria expressar.

– Eu te amo – sussurrou Camila, ainda com os lábios próximos aos de Juliana, enquanto o eco daquela confissão preenchia todo o espaço da galeria.

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