– Sempre pensei que minha vida terminaria dessa forma... – Juliana soltou, quase sem perceber, e arrependeu-se no instante seguinte.
Era pouco depois das seis da manhã. A cozinha, banhada pela luz suave do sol nascente, parecia um refúgio acolhedor. O cheiro de café fresco envolvia o ambiente enquanto Juliana e Camila dividiam um raro momento de calmaria, conversando sobre como se imaginavam daqui a muitos anos.
O silêncio que se seguiu às palavras de Juliana pairou como um intruso. Camila a encarou, com os braços cruzados e um olhar que misturava curiosidade e preocupação.
– Você ainda pensa assim? – perguntou, com um tom levemente irônico. – Estou me sentindo um pouco... como posso dizer... desvalorizada?
Juliana desviou o olhar, sentindo-se culpada. Camila levantou-se da cadeira, aproximando-se do balcão onde Juliana estava. Com um gesto natural, suas mãos encontraram as de Juliana, enquanto o café, prestes a transbordar, parecia refletir a tensão no ar.
– Eu sei que não é a melhor visão de futuro para compartilhar com você – começou Juliana, a voz hesitante. – Mas é como se minha mente travasse quando tento imaginar algo mais.
Camila franziu o cenho, mas seu tom permaneceu leve:
– Realmente é uma pena. Eu esperava que você imaginasse um futuro sem solidão.
Juliana sentiu o impacto das palavras, embora o abraço apertado de Camila, que veio logo em seguida, tivesse a habilidade mágica de dissipar parte do desconforto. A sensação de estar segura nos braços de Camila fez o mundo parecer menos caótico.
– Desculpa – murmurou Juliana, virando-se para encarar aqueles olhos que pareciam conter todo o azul do céu. – É só uma ideia boba, uma sombra de adolescência que não faz mais sentido. Porque, claro, eu imagino um futuro com você.
Ela beijou a testa de Camila, um gesto suave e cheio de significado. Apesar da insegurança em suas palavras, aquele beijo falava de uma certeza que Juliana sentia no fundo do coração.
– Sei... Vou acreditar em você, mesmo que suas palavras soem um pouco... forçadas – disse Camila, com um sorriso que misturava brincadeira e carinho.
Passou as mãos pelo pescoço de Juliana e selou a conversa com um beijo suave, o tipo de beijo que parecia acalmar qualquer tempestade.
– Você precisa parar de tentar decifrar minha mente – Juliana comentou com um sorriso tímido, pousando as mãos na cintura de Camila. – Você mesma vive dizendo que ela é... como é mesmo? Infantil?
– Eu nunca disse isso! – protestou Camila, em tom de brincadeira, enquanto seus olhos brilhavam de diversão. – Vou acreditar nas suas palavras só se você conseguir provar. Caso contrário, vou ter que concluir que sua memória veio com defeito de fábrica.
Juliana riu, dando-lhe um beijo rápido na bochecha antes de se virar para servir o café.
A mesa estava deslumbrante, com frutas frescas, sucos coloridos, geleias, pães variados, ovos e doces. Era um cenário digno de um brunch de hotel cinco estrelas, mas para elas, era apenas mais um domingo – um ritual silencioso que se tornara tradição.
Enquanto conversavam sobre a semana que havia passado, Juliana ouvia Camila com atenção quase devota. A paixão de Camila pela arte, a forma como ela descrevia seus projetos, sempre encantava Juliana. Era impossível não se lembrar do momento em que se apaixonara por aquela energia criativa que parecia não ter fim.
O cabelo de Camila, naquele dia, exibia um tom rosa desbotado que refletia a luz dourada do sol. Seus olhos, de um azul tão claro que pareciam translúcidos, brilhavam com a intensidade de suas palavras. E as mãos... sempre manchadas de tinta, mesmo após inúmeras tentativas de limpeza, eram uma lembrança constante de quem ela era.
De repente, Camila mudou de assunto abruptamente:
– Precisamos trabalhar sua visão de futuro – anunciou, cruzando os braços e arqueando uma sobrancelha. – Isso é uma ordem.
Juliana ergueu a sobrancelha em resposta, desconcertada pela seriedade inesperada na voz de Camila.
– Vai ser divertido ver você tentar – respondeu Juliana, tomando um gole de café enquanto seu olhar se perdia pela janela, um sorriso desafiador nos lábios.
Camila inclinou-se sobre a mesa, como se estivesse planejando algo grandioso.
– Confie em mim, eu sempre consigo o que quero – disse, com um brilho travesso nos olhos, deixando no ar a promessa de que a vida que imaginavam construir juntas seria tudo, menos solitária.
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Blue | ⚢
Roman d'amourJuliana vive mergulhada em uma solidão que já parece parte de sua própria identidade. Desde a perda devastadora de seu grande amor, ela se isolou, convencida de que a dor é mais segura do que arriscar sentir novamente. As tentativas de suas melhores...