Poucas pessoas sabiam que Juliana havia vivido um longo relacionamento no passado. Na verdade, tudo o que Gabi sabia era que Juliana estava sozinha há mais de cinco anos e se recusava, com todas as forças, a se envolver novamente com alguém.
– Com quem você costumava vir aqui? – Perguntou Gabi, quebrando o silêncio que envolvia as duas.
Juliana foi arrancada de seu transe e demorou alguns segundos para processar a pergunta.
– Como assim? – Ela respondeu, um tanto desconcertada.
– Você conhece o lugar tão bem, sabe todos os pratos com detalhes... Acho que alguém costumava te acompanhar aqui.
Juliana olhou para o menu como se o observasse pela primeira vez, como se tivesse sido transportada para um lugar distante em seus pensamentos.
– Era uma amiga – respondeu, com a voz mais suave agora, como se recordasse com carinho. – Ela adorava vir aqui. Sempre dizia que o ar desse lugar era acolhedor, e que a comida tinha cheiro de casa.
Gabi levantou uma sobrancelha, sorrindo levemente, com um tom brincalhão.
– E essa "amiga" – ela fez aspas no ar, enfatizando a palavra – tem nome?
Juliana demorou um momento para responder, mas o sorriso de Gabi parecia ser uma ponte segura para aquilo que ela ainda tentava esconder.
– Sim, ela se chamava Camila.
– Por que você não a chama para se juntar a nós aqui? Aposto que ela ficaria feliz em nos encontrar, já que gosta tanto do lugar.
Juliana manteve a expressão séria e, antes que pudesse responder, a garçonete chegou com o pedido.
– Ela não pode vir – Juliana respondeu de forma fria, mas com um olhar que, por um instante, revelou a tristeza que ela tentava disfarçar.
O almoço seguiu sem muitas palavras. Ambas comeram com rapidez, como se o tempo tivesse se comprimido ali, entre elas, tornando difícil até mesmo conversar.
– Você estava certa – Gabi finalmente disse, quebrando o silêncio. – Esse risoto realmente é uma delícia.
Juliana não conseguiu evitar um sorriso de satisfação.
– Normalmente, eu tenho razão – disse ela, com um tom de leve deboche, que fez Gabi rir.
Mas logo a conversa foi interrompida novamente, quando Gabi, percebendo os movimentos de Juliana em direção à carteira, a impediu com um olhar firme.
– Nem pense em pegar a sua carteira – disse Gabi, de forma decidida. – Combinamos que a próxima conta seria minha.
Juliana a encarou por um momento, sorrindo de maneira desafiadora.
– Você tem razão – ela disse, baixando a cabeça, resignada, mas com um brilho travesso nos olhos.
Após o almoço, as duas caminharam pela rua, sem pressa, aproveitando o clima ameno, até que Juliana, repentinamente, parou e se virou para Gabi.
– Ouvi o que você disse ontem à noite, quando achou que eu estava dormindo.
Gabi congelou. Seu coração acelerou e uma onda de vergonha a invadiu. Ela tinha certeza de que Juliana estava profundamente adormecida. Como pôde deixar seus pensamentos escaparem assim?
– O que eu disse ontem? – Gabi tentou disfarçar a preocupação na voz, mas sabia que era tarde demais.
Juliana a olhou diretamente nos olhos, sem hesitar.
– Sim, o que você disse, sobre querer me beijar.
O ar entre elas ficou mais denso e Gabi ficou sem palavras por um momento. Ela tentou encontrar uma desculpa, algo que aliviasse a situação, mas não conseguiu.
– Eu disse isso? – Gabi riu nervosamente, tentando disfarçar. – Deve ter sido o álcool. Me desculpa, Ju.
Juliana a observou, mas, em vez de revidar, apenas deu um suspiro profundo e continuou caminhando ao lado de Gabi.
– Ok, se você prefere que sigamos assim, por mim tudo bem. Eu realmente fiquei um pouco confusa, porque nunca imaginei que algo assim pudesse acontecer, mas como você mesma disse, deve ter sido o efeito do álcool.
A resposta de Juliana foi cortante, mas Gabi não sabia o que dizer. Elas seguiram em silêncio até o apartamento.
Quando chegaram, Gabi se apressou, pegando suas coisas e indo em direção à porta, mais rápido do que Juliana poderia prever.
– Estou indo, Ju! O Uber já está chegando.
Juliana se levantou apressada da sala, surpresa com a rapidez de Gabi.
– Como assim? Eu nem sabia que você já havia chamado um! – Ela perguntou, visivelmente atônita.
Gabi sorriu com pressa, pegando sua bolsa.
– Preciso resolver sobre minha chave, e também quero te deixar mais tranquila, para que você aproveite seu dia frio do jeito que gosta.
Juliana rapidamente vestiu o moletom e se dirigiu para a porta, mas, antes que pudesse alcançá-la, percebeu que Gabi já tinha partido.
Ficou ali, parada, olhando para a porta que se fechava, um misto de sentimentos tomando conta de seu peito. Será que, de fato, ela estava pronta para lidar com o que as palavras não ditas haviam causado?
O som dos passos de Gabi se afastando ecoou por alguns segundos, e Juliana, sozinha, tentou se reconectar com seus próprios pensamentos, mas sabia que algo havia mudado naquele dia. Algo que ela não sabia ao certo o que era.
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Blue | ⚢
Roman d'amourJuliana vive mergulhada em uma solidão que já parece parte de sua própria identidade. Desde a perda devastadora de seu grande amor, ela se isolou, convencida de que a dor é mais segura do que arriscar sentir novamente. As tentativas de suas melhores...