Chegando em casa, Juliana se jogou no sofá, o corpo pesado e a mente exausta, ansiando por um momento de silêncio. Era a primeira vez, desde a confusão na galeria, que ela se permitia descansar. Mas, assim que fechou os olhos, a paz fugiu. A imagem de Camila se formou em sua mente com uma nitidez cruel, como um fantasma que se recusava a ir embora.
"Eu não consigo encarar isso agora, Camis." — murmurou para o vazio ao seu lado. — "Não consigo!" — repetiu, apertando os olhos com força, como se isso pudesse afastar as lembranças.
A memória emergiu sem aviso.
— E se eu morrer primeiro? — Camila perguntou, a voz leve, mas cheia de algo que Juliana não conseguiu decifrar na hora.
As duas estavam sentadas em seu parque favorito, os olhos fixos no lago calmo. Era primavera, e o sol iluminava os cabelos de Camila, recém-pintados de um verde vibrante que parecia brilhar sob a luz.
— Para de falar besteira. — Juliana respondeu, visivelmente incomodada.
— Não é besteira, Ju. É só uma possibilidade. Então... e se eu morrer primeiro? O que você faria?
— Eu não quero pensar nisso. — Juliana respondeu de forma brusca, virando o rosto para disfarçar o desconforto.
Camila suspirou e se inclinou ligeiramente, sua expressão antes descontraída assumindo um tom sério.
— Tudo bem, mas preciso dizer uma coisa antes de mudarmos de assunto.
Juliana olhou para ela de relance, ainda incomodada, mas assentiu.
— Se eu partir antes de você, eu quero que você continue vivendo. Quero que se permita ser feliz, que se permita amar outra pessoa.
As palavras de Camila cortaram o ar como uma faca.
— Isso é impossível. — Juliana respondeu, quase num sussurro, mas com firmeza suficiente para encerrar o assunto.
— Não é impossível. — Camila retrucou, mas sua expressão suavizou com um sorriso brincalhão. — Embora, olhando para mim agora, dá pra entender por que seria difícil resistir.
Juliana revirou os olhos, irritada.
— Por que você tá falando isso?
— Não sei... Só achei que você deveria saber que eu te amo o suficiente para querer isso pra você. Não quero que fique sozinha, Ju. Não quero que perca o que ainda pode viver, porque sei o quanto você é romântica.
Os olhos azuis de Camila a encararam sem piscar, carregando uma intensidade que Juliana nunca esqueceria.
— Eu não vou deixar nada acontecer com você. — Juliana afirmou, cada palavra carregada de determinação.
— Às vezes, não depende só de você, Ju. — Camila respondeu, antes de se levantar e sair correndo em direção ao lago, rindo como uma criança.
Juliana permaneceu sentada, observando-a de longe, tentando entender o que ela quis dizer.
De volta ao presente, Juliana sentiu a memória se dissipar como fumaça.
— Desculpa... Desculpa por não conseguir te proteger. — sussurrou, enquanto uma lágrima solitária escorria por seu rosto.
Ela levou a mão ao peito, tentando conter a dor que parecia consumir tudo ao seu redor. O apartamento vazio parecia ecoar as palavras de Camila, como se ela ainda estivesse ali. Juliana sabia que precisava seguir em frente, mas as palavras "continuar vivendo" soavam mais como uma condenação do que como um alívio.
Sentada naquele sofá, envolta em lembranças, Juliana percebeu que o luto não era apenas sobre a ausência de alguém. Era sobre as promessas que não pôde cumprir, os momentos que não puderam viver e a voz que ainda ecoava, mesmo na mais profunda das solidões.

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Blue | ⚢
RomanceJuliana vive mergulhada em uma solidão que já parece parte de sua própria identidade. Desde a perda devastadora de seu grande amor, ela se isolou, convencida de que a dor é mais segura do que arriscar sentir novamente. As tentativas de suas melhores...