Juliana sentiu as pernas fraquejarem, como se o peso da lembrança fosse esmagá-la de dentro para fora. O impacto da memória rompeu a barreira que ela mantinha há anos, e a dor, tão cuidadosamente reprimida, veio à tona com uma intensidade avassaladora. Ela desabou no chão da galeria, enquanto lágrimas, quentes e incessantes, deslizavam por seu rosto.
O coração parecia encolher dentro do peito, apertado como se estivesse sendo esmagado por mãos invisíveis. O espaço ao seu redor, antes vasto e cheio de história, agora parecia sufocante. As paredes pareciam fechar-se, enquanto sua mente era inundada por memórias caóticas e desordenadas. Cada flash era mais doloroso que o anterior, e sua respiração entrecortada mal conseguia acompanhar o ritmo desenfreado de seus pensamentos.
Ela sabia que não deveria estar ali sozinha. Sabia que precisava de ajuda. Mas admitir isso era uma ferida que ela ainda não estava pronta para abrir. O mundo começou a girar ao seu redor, as luzes da galeria piscavam, ou talvez fosse apenas sua visão turva pelo pânico. A ansiedade transformava cada segundo em uma eternidade. Juliana agarrou-se ao vazio, tentando desesperadamente encontrar algo — qualquer coisa — que a ancorasse.
Foi quando o celular vibrou em seu bolso. Em meio ao turbilhão de emoções, seus dedos trêmulos deslizaram pela tela, atendendo a ligação sem nem mesmo olhar o nome na tela. Um "oi" escapou de seus lábios antes de seu corpo sucumbir à escuridão que já vinha se aproximando.
— Ju, acorda! — A voz desesperada de Sofia cortava o silêncio. Ela estava ajoelhada ao lado de Juliana, sacudindo-a levemente. — Por favor, acorda! — Lágrimas já escorriam pelo rosto de Sofia, seu desespero evidente.
Juliana abriu os olhos lentamente, piscando contra a claridade da luz. A figura familiar de Sofia tomou forma à sua frente.
— Sofie? — murmurou, usando o apelido que era permitido apenas aos intimos. — Como você está aqui?
Sofia soltou um suspiro de alívio antes de responder, sua voz ainda trêmula. — Eu te liguei. Você só disse "oi" e depois ficou em silêncio. Fiquei preocupada.
Juliana tentou se sentar com a ajuda de Sofia, mas a confusão ainda nublava seus pensamentos. — Mas... como você sabia que eu estava aqui? — Sua mente tentava reconstruir o que havia acontecido, mas era como tentar pegar fumaça com as mãos.
— Quando fui ao seu apartamento e não te encontrei, pensei na única outra possibilidade. — Sofia começou a andar de um lado para o outro, nervosa. — Juliana, aonde mais você iria a essa hora da noite? Esse lugar é praticamente uma extensão sua.
Juliana abaixou o olhar, constrangida pela percepção da amiga. — Eu só... precisava vir. Renata me ligou. Disse que vai vender a galeria.
— Vender?! — A incredulidade de Sofia ecoou pelo espaço vazio. — Ela te falou isso antes ou simplesmente te avisou como se não fosse nada?
— Foi um aviso. — O tom amargo de Juliana refletia seu descontentamento.
Sofia parou de andar, cruzando os braços enquanto o rosto se enchia de indignação. — Eu achava que ela fosse melhor do que isso. Depois de tudo que vocês passaram...
Juliana tentou conter a raiva e a tristeza que ameaçavam transbordar. — Não importa mais. Eu só queria ver o lugar uma última vez antes que as chaves fossem entregues ao novo proprietário.
Sofia aproximou-se dela novamente, o olhar firme, mas repleto de preocupação. — Não, Ju. Isso importa. Olha pra você! Você desmaiou. Está suja, machucada e claramente não está bem. Vamos sair daqui. Agora.
— Foi só um desmaio, Sofie. Estou bem. — A tentativa de minimizar a situação soava vazia até para Juliana.
Sofia ignorou as palavras da amiga, segurando-a com firmeza. — Cala a boca. — Sua voz era grave, mas cheia de carinho. — Cadê a chave desse lugar?
Juliana apontou vagamente na direção da porta. — Acho que está lá.
Sofia encontrou a chave pendurada, reluzindo sob as luzes da galeria. Caminhou até a porta, desligou as luzes e fechou-a com cuidado. Antes de sair, lançou um último olhar para o espaço. A galeria, que um dia fora um santuário de arte e memórias compartilhadas, agora parecia apenas um eco vazio de algo.
Do lado de fora, enquanto a brisa fria da noite envolvia as duas, Sofia apertou o braço de Juliana com suavidade. — Vamos para casa. Não importa o que aconteça, você não precisa enfrentar isso sozinha.
Juliana assentiu, permitindo-se um raro momento de vulnerabilidade. Às vezes, encarar o passado exigia mais do que coragem — exigia companhia.
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Blue | ⚢
RomansaJuliana vive mergulhada em uma solidão que já parece parte de sua própria identidade. Desde a perda devastadora de seu grande amor, ela se isolou, convencida de que a dor é mais segura do que arriscar sentir novamente. As tentativas de suas melhores...