Capítulo XXXV

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 p.o.v. Isabela

 O monstro era enorme e impossível de derrotar. A batalha estava perdida ao início mas nós não ligámos. Combatemos com todas as nossas forças, mas de nada valia: a cada golpe da espada do Gonçalo, o monstro tentava esmagar-nos com mais violência e eu deixava de ter força para criar escudos. E foi então que o braço nos atingiu.

 Não me consegui agarrar a nada e iniciei uma queda livre em direção ao chão duro. Vi a vida a passar-me à frente dos olhos mas depois tudo parou. Ainda estava no ar, mas caía mais lentamente. Lá em baixo, vi as minhas irmãs a mexer a boca, com os braços esticados para me apanhar e murmurando palavras que comandavam o vento. Aterrei no barco ao lado delas, todos falavam comigo ao mesmo tempo, mas eu não ouvia.

 Estava vazia... As forças abandonaram-me, mas não desmaiei. Simplesmente fiquei ali sentada, fitando o monstro com os joelhos já mergulhados na água do mar. E levava a mão fechada em murro à cara, olhando para algo que lá se encontrava. E eu soube o que era.

 Era como se estivesse a olhar através de um telescópio: via perfeitamente o Gonçalo, desmaiado, e os olhos gelatinosos e impiedosos. E depois aquela boca dupla cheia de dentes aguçados, a salivar pela última refeição.

 E quando gritei, era tarde demais. O barco afastava-se lentamente da ilha, mas eu continuava a ver os olhos do monstro colados a mim, enquanto ele limpava os lábios do sangue do meu melhor amigo e era como se repetisse milhares de vezes na minha cabeça:

 Há outras formas de te magoar. De te magoar. Magoar. Magoar... Acordar. Acorda. ACORDA!

 - Isabela, acorda! O avião está quase a aterrar. - disse uma voz à distância.

 Avião?! Como é que alguém está a pensar em aviões numa altura destas?! Mas é parvo ou quê? Abro os olhos para lhe dizer das boas e é então que vejo a cabine. Ah... este avião.

 - Mas... Como é que viemos aqui parar? - pergunto. Ao meu lado, o David sorri para mim com um ar atrapalhado.

 - O que queres dizer, babe?

 - Não te disse já para não me chamares isso?! - exclamo, quase aos gritos.

 - Ei! Menos barulho ai atrás. - ordena a Luísa, virando-se para trás.

 - Ma... Luísa?!

 - Sim, Bela?

 Estou muito confusa neste momento. E ainda se torna pior quando a cabeça do Gonçalo aparece ao lado da da Luísa.

 - Eu... mas eu vi-te morrer! Foste comido pe*

 - Uauauau... calmex! Deves ter tido um pesadelo muuuito pesado - diz o David, colocando o braço à minha volta. Pe... Pesadelo?! Será que... não... Não pode ter sido tudo um sonho.

 - Descansa, parece que não dormes à uma semana e tal. - diz a Laura, que aparece do banco atrás de nós.

 - E não durmo!!!

 Todos se riem.

 - Bela, acabaste de dormir para ai umas 7 horas!

 - Ahh... - fico sem saber o que dizer. Então a ilha... o acidente... a montanha... o beijo... a Stevei... a Yag e a Val... a magia... Era tudo um sonho? Olho para as palmas das minhas mãos e murmuro o feitiço da iluminação. Não acontece nada.

 Tudo não passou de um delírio nervoso da minha imaginação. Posso deixar tudo para trás?! E aproveitar as férias?! Não sei... nunca esquecerei este sonho tão perturbador, que me fez por em causa a minha relação, a minha natureza e tudo aquilo em que acredito. Serei capaz de voltar a olhar para a Luísa sem me lembrar do seu cadáver frio? Serei capaz de esquecer o Gonçalo do sonho? E voltarei a beijar o David com a mesma convicção?

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