Capítulo 15

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No final do treino, conseguia sentir o coração a bater-me nas têmporas e na garganta. O Professor Malik tinha-me oferecido um copo de água e deu por terminado o treino quando reparou que eu já não aguentava mais. De qualquer das maneiras, eu mereci este final, até porque ultrapassei os limites, algo que eu nunca faço. Não passamos do jogo de tirar a bola ou de tentar correr com a bola nos meus pés sem a perder - o que foi, por si, complicado -, mas não foi nenhum desperdício de tempo. Agora vinha a parte estranha da tarde, ou a parte mais estranha, visto que só o facto de eu estar a jogar futebol com o meu professor na casa dele já é estranho. Eu vou tomar um duche... na casa-de-banho dele. Tenta manter a calma, não é nada de mais.

É pois. A coisa mais anormal do mundo. Ainda me vejo num jogo de xadrez. Acabei de dar o primeiro passo: o peão em frente do Rei avançou duas casas. Vejamos o que me espera do outro lado, ou seja, dos meus amigos, da minha família... da escola.

A casa-de-banho onde me troquei tem um chuveiro e é lá que vou tomar um duche. Tinha trazido uma toalha e produtos de higiene na minha mochila, mais uma muda de roupa interior e uma escova para o cabelo. Sei lá eu porquê, paranoia minha, talvez, tranquei a porta por dentro e respirei fundo. Eu cada vez me sentia pior com isto. A água corria e ia aquecendo consoante os segundos que iam passando; entretanto, eu despi-me, amarrei o cabelo para não o molhar e entrei no chuveiro, fechando as portas de vidro e sendo invadida pela água quente a escorregar-me pela pele.

Não precisava de ficar aqui muito tempo, bastava limpar o meu corpo para apagar qualquer pista do que se sucedeu nesta tarde. Dois minutos depois, já tinha desligado a água e enrolado a toalha no meu corpo, saindo para o exterior. Depois, a minha mãe ligou-me. Atendi.

"Olá!" Disse eu, enquanto passava a toalha pelos meus braços.

"Onde estás?"

Aprendi uma coisa com os meus pais: quando nós lhes dizemos que vamos a certo sítio e eles nos ligam a perguntar onde estamos, não é porque se esqueceram; é porque estão nesse sítio e não nos viram ou porque simplesmente sabem que não estamos lá. Por isso, sempre que o meu pai ou, especialmente, a minha mãe me perguntam onde raios estou quando lhes tinha dito especificamente onde iria estar, eu invento uma desculpa, a não ser que esteja mesmo nesse sítio. E já são muitas desculpas nestas vinte e quatro horas.

"Vim à escola deixar umas coisas."

"Eu vim buscar-te à casa da Carly, mas não está ninguém." Ao menos não está ninguém, pior era se estivesse. "Começou a chover, não quero que te constipes. Onde estás para te ir buscar?"

Bolas. Não posso simplesmente dizer que estou na casa de um professor, pois não?

"Disseste que tinhas ido à escola?" Prosseguiu ela e eu consegui ouvir o barulho de uma mota a todo o gás do outro lado da linha. Ela deve estar a ir para a escola.

"Podes voltar para casa, mãe, eu ainda vou demorar. O Scott dá-me boleia, já te disse."

"Scott? Não era o Jon?"

Apanha-se mais depressa um mentiroso do que um coxo, dizem por aí.

"O Jon já foi para casa. O Scott leva-me... Mãe, eu tenho mesmo de me despachar aqui numa aranha de esferovite, estou em casa por volta das seis e meia. Beijinhos." E antes que ela pudesse puxar outro assunto depois de se despedir de mim, desliguei, pois estava muito ocupada com uma aranha de... esferovite.

Tinha meia hora para estar em casa, ou teria uma nova chamada, com poucas hipóteses de fuga a novas e mais complexas perguntas. Sequei-me, vesti a roupa que trazia antes de sair para o campo e penteei o meu cabelo, tentando ao máximo fazê-lo perder a marca do elástico, o que era, como todas as mulheres sabem, praticamente impossível. Portanto, desisti, e depois de o fazer comecei a arrumar as coisas na mochila. Eram seis e cinco quando saí da casa-de-banho.

Physical Education Teacher Z.M.Onde histórias criam vida. Descubra agora