Capítulo 4

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Sou daquelas pessoas que ocupa as folgas com os estudos, e com muito gosto, ou que vai adiantando trabalhos para quando der a matéria comparar com o que sabia com o que vou saber. É verdade, e não tenho vergonha disso. Como estou no último ano, tenho muitas poucas aulas de manhã e de tarde, o que me proporciona um enorme aglomerado de tempos livres para estudar para os exames e me preparar para a Universidade. O meu sonho sempre foi entrar em Cambridge, com média de 20. Sempre consegui uma média de 20, mas lá apareceu um bando de professores de Educação Física revoltados contra o ministro da educação, a dizer que estavam a ser pagos para ensinar os alunos os seus dotes, sem que isso valesse, sequer, para alguma coisa. E o que fizeram? Tiraram-me parte daquele aglomerado de tempos livres que eu tinha para estudar. E porquê? Porque as minhas tardes de quarta e sexta serão ocupadas com Educação Física.

O Diretor da Escola disse que todos os alunos de 12º que quisessem subir um pouco as suas médias podiam ser integrados naquela espécie de Aula de Apoio a Educação Física. Quantos é que quiseram ir? Zero. Porquê? Porque Educação Física é apenas uma disciplina contra as outras oito disciplinas que têm de estudar, cuja média vale muito mais do que fazer desporto, apenas porque sim. Eu sou a única que tem de dar valor a isso, porque ter uma média de 19,5 e ter uma média de 20, para mim, faz toda a diferença. Não podiam ter esperado um ano para aprovar essa ideia medonha? Apenas um simples ano!?

Por isso aqui estava eu, nos bancos de trás do carro do Mark, porque ele conduzia e no lugar de pendura ia a Anna, a sua namorada. A Anna era uma rapariga extremamente bela e delicada, tal e qual uma rosa. Pele pálida a fazer contraste com os seus olhos castanhos e um cabelo loiro que lhe caía em ondas naturais pelos ombros. Era muito baixa para o Mark, deviam ser uns vinte centímetros de diferença, mas isso pouco lhes importava. Aliás, as pessoas, incluindo eu mesma, consideravam isso adorável. E era adorável, de facto, porque ela se esticava toda apenas para o poder abraçar e ele daqui a uns anos ficaria corcunda de tanto se dobrar para a abraçar de volta.

"Vais fazer desporto, maninha?" Troçou ele, parando o carro em frente de uma rotunda, procurando um buraco no trânsito por onde se pudesse meter.

O que fariam pessoas normais com um irmão viciado em desporto, quando têm de subir a nota a Educação Física para entrarem na universidade com média 20? Exatamente: pedem ajuda ao querido e sempre pronto para ajudar irmão mais velho. Mas o Mark lá tinha todas as suas folgas ocupadas, entre estar com a Anna, dormir e jogar Call Of Duty com os amigos, e ajudar-me estava fora de questão.

"Vai pentear macacos." Resmunguei e ele desatou a rir. Anna continuava serena e silenciosa ao seu lado.

Aquele abismo de diferenças entre eles não se baseia apenas em higiene. A Anna toma banho duas vezes ao dia, desinfeta as mãos não sei quantas vezes, lava os casacos e os kispos e o calçado todos os dias, limpa o quarto duas vezes ao dia, e tudo mais, e o Mark... bem... o Mark é o protótipo de rapaz com 19 anos que tem um quarto alugado para estar mais perto da faculdade (só que na casa dos pais ainda): completamente desleixado, desarrumado, e tudo o resto. Mas havia outra diferença muito clara: ele só fazia barulho, entrava numa sala com a esperança de que toda a gente fosse olhar para ele e tenta meter piada sempre que fala. A Anna não, a Anna deixa-se estar no seu canto, sossegada e pacífica, com os seus próprios pensamentos e falando quando tem de falar.

"Entretém-te a fazer desporto." Estou farta de o ouvir a dizer Fazer desporto, porque é basicamente a mesma coisa que eu lhe estar sempre a dizer Vai lá então estudar. "Eu venho buscar-te quando acabar de fazer o meu próprio desporto de equipa com a Anna."

"Mark." Censurou ela e antes que o ambiente ficasse constrangedor por causa da minha presença, eu saí do carro, com um Até logo curto e rápido.

Physical Education Teacher Z.M.Onde histórias criam vida. Descubra agora