24 - O Pesadelo

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É a criatura. A essência de sombra, o espectro de sanguinários olhos vermelhos, o meu pior pesadelo. Havia tantas naquele pesadelo, mas só uma já evocava toda a experiência. O meu pior pesadelo, o pesadelo de um ano atrás. E aqui está ela, parada solenemente, me observando com suas pupilas terríveis, seus braços amorfos e sua ausência de pernas, aquele ser feito de escuridão, bem real, real demais, à minha frente sobre o sol. O meu pior pesadelo, que deveria continuar pesadelo.

Poderia não ter sido um pesadelo?

– Não...

– Faon. – Olho para Tysen, mas ele não olhava para mim. Ele olhava para frente, para a criatura, de pé, uma espada em cada mão. – Pegue a sua espada. – Ele estava resoluto. Claro, ele não conhecia aquela criatura, ele não sabia o que estava enfrentando. Mas ele está tão resoluto. Não posso falhá-lo agora. Nem a ele, nem ao meu pai, nem aos meus amigos, e nem a mim. E quando olho para Vampira, largada ao meu lado, eu a vejo brilhar.

Ela cintila com o poder do sangue dos meus inimigos, e tudo nessa situação é errado, mas não importa. Há um ano eu disse que buscaria o poder para vencer os meus pesadelos, e ele está em minhas mãos. Sim, empunho Vampira e finalmente posso senti-lo pulsando pelo aço, como um fluxo, como algo vivo.

Não resta mais dúvida, e eu corro.

Como antes, a sombra forma lâminas onde deveria estar os seus braços, as quais usa para bloquear o meu ataque sobre a sua cabeça. Mas não adianta. Minha arma brilha mais ainda e ela ultrapassa a guarda da sombra como se não fosse nada. E a partir daí, eu apenas corto.

Eu corto, corto, corto, corto, corto, corto, corto, corto, corto, corto, corto, corto, corto. Fumaça negra, ou melhor, o que parecia agora ser energia negra; se esvaía e evaporava no ar a cada golpe. Finalmente, com toda a minha força eu estoco a criatura e a afundo na terra. Ela esperneia, ferida.

– Queime. – E eu invoco o fogo.

~

Quando consigo ver novamente, existe um círculo negro ao meu redor, Vampira enfiado no meio dele, de volta ao seu estado "opaco". Eu estava com um joelho sobre o chão, e ambas as mãos segurando firmemente o cabo da minha espada.

Retiro a arma do chão, sento por um segundo antes de deitar, e me permito sentir tudo novamente: a dor, todas as dores, o medo, o nervosismo, a exaustão, o preço, o sono, mas principalmente a paz. Não sei qual é o pior ferimento: algo que tenha quebrado ou qualquer coisa assim ao ser arremessado de um lado para o outro ou o corte que cruza desde o meu ombro até o começo do meu abdômen, mas a essa altura a ajuda já deve estar chegando. Serei curado e restaurado.

Agora só me resta dormir.

Fecho os olhos.

Mas não durmo.

Apenas fico deitado ali, respirando lentamente, sem pensar em nada. Não sei quanto tempo passa até o silêncio ser interrompido. Quando abro os olhos, o burburinho já se torna uma comoção. Eu vejo alguns guardas correndo até onde eu estou de um lado, e Tysen sentado rente a uma parede em outro, antes das minhas pálpebras vacilarem novamente.

– Faon! Tysen! – Sinto braços sob a minha nuca e sobre a minha barriga. Este não é um guarda. Este é Shin, usando a vestimenta da cerimônia. Ao meu lado, Beatriz também está abraçando Tysen. – Você não está morrendo, está? Esse corte –

– Ah, não. O desgraçado só estragou a minha roupa. Só isso. – Respondo, tentando manter um tom de voz firme. O que é meio difícil, considerando a dor e minha camisa encharcada com sangue.

Canção de Ouroboros: A inocência do DescendenteOnde histórias criam vida. Descubra agora