Parte I: Liberdade

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PERSEGUIDA PELO PASSADO

 É possível lembrar-se do dia que você morreu? Talvez, dependendo de quantas vezes isso já aconteceu com você

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 É possível lembrar-se do dia que você morreu? Talvez, dependendo de quantas vezes isso já aconteceu com você. Comigo, foram nove.  

Algumas vezes na vida, somos empurrados pelo nosso destino à coisas extraordinárias das quais antes tentávamos escapar. Para alguns, passar pela vida sem realizar coisas grandes é algo totalmente normal, nem todo mundo tem no destino a estrela da bravura e o espírito da aventura, eu também pensava assim, que teria uma vida normal e rotineira como qualquer ser humano na terra acha que vai ter, até a noite em que o destino resolveu mudar as cartas sobre a mesa da minha vida e mostrar que ela não teria nada de comum. E que eu não tinha nada de humano. Mas, afinal, o que é ser humano em um mundo como o que eu vivo? Já faz um tempo que vejo animais bípedes e não humanos, por isso, parei de acreditar em muitas coisas conforme fui abandonando minhas fantasias infantis e despertando para a realidade sombria, percebi o que faz o mundo ser como é: poder, dinheiro, religião, falta de pensamento. Diante disso, vale a pena ser considerada humana? Para mim, não.

Eu corria o mais depressa que podia. A respiração doía insuportavelmente pelo esforço que meu corpo fazia para manter-se no ritmo e não parar, as pernas doíam e tremulavam, o vento parecia cortar meu rosto e os quatro indivíduos continuavam atrás de mim. Não sabia quem eram, como me encontraram ou mesmo de onde vinham, mas sabia, com toda certeza, que seu propósito ali era me eliminar, e eles não se preocupariam em dizer o porquê.

Entrei em uma esquina surpreendendo-me com o fato de como todo mundo parece desaparecer quando você está em risco. Sabia que havia uma loja de conveniência na próxima rua, se conseguisse chegar lá e ligar para o meu pai, estaria salva. Caso contrário, ele me veria dali algumas horas no necrotério. Como era possível? Até uma semana atrás eu estava em paz, com uma vida ordinariamente comum, estudando, esperando que algo acontecesse de diferente, mas não tão diferente assim! Experimentei olhar para trás e os vi, eram quatro caras estranhos, Tinha certeza de nunca tê-los visto antes, mas se eles não estivessem querendo arrancar minha espinha dorsal, eu adoraria conhecê-los melhor.

Não sei se era alguma impressão minha ou mesmo sinal do meu desespero, mas eles pareciam estar correndo em uma velocidade 'não humana', eu não duvidava nada que me alcançariam sem esforço se quisessem. Não tinha nada que pudessem querer de mim. Eu nunca os tinha visto na vida. Foi quando meu corpo esbarrou em alguma coisa dura que me agarrou, me fazendo gritar, e, com esforço, desprender-me e recuar um passo. Era um garoto.

— Você está bem?

Deixe-me pensar, tem quatro sujeitos querendo me deletar do arquivo do mundo e nem sei porque razão. Não era lógico que eu não estava bem? Eu não prestei muita atenção nele, mas tinha certeza de que já o vira em algum lugar. Não consegui responder e ele parecia não esperar resposta alguma.

— Fique quieta e atrás de mim. — Disse com a voz séria.

Eu não sabia o que responder, como eu podia confiar naquele estranho se havia mais quatro querendo me matar? Os outros se aproximaram, o pavor me dominou, ao que parecia, eu não tinha escolha.

— Fernando! — Um dos homens sorriu para o garoto, cinicamente. — Acho que está com o nosso brinquedo.

— Eu sinto muito estragar sua festa, Mateus, mas eu não vou deixar que a leve. — Disse o garoto em um tom de voz firme. — Vá embora e deixe-a em paz.

— Não me diga que você foi designado. — Ele sorriu dizendo a palavra com deboche.

— Isso não é da sua conta, não são assuntos seus. Agora vá embora. — Havia algo ameaçador na voz dele.

— Ou o quê? — Desafiou o garoto.

Fernando afastou-me com um empurrão nada delicado, fazendo com que eu me desequilibrasse e caísse de mal jeito na calçada, e sacou de dentro do sobretudo uma espécie de espada com lâmina transparente, era reta, com um cabo que parecia gelo em um tom levemente azulado. Os quatro caras sorriram e puxaram suas mesmas espadas, mas, ao contrário da de Fernando, suas espadas tinham uma lâmina preta com extremidades vermelhas e o cabo era de um preto denso com nuances vermelhas pintadas. "Ótimo, cinco malucos brincando de Star Wars!" pensei comigo mesma, assustada e confusa demais para achar graça.

— Você sabe que não pode me vencer. — Ameaçou Fernando.

— Adrian quer a garota, se eu não levá-la agora, por bem, ele vai pegá-la de qualquer maneira.

Quem?

Ninguém vai encostar nela, entendeu, Mateus?

O outro não respondeu, eles avançaram sobre Fernando e meu estômago revirou, eram três contra um, mas o garoto parecia levar numa boa. O quarto cara, bom, esse estava vindo para cima de mim.

Foi tudo muito rápido, Fernando estava lutando contra três deles, eu vi quando, com uma agilidade sobrenatural, ele manejou aquela espada estranha e golpeou-os decapitando dois de uma só vez e empalando o outro. O quarto, que já estava tão próximo de mim que eu mal conseguia me mexer, segurava também uma espécie de ancinho do mesmo material preto e vermelho da espada dos outros, ele ergueu-a e eu me protegi com o braço sentindo a lâmina rasgar minha pele como brasa quente, parecia que era feita de puro fogo. Uma tontura me acometeu, eu me arrastei para longe dele, incapaz de levantar, sentia as forças me deixando, e ele sorria sadicamente enquanto se aproximava de mim, o sangue no meu braço fazia trilha na calçada, o sujeito avançou novamente erguendo o ancinho de lâmina escura sobre mim, mas antes que ele conseguisse me golpear novamente a lâmina transparente perpassou suas costas e avançou peito à fora, lançando um borrifo de sangue sobre mim. Uma onda de náusea, e o mais profundo pavor, me dominaram. O grito veio com força no fundo da minha garganta, mas eu não consegui emitir uma única nota. O corpo dele caiu, e a visão de Fernando, glorioso e ensanguentado, foi a última coisa que me lembro ter visto antes do mundo entrar em colapso e eu desmaiar.

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