Capítulo 49 .......... Sentido

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Dylan Narrando


Já era tarde quando entrei com o carro na garagem do prédio de Scarlatti. A conversa com Laura demorou mais do que eu imaginava e eu nem tive a chance de falar sobre a promoção. Para completar, um acidente na avenida principal havia me posto num engarrafamento do inferno, retardando minha chegada. Eu tinha prometido a Scarlatti chegar mais cedo para ajuda-la com o empacotamento para a mudança, e eu só podia torcer para que ela não ficasse zangada comigo pelo horário que, ao invés de ser o costumeiro ou o mais cedo como prometi, havia sido excedido.

Eu estava um pouquinho tenso quando saltei para fora do elevador que dava para o nosso andar. Scarlatti com certeza estaria zangada, no mínimo chateada pelo meu atraso. Ela nem sequer havia me ligado para cobrar nada ou perguntar onde eu estava, e isso não devia significar um bom sinal.

Eu respiro fundo quando paro diante da nossa porta, tomando algumas doses de coragem. Depois de sentir-me preparado para enfrentar o que viesse, eu finalmente pego meu molho de chaves no bolso e abro a porta.

O cenário na sala é o de quem já tem crianças em casa. Talvez até adolescentes. A primeira coisa que noto é a Tv ligada, num canal qualquer de desenhos, e quando meus olhos seguem até encontrar a mesinha de centro, a vejo abarrotada de um verdadeiro arsenal de comida, do tipo que me faz pensar que estamos sem dispensa. Um prato com destroços de melancia, um copo longo com leite pela metade, e um balde de pipoca praticamente vazio. Também há pacotes de salgadinhos vazios e de batata palha. No meio de tudo aquilo, um notebook fechado. E então eu olho para a mulher que está sentada no sofá, tão inerte em seus pensamentos que nem se dera conta da minha presença. Scarlatti está vestindo uma das minhas camisetas da coleção dos Simpsons, o cabelo desgrenhado como eu nunca vi antes, e uma panela do que deduzo ser brigadeiro entre as pernas cruzadas na posição de lótus.

Eu não sei o que pensar enquanto a observo de boca aberta. Scarlatti parece... Normal. Normal se você for pensar em uma pessoa bagunceira que está habituada a viver daquele jeito. Mas basta olhar para ela, pela forma como parece distante enquanto mastiga a ponta de uma colher coberta de chocolate, e eu sei que algo não está bem. Sua aparente normalidade é estranha.

Eu termino de entrar no apartamento, sem desviar meus olhos dela, e fecho a porta atrás de mim. Ainda estranhando-a, eu deixo minha maleta em cima do seu notebook fechado sobre a mesinha. Há muito já era para ela ter me notado, mas ela não o fez ainda.

Temeroso, eu caminho até ela. É somente quando me sento ao seu lado que ela despertar do transe.

Eu seguro sua mão quando ela vira o rosto para mim.

- Oi - falo baixinho, tentando sorrir. Scarlatti inspira profundamente e me sorrir de volta.

- Você chegou agora? - Pergunta, a voz rouca. Ela parece ter andado chorando e eu não gosto nada disso. Não mais ainda de saber que eu não estava aqui para conforta-la.

- Sim. Mas você nem percebeu - eu faço um biquinho, esperando arrancar dela um sorriso no mínimo mais autêntico. E funciona. Sorrindo, ela toca meu rosto com a mão livre da colher e me dá um selinho.

- Desculpe. Eu estava distraída...

- Percebi - resmungo de volta. Ela me dá outro beijo, dessa vez mais longo. Minha mão, agora em sua coxa, a aperta um pouquinho e sua palma em minha barba soa quente mesmo através dos pelos. - Está tudo bem? - Pergunto quando ela para o beijo. Olhando-a mais de perto, percebo seus olhos vermelhos. Ela definitivamente andou chorando.

- Sim - mente.

Eu estreito meus olhos para ela.

- Scar...

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