Dylan Narrando
Eu sou o tipo de cara que se sente confortável em qualquer lugar ou ambiente. Adapto-me fácil a todo e qualquer estilo de habitat e relaciono-me bem com qualquer tipo de pessoa - desde que essa não esteja de olho na minha garota; seja homem ou mulher. A maior prova disso foi minha mudança radical, do meu amplo apartamento para a sardinha que Scarlatti ousava chamar de casa, e então da sardinha para agora uma casa de verdade. Eu também achei que não fosse me acostumar a rotina de "trabalho segunda à sexta" e, esporadicamente, "sábado", afinal acordar de manhã nunca foi um dos meus robes favoritos. Mas, novamente, minha natureza me surpreendeu, provando que isso era possível.
Hoje, eu mudei. Não sou mais o cara de antes, mas também não me sinto mal com isso ou me queixo. Não sinto falta do que eu já fui um dia, aquele cara farrista e irresponsável, preguiçoso - e até imaturo, confesso - que não fazia nada da vida a não ser beber, gastar dinheiro e pegar mulheres. Eu estava bem comigo mesmo, agora, com o cara que me tornei porventura; com a nova vida que adquiri ao longo desses meses ao lado de Scarlatti. Sentia-me melhor, com uma visão e expectativa de vida diferente, renovada.
Então, fica meio confuso para a minha cabeça entender com precisão o por quê do meu desconforto no momento presente, preso numa sala enorme demais para um consultório e cercado por duas mulheres lindas. Eu devia me sentir bem, em meu habitat natural - afinal era acostumado a lidar com isso constantemente em minha antiga vida. Ou, no mínimo, devia me adaptar a esse novo ambiente, como sempre faço.
Mas, sentado diante de uma médica de parar o trânsito e ao lado da mulher que para o meu mundo, eu me sinto totalmente, absolutamente e incorrigivelmente o contrário de tudo isso. Sinto-me desajustado, inquieto e desconfortável. Sei que boa - talvez muita - parte disso se retém ao fato de eu estar aqui ouvindo coisas, desnecessárias e necessárias, a respeito do meu filho e da saúde da minha mulher. Mas, ainda assim, é desconforto demais para alguém habituado a sair por cima de qualquer situação. Eu quase posso me sentir suar frio, com o meu coração batendo mais forte a cada pergunta, a cada questionamento, e minha capacidade de dicção totalmente danificada. E isso não pode ser uma coisa normal. Eu devo estar prestes a ter um ataque de ansiedade, um surto, uma síncope, ou qualquer merda similar, e ninguém se dava conta disso a não ser eu mesmo.
Como citei, o consultório era grande - embora eu me sentisse claustrofóbico - com duas portas, salvo a de entrada/saída, posicionadas lado a lado no fundo da sala, a cor das paredes num tom branco de gelo, sem vestígios do rosinha que desatacavam as demais paredes da clínica. Havia um sofá branco ao lado esquerdo, duas estantes abarrotadas de livros do lado direito, e um armário de madeira posicionado entre elas. A mesa, que se encontra entre Scarlatti e eu e a doutora Aline, era de madeira e pintada de branco. Alguns quadros abstratos enfeitam as paredes, juntamente com cartazes educativos sobre ciclo menstrual, DSTs, e outras coisas femininas que eu não tinha interesse nenhum em saber. O chão, como na clínica toda, também era de porcelanato.
Eu estou bastante apreensivo, suando frio - posso sentir até as gotas escorrendo por entre as minhas costas, umedecendo minha camisa - contudo sei que não sou o único. Ao meu lado, recebo as ondas de tensão que emanam do corpo de Scarlatti diretamente para o meu, agravando o meu estado. Desejo muito pegar sua mão, mostra a ela que estou ao seu lado não somente em estado físico como também de alma e coração. No entanto, não é como se eu fosse tomar as iniciativas, dessa vez. Pode parecer egoísta da minha parte, mas eu ainda estava com o orgulho ferido; magoado. Além do que, se ela pretendia vir sozinha antes, era sinal de que não precisava de nenhum apoio moral meu. Se o quisesse, teria me dito sobre a consulta.
A doutora Aline foi bem clara e não fez rodeios sobre nada. Perguntou de tudo um pouco, desde medicamentos, saúde, tipo sanguíneo e até alimentação, e eu queria muito ter deixado minha indignação em determinadas partes.
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RENDIDOS
Literatura FemininaEm RENDIDOS, o segundo volume de Minha Tentação, primeiro livro da série 3 Irmãos, Dylan Sanchez e Scarlatti exploram a possibilidade de um futuro novo ao irem morar juntos. Três meses se passaram desde a tragédia de terem perdido o filho, e isso ai...